Jones Rossi
De Dom João VI a Michel Temer, todos
os governantes usaram as estatais para satisfazer seus interesses
De
acordo com uma pesquisa publicada pelo Datafolha nesta terça-feira (26), 67%
dos brasileiros são contra a privatização das estatais. Ou seja, se você
sair e perguntar por aí, a maioria prefere o tempo em que uma linha de telefone
custava o preço de um carro popular e era preciso esperar anos na fila da
Telebrás para ser contemplado com um número.
Perversamente,
quanto menor a renda, maior é a resistência à venda das estatais. Por que
“perversamente”? Pois é justamente a camada mais pobre da população que
sustenta o prejuízo gerado anualmente pelas ineficientes empresas públicas. A
conta para cada brasileiro é de 92
reais por ano. É lógico que esse valor pesa mais no bolso de quem ganha um
salário mínimo do que entre a parcela mais abastada dos brasileiros.
A
Petrobras, a grande queridinha dos nacionalistas que não querem “entregar o
nosso patrimônio para os estrangeiros”, registrou umprejuízo
de 14,8 bilhões de reais em 2016, o terceiro consecutivo.
O
colunista Leonardo Sakamoto, que escreve no portal UOL, analisou a pesquisa
como um sinal de que “defender
privatização na eleição presidencial segue sendo tarefa suicida”. “O fato é
que pedir mínima participação do Estado na vida das pessoas não casa com a
garantia de serviços públicos de qualidade. E a população sabe disso”, escreve
Sakamoto.
No mesmo
dia, em outro texto, Sakamoto reclama do uso político de instituições
financeiras estatais como a Caixa Econômica Federal pelo governo para fazer
pressão sobre governadores — se estes não convencerem os deputados de seus
estados a aprovarem a Reforma da Previdência, ficam sem financiamento.
“Vale lembrar que a Caixa, o Banco do Brasil e
o BNDES são instituições públicas, apesar dos governantes sistematicamente as
tratarem como se fossem seus donos. O que está lá depositado pertence a
correntistas, investidores, trabalhadores com contas de FGTS e ao país, ou
seja, a todos nós. A decisão de financiamento usando esses recursos deve ser
feita obedecendo a regras claras, visando a beneficiar seus donos, investidores
e, por ser estatais, a coletividade (como no caso do financiamento de
moradias), com base no princípio da impessoalidade previsto no artigo 37 da
Constituição Federal”, escreve
o colunista.
Sem
perceber — mesmo querendo fazer o contrário — Sakamoto na verdade expõe o
melhor dos argumentos para privatizar todas as estatais, mesmo as
que dão lucro, como a Caixa Econômica Federal e o Banco do Brasil.
Hoje, é
o ministro Carlos Marun, responsável pela articulação do governo Temer com o
Congresso Nacional, que usa estatais para chantagear aliados. Ontem, foi o
governo Lula que loteou as mesmas estatais com membros do PT e de partidos de
sua esfera de influência, e não por mérito técnico, como deveria ser.
Desde
que as estatais existem, sempre foram utilizadas para fins políticos e acabaram
no centro de escândalos de corrupção.
Durante
o governo de Getúlio, que criou a Petrobras, foi descoberto um grande esquema
de propinas na Carteira de Exportação e Importação (Cexim) do Banco do Brasil.
No livro “Getúlio
(1945-1954): Da volta pela consagração popular ao suicídio”, o escritor
Lira Neto explica o que aconteceu:
“A Cexim
tinha como função expedir licenças prévias de importação, priorizando itens de
primeira necessidade em detrimento de bens supérfluos. (...) Tal sistema havia
se transformado em um explícito balcão de negócios, propiciando uma porta
aberta para o tráfico de influências.
Virou
regra a cobrança de propinas para a emissão das guias de importação, bem como
se tornaram públicos os favorecimentos a aliados políticos do governo.
Transações licenciadas sob o carimbo de “produto prioritário” – como trigo,
remédios e maquinário industrial – serviam de camuflagem para contrabandos de
artigos de luxo. Em vez de controlar as compras ao exterior, a Cexim abriu as
comportas e fez as importações saltarem de 900 milhões de dólares anuais para
quase o dobro disso, entre 1951 e 1952.5 As denúncias no setor envolviam gente
muito próxima ao Catete.”
O Banco
do Brasil que conhecemos hoje vive sua segunda encarnação. Criado em 1808 por
Dom João VI, quando a Coroa Portuguesa fugiu para o Brasil, o banco faliu em
1820, pois era usado para emitir dinheiro ao bel-prazer da nobreza que morava
no Rio de Janeiro. Somente no reinado de Dom Pedro II, em 1853, o banco voltou
a funcionar.
Sakamoto
atribui a chantagem política usando os bancos estatais a “interesses
particulares” de Temer. Tenho certeza que Sakamoto está correto. Não dá para
deixar o Banco do Brasil na mão de Michel Temer.
Como não
deu para deixar nas mãos de Dilma Rousseff, Lula, FHC, Sarney, Getúlio, D. João
VI, ou qualquer outro governante, seja do Império ou da República.
Gazeta do Povo
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