Helena Garrido
O Governo seguiu uma política
económica arriscada e agora Portugal pode ficar de novo em risco de ser abalado
por uma tempestade financeira como se vê pelos efeitos que já tivemos da crise
italiana.
Os
problemas económicos e financeiros portugueses não estão ultrapassados, como
sempre aqui se tem dito. Os efeitos que sofremos com a crise política italiana
mostram até que ponto continuamos vulneráveis ao mais pequeno abalo político ou
económico. Ninguém quer ouvir, mas corremos riscos de pagar caro o facto de não
termos dado ainda maior prioridade à descida da dívida. Uma crise que obrigue,
de novo, a cortes nos salários da função pública e nas pensões será
catastrófico para Portugal. Resta-nos a esperança de António Costa continuar a
ter sorte, para nós termos também.
Eis
alguns factos preocupantes. O INE confirmou esta semana que o crescimento da economia no primeiro trimestre foi de 2,1% (tinha sido de
2,4% no quatro trimestre de 2017). A taxa de desemprego continua a cair mas
agora o número de pessoas empregadas está a diminuir há dois
meses consecutivos. O abrandamento da actividade económica, que já se confirma
nos dados, parece manter-se como o revela o indicador coincidente do Banco de Portugal relativo a Abril
e que está a cair desde Setembro de 2017, antecipando assim o que se está a ver
agora. As projecções de crescimento para este ano estão neste momento
basicamente alinhadas. Separadas por uma décima, que é nada, o FMI prevê 2,3%, tal como o Governo, e a OCDE 2,2%. Em 2017 crescemos 2,7%.
A
perspectiva de crescer menos está presente desde finais do ano passado reflexo
do abrandamento externo e da incapacidade que a economia portuguesa tem
revelado em aumentar a produtividade. Juntou-se a isso a subida do preço do
petróleo.
Como se
tudo isto não fosse suficiente, a situação política italiana veio colocar de
novo Portugal no radar dos financiadores. Lá está a taxa de juro da dívida
pública portuguesa a subir nas comparações com Itália e Espanha, como se pode ver neste artigo do Financial Times (para
assinantes). A
taxa de juro das obrigações do Tesouro a 10 anos (yield) passou de 1,7% em
meados de Maio para 2,1% agora, situando-se em valores mais altos do que há um
ano.
Uma
reacção reveladora da fragilidade financeira do país: quando chega a tempestade
os investidores começam a olhar para os números. E a dívida pública portuguesa
continua ainda elevada ao mesmo tempo que a redução do défice público não dá
quaisquer garantias de que é duradouro e não apenas fruto do crescimento da
economia.
O
primeiro-ministro António Costa, oportunamente, disse no início desta semana que a prioridade da política orçamental é reduzir a dívida
pública, não prevendo alterações na carga fiscal. O contágio a Portugal da
instabilidade que se vive em Itália aconselha obviamente essa estratégia.
Claro
que os efeitos desta subida dos juros não se fazem sentir de imediato nas
contas públicas – estas reacções vivem-se no mercado secundário – e é também
uma realidade que a gestão da dívida pública tem sido feita com inteligência,
protegida que tem estado dos discursos populistas. Ainda bem que se ignorou
algumas das recomendações do relatório sobre a dívida pública, nomeadamente
quando se recomendava que o país se financiasse mais com empréstimos de mais
curto prazo. Mas se a instabilidade se mantiver durante muito tempo, os nossos
encargos com os juros vão aumentar.
O que se
está a passar demonstra que devíamos ter sido mais prudentes no passado
recente, dando desde logo maior prioridade à redução da dívida pública – e não
apenas agora -, para nos aproximarmos o mais depressa possível do porto seguro
da solidez financeira. Assim como devíamos ter na mão uma lista de medidas das
chamadas políticas estruturais, em vez de termos para apresentar reversões.
É
impossível saber se teríamos crescido mais num cenário alternativo. Mas face ao
contributo limitado que a procura interna deu para a recente prosperidade, é de
admitir que teríamos crescido pelo menos o mesmo se a devolução dos salários da
função pública tivesse sido mais lenta, usando essa margem para baixar ainda
mais a dívida pública.
No
Congresso, António Costa disse que acabou o mito de que só a direita sabe gerir a economia e as
finanças públicas. Esse mito nunca existiu verdadeiramente uma vez que
Mário Soares teve de gerir as finanças com mão de ferro nas duas primeiras
intervenções do FMI. O PS e o PSD, quando os tempos assim o exigem, gerem as
finanças públicas com rigor. O problema de Portugal tem sido as fases de
prosperidade, é nestas alturas que se cometem erros de política económica que
se pagam mais tarde. E nestes últimos dois anos e meio cometeu-se o mesmo erro,
não se aproveitou a conjuntura favorável para proteger o País da incerteza que
se vive no mundo e em especial na Zona Euro.
A gestão
económica e financeira de António Costa só passa no teste se Portugal conseguir
ultrapassar, sem problemas de maior, uma crise económica ou uma tempestade
financeira. Os efeitos que já tivemos da crise italiana não são sinais
positivos para este Governo passar na avaliação da sua política económica. Como
sempre se disse aqui, a combinação de políticas seguida pelo Governo foi
arriscada e, ao mesmo tempo, pouco ambiciosa. Sim, sabemos que a política de
conquista e manutenção do poder assim o exigiu. Esperemos agora que a sorte
continue a proteger António Costa para não pagarmos um preço elevado por essa
falta de prudência.
Observador
- Portugal