Denis Lerrer
Rosenfield
Há um
profundo mal-estar na sociedade brasileira. As pessoas estão tomadas pelo
desânimo e pela insegurança, portadoras de grande descrença nos políticos e nos
partidos. Se a moralidade pública se tornou uma bandeira política, é porque não
faltaram razões que corroboram tal percepção. É bem verdade que a economia
voltou a crescer, criando novas condições sociais, graças às reformas
realizadas pelo atual governo. Porém tais efeitos ainda não se fizeram sentir
ou não são percebidos como tal.
Não
deveria, portanto, causar estranheza o fortalecimento da candidatura do
deputado Jair Bolsonaro, na medida em que ele consegue dar vazão ao sentimento
de uma sociedade cansada de desmandos. Pretender desqualificá-lo como sendo de
extrema direita nada mais é que uma reação de tipo ideológico, pois não leva em
consideração que suas posições estão enraizadas na sociedade. Ele não é uma
“bolha” que logo estourará, mas um fenômeno que expressa questões e posições de
uma sociedade que está de saco cheio de tudo o que está aí.
A
descrença da sociedade nos políticos e nos partidos em geral tem sérias razões.
Não há praticamente nenhum grande partido que escape. O PT foi o grande mestre,
com o mensalão e o petrolão. Nos governos petistas o País foi levado à ruína
econômica e à falta completa de ética. Ex-membros do novo governo estão
envolvidos na Lava Jato, como um ex-ministro com mais de R$ 50 milhões
escondidos num apartamento. As imagens foram impactantes. O ex-presidente do
PSDB também aparece envolvido com a JBS. A lista seria interminável. Fica,
porém, a percepção de que todos os partidos estão podres, embora,
evidentemente, haja pessoas sérias e honestas em todos eles. O que conta,
todavia, é a percepção popular. Nesse sentido, a posição de um outsider tende a
ser muito bem recebida.
As
denominações de esquerda e de direita, em tal contexto, passam a não ter maior
significação, porquanto a questão reside em como dar respostas aos problemas
que são postos pela sociedade. Expressão desse deslocamento se encontra em
recente entrevista do ex-presidente Fernando Henrique, ao declarar que tem
“medo da direita”, em alusão indireta ao deputado Bolsonaro. Curioso. Não teria
ele “medo da esquerda” petista lulista, que destruiu o País? Ou de Hugo Chávez
e sucessores, que conduziram a Venezuela ao abismo?
A
sociedade não tolera mais as invasões do MST e de seus assemelhados urbanos,
como o MTST. Quer tranquilidade em sua vida e em seu trabalho. Note-se que o
MST foi estimulado e acariciado tanto pelos tucanos quanto pelos petistas, com
exceção da ex-presidente Dilma, que dele se demarcou, e do atual presidente,
que tampouco compactua com a desordem. Acontece que o desrespeito à propriedade
privada é condenado pela imensa maioria da população, que não mais embarca nos
cantos românticos de uma esquerda irresponsável. Consequentemente, quando um
outsider como o deputado Bolsonaro toma para si essa bandeira, ele não apenas
se contrapõe a importantes partidos, como expressa o que é sentido e condenado
pela sociedade.
Pegue-se,
por exemplo, um projeto de lei hoje tramitando que permite aos proprietários
rurais a autodefesa mediante autorização para registro e posse de armas. Alguns
afoitos ou mal-intencionados já criticam tal lei como se ela viesse estabelecer
o “faroeste no campo”. Como assim? Ele já não existe na forma de invasões
violentas do MST, com uso de armas, sequestros, incêndios, destruição de
propriedades, e assim por diante? E a prática do abigeato? E os simples roubos
e assassinatos? Condenam-se os que procuram defender-se, e não os que usam da
violência em suas invasões. Então, se um candidato dá voz aos que não conseguem
fazer-se ouvir, qual seria o problema? Ser de direita? Santa paciência!
As
pessoas não conseguem mais caminhar livremente nas cidades brasileiras. A insegurança
impera, a violência está sempre à espreita. O automóvel é hoje utilizado para
qualquer deslocamento, expressando um medo disseminado. Os mais ricos andam em
carros blindados. O direito básico de livre circulação é simplesmente anulado
pela insegurança física das pessoas e dos seus bens. Pais e mães ficam
angustiados à espera de um filho ou filha que foi a uma festa noturna. Mães são
assassinadas quando buscam filhos na escola. A situação é absolutamente
intolerável e nenhum governo se ocupou seriamente da segurança pública. Tucanos
e petistas nada fizeram e a nossa realidade, hoje, é produto de uma longa
história de descaso pela coisa pública. Não deveria surpreender que um
candidato que vocalize tal problema básico do Estado cresça na opinião pública.
Se o deputado Bolsonaro cresce nas pesquisas, é por que os partidos
tradicionais lhe abriram espaço ao não enfrentarem as questões por ele
suscitadas.
Chegamos
a uma situação assaz esquisita, em que bandidos circulam livremente com armas
de restrito uso militar pelas favelas brasileiras, sem que nada seja
efetivamente feito. Até posam para fotos, dada a total impunidade. Se um
militar os enfrenta, da polícia, do Exército, da Marinha ou da Aeronáutica,
logo se instaura um processo contra ele – agora, felizmente, sob os auspícios
da Justiça Militar. Se for menor de idade, pior ainda, pois um “civil” indefeso
é que teria sido morto. Os valores estão totalmente invertidos. Os ditos
“direitos humanos” não deveriam ser utilizados para a proteção de criminosos,
maiores ou menores. Menores matam livremente e depois de uma breve reclusão
saem com ficha limpa. É um estímulo ao crime. Assim, se um candidato defende a
redução da maioridade penal e a revisão do Estatuto da Criança e do Adolescente
é imediatamente estigmatizado como conservador e retrógrado. A perversão é
completa.
Estadão
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