José Márcio Camargo
Quase 40% da arrecadação tributária
do Brasil financia 8,5% da população. Sobra pouco para o resto
“Em casa
que não tem pão, todo mundo grita e ninguém tem razão.” Essa é a situação do
Brasil neste momento. Com um déficit público de 8,0% do PIB e uma dívida
crescente, que caminha para 75% do PIB, a falta de recursos é generalizada.
Cientistas reclamam de que não têm recursos para manter seus laboratórios,
professores das universidades reclamam de que não têm recursos para manter as
universidades, médicos dos hospitais públicos reclamam da falta de remédios e
material cirúrgico, a população reclama das filas para ser atendida pelo SUS,
sanitaristas reclamam da falta de investimentos em saneamento básico, etc.
Não é
necessário afirmar que todas são demandas meritórias. O País precisa de mais
investimento em ciência e tecnologia, mais recursos para a manutenção das
universidades públicas, mais investimento em saneamento básico, mais recursos
para a manutenção de hospitais públicos e para o atendimento do SUS. O problema
é que não tem dinheiro. O dinheiro acabou.
Mas, com
uma carga tributária de 36% do PIB, para onde vão os recursos? O Brasil tem um
sistema de Previdência Social muito generoso e caro. E isso tem graves
consequências. O País gasta 14% do PIB com aposentadorias e pensões, com um
porcentual de população acima de 65 anos de 8,5%. Ou seja, destinamos quase 40%
da arrecadação tributária do País para financiar 8,5% da população. Sobra pouco
para o resto.
O
financiamento deste sistema é feito de duas formas. Pelos trabalhadores ativos,
que são taxados em 31% de seus salários mensais (10% diretamente e 21%
descontados pela empresa) para pagar aposentadorias.
Cada
trabalhador com carteira assinada poupa, todos os meses, 31% de seus salários.
Além dessa poupança, eles são também forçados a poupar 8% do salário para
financiar o FGTS. Portanto, um trabalhador brasileiro com carteira assinada é
forçado a poupar 39% de sua renda mensal. Como a poupança forçada é muito
elevada, a poupança voluntária é muito pequena e a taxa de poupança do País é
de apenas 15% do PIB. Afinal, destes 39% poupados, 31% se transformam em
consumo dos aposentados. O resultado são baixa capacidade para financiar
investimentos e baixo crescimento.
Apesar
de caro, o sistema ainda tem um déficit crescente. Em 2017, o déficit total do
sistema atingiu R$ 305 bilhões. Esse déficit é financiado pelos impostos
recolhidos pelo Estado. E, se nada for feito, a situação vai piorar. Afinal, a
população do País está envelhecendo rapidamente.
O
sistema de aposentadoria dos funcionários públicos é particularmente generoso.
Em média, a aposentadoria de um funcionário do Legislativo é de R$ 28,5 mil; do
Judiciário, R$ 26,3 mil; e do Ministério Público, R$ 18 mil. O sistema atende
um pouco menos de 1 milhão de aposentados e seu déficit está próximo de R$ 78
bilhões ao ano. Ou seja, o País transfere, em média, R$ 78 mil por ano para
cada funcionário público aposentado. Entre 2001 e 2016, este sistema acumulou
um déficit de R$ 1,292 trilhão. Isso é 50% a mais do que tudo o que o governo
federal gastou com educação e mais do que tudo o que o governo federal gastou
com saúde no mesmo período. Este é o maior programa de transferência de renda
do País. E de pobres para ricos.
O
governo enviou ao Congresso uma PEC que reduz o déficit do sistema de
aposentadoria dos funcionários públicos. A proposta, caso aprovada, vai igualar
os dois sistemas (o dos funcionários públicos e o dos trabalhadores do setor
privado), criar uma idade mínima para se aposentar (65 anos homens e 62 anos
mulheres) e exigir um mínimo de tempo de contribuição de 25 anos pelos
funcionários públicos. Deverá poupar R$ 480 bilhões em dez anos, ou seja, R$ 48
bilhões por ano.
Se
realmente querem ter recursos para suas atividades, cientistas, professores,
médicos, sanitaristas e toda a população devem se unir e demandar do Congresso
a aprovação da reforma. Caso contrário, “em casa que não tem pão...”
O Estado de S.Paulo
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