Anne-Sylvaine Chassany
PARIS -
Em agosto de 2014, Emmanuel Macron estava andando de bicicleta ao longo da
costa norte da França, perto de Le Touquet, onde sua esposa tem casa, quando
recebeu um telefonema do Palácio do Eliseu, sede da Presidência na França.
Dois
meses antes, ele havia se desentendido com o presidente, o socialista François
Hollande, que se recusara a dar ao seu assessor econômico, então com 36 anos,
um ministério numa reforma do governo. Decidido a abandonar a política, Macron
já tinha se conformado em abrir uma empresa no setor de educação. "Tinha
decidido trabalhar por conta própria, ser um empresário e dar aulas",
lembra em seu livro "Révolution". "Não pretendia voltar."
Mas,
naquele dia de verão, seu ex-chefe lhe ofereceu o Ministério da Economia, cargo
já ocupado pelos presidentes Valéry Giscard d'Estaing, Jacques Chirac e Nicolas
Sarkozy. Assim, Macron voltou.
A
nomeação foi um dos muitos golpes de sorte que colocaram a Presidência da
França ao alcance desse novato político. Macron venceu o primeiro turno das
eleições, no dia 23 de abril, com 24% dos votos, ficando à frente de Marine Le
Pen, a renascida líder da extrema direita, a quem ele enfrentará no segundo
turno, neste domingo.
Liderando
um movimento político criado há um ano, o Em Marcha! (Em Marche!), que ele
insiste não ser de direita nem de esquerda, Macron pulverizou o dividido
Partido Socialista e despachou o candidato republicano (centro-direita),
François Fillon, envolvido em um escândalo de nepotismo.
Num país
hipnotizado pelo espetáculo do declínio nacional e traumatizado por atentados
terroristas islâmicos. Macron optou por conduzir uma campanha otimista,
prometendo amplas reformas econômicas. E, se as pesquisas estiverem certas, ele
deverá ser eleito presidente com cerca de 60% dos votos no segundo turno,
revertendo a onda populista que colocou Donald Trump no poder nos Estados
Unidos e levou o Reino Unido a sair da União Europeia (UE).
A
ascensão da Macron foi um sucesso acadêmico e de "timing"
extraordinário. Ele cresceu numa família de classe média na pacata cidade de
Amiens, no norte da França. Na escola, "Manu", com seus cabelos
loiros e olhos azuis, era um nerd, sempre ficando na sala após o fim das aulas
para conversar com os professores. Ele conheceu sua futura esposa Brigitte Trogneux,
24 anos mais velha que ele, casada e com três filhos, numa escola secundária
particular, católica, onde ela lecionava teatro e literatura. Eles se casaram
em 2007.
Amigos
da faculdade em Paris lembram dele como um aluno de uma vida intelectual rica.
Além da École Nationale d'Administration (ENA), a instituição que prepara a
elite dos servidores públicos franceses, seus anos de formação incluíram um
mestrado em filosofia e um período como assistente do filósofo Paul Ricouer. O
encontro com Michel Rocard, premiê socialista e reformista, moldou seu
pensamento político liberal.
"De
Rocard, ele manteve a crença de que o Estado tem um papel a desempenhar na
economia, mas não pode fazer tudo. Ele acredita que você precisa de políticas
favoráveis aos negócios antes de redistribuir renda e que os benefícios sociais
não são eficientes o suficiente para corrigir as desigualdades", diz Marc
Farracci, economista da Sciences Po e amigo de Macron.
O
candidato pertence a uma geração que viu a ascensão e normalização da extrema
direita. Ele era estagiário na embaixada francesa na Nigéria quando ficou
sabendo que Jean Marie Le Pen, o pai da Marine, conseguira inesperadamente
passar para o segundo turno das eleições presidenciais, contra Chirac, em 21 de
abril de 2002.
Seis
anos depois, Macron entrou para o banco de investimentos Rothschild, graças à
indicação de um poderoso ex-aluno da ENA. Ele ganhou o respeito dos colegas e €
2,9 milhões pela consultoria prestada à Nestlé na aquisição de uma unidade da
Pfizer por US$ 12 bilhões, em 2012. Em seu tempo livre, ajudou na campanha de
Hollande pela candidatura a presidente pelo Partido Socialista, antes de o
favorito inicial na corrida, o ex-diretor-gerente do Fundo Monetário
Internacional Dominique Strauss-Khan, desistir da disputa, após sua prisão em
Nova York, em 2011.
No
terceiro trimestre de 2015 ele havia se tornado uma figura popular e um inimigo
do seu próprio partido, fazendo críticas regulares à semana de trabalho de 35
horas, ao imposto sobre fortunas e aos privilégios de uma casta de políticos e
"insiders" econômicos. Após negociações dolorosas para a aprovação no
Parlamento de um projeto de lei de desregulamentação, Macron começou a planejar
um novo partido, lembra Jean Pisani-Ferry, assessor econômico do candidato.
"Ele estava frustrado."
"Parlamentares
de centro-direita diziam a ele: 'Gosto de seu projeto, mas não posso apoiá-lo.
Sinto muito'." Enquanto isso, parlamentares rebeldes do Partido Socialista
se opunham à lei porque ela se inclinava demais para a direita.
Foi
quando Macron "firmou um contrato de emprego de longo prazo com a
providência", diz Alain Minc, empresário e assessor político. Macron
fundou o movimento Em Marcha! em abril do 2016, deixou o governo Hollande em
agosto e anunciou a candidatura à Presidência em novembro.
Uma
série de eventos imprevistos abriram espaço político: Fillon, um admirador de
Margaret Thatcher, venceu prévias do partido Republicanos contra o favorito,
Alain Juppé. Um mês depois, o presidente Hollande decidiu não tentar a
reeleição. Benoît Hamon, um esquerdista que foi contrário às reformas do
mercado de trabalho propostas por Macron, foi indicado candidato do Partido
Socialista em janeiro. Em seguida, naquele mês, estourou o escândalo que ficou
conhecido como "Penelopegate", que acabou minando a candidatura
presidencial de Fillon.
"A
intuição de Macron funcionou. Ele fez a avaliação certa da situação", diz
o amigo Pascal Lamy, ex-diretor-geral da Organização Mundial do Comércio (OMC).
"E então aproveitou a sua chance."
Financial Times |
Valor Econômico
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