Editorial
Estado de dimensões exageradas,
insaciável na arrecadação de impostos, não reduz desigualdades. Ao contrário,
serve para concentrar renda
A imagem
do Estado brasileiro é de um ente de avantajadas dimensões, insaciável na
arrecadação de impostos junto à população, para arcar com despesas crescentes.
Não há reparo a fazer. Os números das contas públicas e estatísticas econômicas
em geral correspondem à imagem.
São mais
de 100 empresas estatais, com dezenas de milhares de empregos, e que movimentam
bilhões em compras e vendas. Algumas têm ações em Bolsa, o que não impede que o
sócio controlador, a União, tome decisões de gestão políticas, sem preocupação
com os acionistas. Vide a Petrobras. Outras, incapazes de gerar lucros, vivem
de dinheiro do Tesouro, ou seja, do contribuinte, numa relação incestuosa nada
transparente.
Por
qualquer ângulo que se olhe o Estado brasileiro, veem-se excessos. Na edição de
domingo, o GLOBO trouxe o tamanho da folha de pagamentos pública, do Estado
como um todo — salários do funcionalismo da União, estados e municípios,
benefícios sociais, bolsas, pensões, aposentadorias. Ao todo, 57,9 milhões de
pessoas, 28% da população, dependem, em alguma medida, dos governos. Quase a
soma das populações de Argentina e Chile.
De
servidores ativos e inativos da União, estados e municípios, são 10 milhões que
recebem cheques mensalmente; aposentados e pensionistas do INSS somam 33,8
milhões e há ainda 13,4 milhões no Bolsa Família. Esta folha de pagamentos, de
R$ 941 bilhões no ano passado, representa 15% do PIB.
Especialistas
garantem não haver paralelo em qualquer país desenvolvido. Além dos aspectos
econômicos e financeiros, há o político. Porque esta enorme massa de dinheiro
nas mãos de governantes lhes confere um poder incomensurável. Num país de
cultura patrimonialista como o Brasil — em que dinheiro público é usado para
atender a interesses privados, de partidos e pessoas —, poder usar a caneta que
abre esses cofres é passe livre para tentativas de perpetuação no poder, e a
construção de mitos populares. A história atual do Brasil ilustra bem este
ponto.
Muitos
equívocos administrativos se explicam a partir deste Estado provedor. Está aí a
causa da demora excessiva para a realização da reforma da Previdência. A
despesa com o INSS chega a 7% do PIB, índice elevado para um país com população
ainda jovem. Mas o político populista prefere não atualizar as regras à nova realidade
demográfica. Opta por não contrariar os milhões de segurados (e eleitores) do
sistema.
É outra
balela que este gigantesco guichê funciona para reduzir desigualdades. É o
oposto, ele concentra renda. A Previdência é exemplo cristalino: os 28 milhões
de aposentados e pensionistas do INSS consomem 7% do PIB, mas os apenas 4
milhões de servidores públicos inativos levam 4% do PIB.
Se há
algo positivo na crise fiscal, é chamar a atenção para esses porões do Estado
brasileiro. Confisca cerca de 35% do PIB em impostos, a mais alta carga
tributária entre os emergentes, uma das mais elevadas do mundo, e usa o
dinheiro de forma a agravar desníveis de renda, e deixa em plano inferior
despesas com investimento, por exemplo. O Estado é usado para atender a demandas
que garantam votos ao governante de turno, como se não houvesse um futuro de
carências que requerem a tomada de decisões hoje. Mas estas não garantem apoio
eleitoral imediato, e assim perpetuam-se as carências. Esta é a fórmula do
subdesenvolvimento econômico, social e político.
O Globo
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