Lew Rockwell
Os
Bolcheviques acreditavam na imediata imposição do socialismo por meios
violentos, com confisco armado das propriedades, das fábricas, e das fazendas,
e o assassinato dos burgueses e reacionários que porventura oferecessem
resistência.
Já os
Mencheviques (que também se auto-rotulavam
social-democratas)
defendiam uma abordagem mais gradual, não-violenta e não-revolucionária para o
mesmo objetivo. Para estes, a liberdade e a propriedade deveriam ser
abolidas pelo voto da maioria.
Os
Bolcheviques venceram a Revolução Russa e implantaram o terror. No
entanto, após cometerem
crimes inimagináveis,
eles praticamente desapareceram do cenário. Já os Mencheviques, no
entanto, não apenas seguem vivos como também se fortaleceram e se expandiram, e
estão no poder de boa parte dos países democráticos.
Os
Mencheviques modernos seguem, em sua essência, as mesmas táticas dos
Mencheviques russos. Ao invés de abolirem a propriedade privada e a economia de
mercado, como queriam os Bolcheviques, os atuais Mencheviques entenderam ser
muito melhor um arranjo, no qual a propriedade privada e o sistema de preços
são mantidos, mas o Estado mantém os capitalistas, e uma truncada economia de
mercado, sob total controle, regulando, tributando, restringindo e submetendo
todos os empreendedores às ordens do Estado.
Para os
Mencheviques atuais, tradições burguesas como propriedade privada e economia de
mercado devem ser toleradas, mas a economia tem de ser rigidamente regulada e
tributada. Políticas redistributivistas são inegociáveis. Uma fatia
da renda dos indivíduos produtivos da sociedade deve ser confiscada e
redistribuída para os não-produtivos. Grandes empresários devem ser
submissos aos interesses do regime e, em troca, devem ser beneficiados por
subsídios e políticas industriais, e também protegidos por tarifas
protecionistas.
Acima de
tudo, cabe aos burocratas do governo — os próprios Mencheviques — intervir no
mercado para redistribuir toda a riqueza e manter a economia funcionando de
acordo com seus desígnios.
No
entanto, a estratégia menchevique não se resume à economia. A questão
cultural é tão ou mais importante. Para os Mencheviques atuais, a cultura
burguesa deve ser substituída por uma nova mentalidade condicionada ao modo de
pensar social-democrata, e a estratégia para isso consiste na imposição lenta e
gradual de uma revolução cultural.
Os
Mencheviques, fiéis ao seu ideal "democrático", sempre se sentiram
desconfortáveis com a idéia de revolução, preferindo muito mais a "evolução"
gradual produzida pelas eleições democráticas. O Estado deve ser
totalmente aparelhado por intelectuais partidários e simpatizantes, de modo a
garantir uma tomada hegemônica das instituições culturais e sociais do
país. Daí a desconsideração pelos gulags e pela revolução armada.
Como tudo começou
As
raízes do menchevismo atual não estão na Rússia de Lênin, mas sim na Londres de
1883, quando um grupo de socialistas, adeptos do gradualismo, fundou a Sociedade Fabiana. Liderada por um cidadão
chamado Hubert Bland, os mais famosos membros da
sociedade eram o dramaturgo George Bernard Shaw, os autores Sidney e Beatrice Webb, e o artista William Morris.
A
Sociedade Fabiana tem este nome em homenagem a Quintus Fabius Maximus, político, ditador e general da
República Romana (275-203 A.C.), que conseguiu derrotar Aníbal na Segunda Guerra
Púnica, adotando
a estratégia de não fazer confrontos diretos e em larga escala (nos quais os
romanos haviam sido derrotados contra Aníbal), mas sim de incorrer apenas em
pequenas e graduais ações, as quais, ele sabia que podia vencer, não importando
o tanto que ele tivesse de esperar.
Em suma,
Quintus Fabius Maximus era um estrategista militar que evitava qualquer
confrontação aberta e decisiva; em vez disso, ele preferia fatigar seus
oponentes com táticas procrastinadoras e cansativas, manobras enganadoras e
assédios contínuos.
Fundada
exatamente no ano da morte de Marx com o intuito de promover as idéias do
filósofo alemão por meio do gradualismo, a Sociedade Fabiana almejava
"condicionar" a sociedade, como disse a fabiana Margaret Cole, por meio de medidas socialistas
disfarçadas. Ao atenuar e minimizar seus objetivos, a Sociedade
Fabiana tinha o intuito de não incitar os inimigos do socialismo, tornando-os
menos combativos.
Ao
contrário dos revolucionários marxistas, os socialistas fabianos conheciam
muito bem o funcionamento das políticas públicas britânicas. Sendo os especialistas
originais, eles fizeram várias pesquisas, elaboraram planos, publicaram
panfletos e livros, e criaram várias propostas legislativas, sempre contando
com a ajuda de aliados nas universidades, igrejas e jornais. Eles também
treinaram oradores, escritores e políticos. Sidney Webb foi além e fundou
a London School
of Economics em
1895 para ser o quartel-general desse trabalho.
Embora a
Sociedade Fabiana jamais houvesse tido mais do que 4.000 membros, foram eles
que criaram, promoveram e conduziram pelo Parlamento a maior parte das
políticas sociais britânicas até o início da década de 1980. O resultado
foi uma economia em frangalhos e uma sociedade esclerosada, situação esta que
só começou a ser revertida quando Margaret Thatcher começou a
"desfabianizar" a Inglaterra.
Os
fabianos foram bem-sucedidos em seu objetivo de criar um
"estado provedor", um estado assistencialista que cuidaria não
apenas dos pobres, mas também da classe média, do berço ao túmulo.
Seja na
forma de compensações trabalhistas, ou de pensões e aposentadorias,
seguro-desemprego e medicina socializada, os fabianos sempre enfatizaram a
"reforma social". Segundo o escritor John T. Flynn, os fabianos
perceberam prematuramente o imenso valor das reformas sociais em acostumar os
cidadãos a ver o Estado como a ferramenta para curar todas as suas doenças e
inquietudes. Eles viram que uma agitação em prol de um Estado
assistencialista poderia se tornar o veículo ideal para incutir idéias
socialistas nas mentes do cidadão comum.
Outra
inovação fabiana: reformas sociais invariavelmente envolviam algum tipo de
"seguridade". As pessoas seriam induzidas a aceitar o
socialismo caso este fosse apresentado por meio de modelos oriundos das
ciências atuariais, tendo empresas de seguro como base.
Empresas
de seguro genuínas, baseando-se em estatísticas de distribuição aleatória de
acidentes, coletam dinheiro de seus segurados na forma de um consórcio e
concentram-no em um fundo, desta forma tornando o mundo menos incerto para seus
membros. Os fabianos, muito espertamente, pegaram esse modelo e disseram:
concentremos a riqueza de todos nas mãos do Estado e seremos felizes, saudáveis
e teremos uma vida melhor.
Aneurin Bevan, o Ministro da Saúde fabiano do
governo trabalhista dos pós-guerra, que criou o National Health Service — o sistema estatal de saúde
britânico, chegou realmente a argumentar que tal modelo iria drasticamente aumentar a
expectativa de vida de todos, chegando ao ponto de postergar a morte
indefinidamente.
Mas a
verdadeira visão fabiana do Estado foi mais bem explicitada no livro de Sidney
e Beatrice Webb intitulado Soviet
Communism: A New Civilization?,
publicado em 1935 (o ponto de interrogação foi removido do título após a
primeira edição). O livro glorificava a URSS de Stalin como se fosse
virtualmente um paraíso na terra.
Como
marxistas, embora de outra estirpe, os Webbs aprovavam o stalinismo — se não os
meios, os fins. "Os fabianos eram, de uma certa forma, marxistas
mais bem treinados do que o próprio Marx", disse Joseph
Schumpeter.
Concentrar-se
nos problemas que podem ser alterados por métodos políticos práticos,
adaptar-se à evolução das questões sociais, e deixar o objetivo supremo ser
alcançado automaticamente [por meio da alteração cultural das massas] é algo
que está muito mais de acordo com a doutrina fundamental de Marx do que a
ideologia revolucionária que ele próprio propôs.
Conclusão
No
linguajar fabiano, impostos são "contribuições", gastos do governo
são "investimentos", criticar o governo é "entreguismo" ou
"falta de patriotismo", donos de propriedades são "elites",
"reacionários" e "privilegiados", e "mudança"
significa " socialismo".
Quando
os atuais social-democratas pedem "sacrifícios" da população em prol
dos "ajustes" do governo, tenha em mente que os fabianos diziam
exatamente o mesmo, defendendo, segundo as próprias
palavras de Beatrice Webb,
a "transferência" da "emoção do serviço sacrificante" de
Deus para o Estado.
Para os
fabianos, o Estado (seus burocratas e toda a sua mentalidade) é o único Deus
por quem a população deve se sacrificar.
Por fim,
vale ressaltar que o desaparecimento dos bolcheviques nunca foi lamentado pelos
social-democratas fabianos. Muito pelo contrário: os social-democratas
fabianos agora detêm o monopólio da marcha "progressista" da História
rumo à Utopia.
A janela
de vidro pintada que adorna a casa de Beatrice Webb em Surrey,
Inglaterra, mostra George
Bernard Shaw e Sidney Webb remodelando o mundo com uma bigorna, tendo ao fundo o brasão da
Sociedade Fabiana:
um lobo em pele de cordeiro.
Aquele
lobo está hoje entre nós.
Carlos I.S.Azambuja
Alerta Total
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