Vittorio Medioli
O gasto
irresponsável de um governo dura até acabar o dinheiro dos contribuintes.
Quando acaba, é necessário emitir moeda para honrar compromissos oficiais. A
injeção de liquidez para tapar o rombo impulsiona artificialmente a procura de
bens que ainda não foram produzidos.
O
fenômeno que se segue é a inflação, que corrói o valor da moeda tirando poder
de compra aos salários. Equacionam-se a procura e a demanda. Mais dinheiro com
menor poder de compra, ou seja, uma farsa.
O caso
das aposentadorias pagas pela União chega a ser surreal quando comparado às
maiores economias do planeta. No Brasil arrecada-se muito, mas paga-se até dez
vezes mais para o setor público. Embora não seja a única razão de
desequilíbrio, agravam-se substancialmente as contas públicas.
Em 2012,
a presidente Dilma sancionou a Lei 12.618, que institui o Fundo de Previdência
Complementar do Servidor Público Federal (Funpresp), gerando um teto único
entre aposentadorias pública e privada; as eventuais diferenças serão pagas em
regime de sustentabilidade pelos fundos, eximindo assim a Previdência da União
de arcar com as diferenças.
A regra,
entretanto, vale para quem entra hoje e terá efeitos mais relevantes a partir
de 2050. Até lá o déficit previdenciário será pago pela União, quer dizer, pelo
contribuinte via arrecadação de impostos.
O que
ocorreu em 2015 e continua em 2017 deriva, em parcela preponderante, das
elevadas aposentadorias que beneficiam um universo de 980 mil servidores
públicos inativos, que representam 2,9% de todos os aposentados. Em 2015 o
déficit referente aos servidores foi de R$ 92,9 bilhões, proveniente da
diferença entre a entrada por desconto em folha de R$ 12,6 bilhões e os
pagamentos de R$ 105,5 bilhões a título de aposentadorias.
A média
da aposentadoria “pública”, para os 980 mil beneficiados, era em 2015 de R$
8.950 por mês, com déficit médio por aposentado de R$ 7.900, ou R$ 94,8 mil por
ano; a correspondente “privada” registrou a média de R$ 1.255 para os 18,5
milhões de aposentados, com déficit médio mensal 19 vezes menor que o
correspondente “público”, R$ 400 (contra R$ 7.900).
As
contas da União precisarão arcar – até a Lei 12.618, sancionada por Dilma,
gerar efeitos – com um rombo anual “público” próximo de R$ 100 bilhões para
pagar apenas 3% do universo de aposentados no Brasil.
Hoje cem
trabalhadores arcam com 13 aposentados, já em 2060 deverão arcar com 63. Isso é
inconcebível, já que os 13 de hoje já geram um déficit assombroso.
Embora
entenda-se que qualquer reforma seja vista como uma agressão aos trabalhadores,
o déficit da Previdência, especialmente do setor “público”, ou de apenas 3% do
universo brasileiro, aniquila a lógica e a capacidade de se sustentar. Hoje,
entrelaçado com o “privado”, não se mostra tão impraticável, mas a cada dia
será mais diferenciado, evidente e impagável.
Muitos
pagarão a conta de poucos, e os muitos são exatamente os trabalhadores da
economia privada. Apenas a presidente Dilma, por ser de esquerda e do PT,
conseguiu aquilo em que todos os seus antecessores falharam, contando com o
apoio de seu partido para aprovar uma medida que, ao menos, cola um limite no
horizonte mais distante a cessão dos rombos atuais.
Entretanto,
a progressão do envelhecimento da população deixa menor até a Lei 12.618.
Como
propuseram analistas da esquerda, poder-se-ia congelar o que ultrapassa o teto
da previdência privada e atender uma irredutibilidade constitucional. Isso
também permitiria fazer-se justiça com melhores aumentos na base da pirâmide.
Por que
não haver uma trégua e se discutir com maturidade? Tentar preservar um sistema
que, antes de falir, deixará o país inteiro na bancarrota?
O
“quanto pior, melhor”, que vale de regra universal na oposição, ou fora do
governo, deveria ter uma trégua serena.
Embora o
presidente não seja do PT, é recomendável haver uma discussão e abordagem
objetivas. Uma análise de entradas e saídas, de possível, de recomendável, de
saída da queda livre em que o sistema está lançado para a falência e ruína da
nação.
Não tem
cartola que possa compensar o tamanho desse déficit.
“O
governo, seja de quem for, só pode dar para alguém aquilo que tira de outro
alguém”.
Jornal O
Tempo
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