Editorial
Aumentar o peso da carga tributária
sobre assalariados seria ato de injustiça fiscal, pois será feito para
preservar despesas do interesse de grupos de pressão
Há algum
tempo, quando começou a ficar evidente que a economia não reagiria como
esperado, colocando em risco a meta fiscal de um déficit de R$ 139 bilhões, o
governo Temer começou a reagir como todos os demais. Pouca atenção às despesas
correntes, e muita preocupação em ampliar receitas.
É uma
reação clássica. Fernando Henrique Cardoso, com a estabilização da moeda, em
1994, e o fim da ajuda perversa que a inflação sempre deu aos governantes — os
cortes são feitos por meio de atrasos no pagamento, enquanto a alta dos preços
corrói o salário das pessoas e as dívidas públicas —, começou a elevar a carga
tributária, e ela não parou mais de subir. Não seriam, afinal, Lula e Dilma que
reverteriam esta tendência.
Ao
sinalizar a possibilidade de um aumento do imposto de renda sobre pessoas
físicas, com a criação de mais duas alíquotas acima da atual de 27% — 30% e
35%, ou uma delas —, para taxar rendas mais elevadas, o Planalto atingiria 1,2
milhão de contribuintes, e daria um tiro no pé. Mas voltou atrás, por enquanto.
Aumentar
imposto é sempre impopular. Mas, neste caso vai além, e não é só porque será,
se confirmado, o segundo arrocho tributário em pouco tempo. O primeiro foi a
elevação do PIS/Cofins sobre combustíveis, decisão que não precisou ir ao
Congresso. Já imposto de renda necessita do aval do Legislativo, e políticos já
avisaram o governo que a medida não será aprovada. O próprio presidente da
Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), alertou.
Mais que
a impopularidade em si da ideia, desaba sobre o governo a constatação de que
mesmo com um Estado obeso, que custa mais do que os 35% do PIB que a União
arrecada — por isso, a dívida pública escala em direção aos 80% do PIB —, o
Planalto se recusa a enfrentar para valer os gastos de custeio.
O
governo está certo em dar prioridade à reforma da Previdência, pelo peso dos
benefícios previdenciários, o maior item isolado das despesas públicas. Mas
salários são o segundo maior. Há a estabilidade no emprego, é certo, porém é
inconcebível que não se explorem gastos adicionais com o funcionalismo. É
correto lançar-se um programa de demissão voluntária. Mas não só. Nos escalões
mais elevados do funcionalismo ainda há quase 20 mil ditos “cargos em
comissão”, adicionais aos salários que teriam de ser revistos, se a visão do
governo não fosse monofásica: olha com prioridade novas receitas, em vez de se
atentar para velhas, constantes e bilionárias despesas.
É
visível que o Planalto não quer criar atritos com corporações sindicais e
outras que habitam a máquina pública. Suspender aumentos salariais é o mínimo a
ser feito. Poderá fazer sentido uma revisão do imposto de renda das pessoas
físicas, mas numa ampla reforma, em que se reduzam gravames que ativem a
economia, gerem mais emprego e renda. E em que o Estado melhore a qualidade dos
serviços que presta, de forma a que permita ao contribuinte a usá-los, cortando
despesas hoje obrigatórios para parte da população. Como planos de saúde e
escolas particulares.
Mas
aumentar a carga tributária sobre assalariados, que descontam o imposto na
folha, para evitar cortes na esfera pública, onde o emprego é estável e não se
cobra eficiência, é um ato claro de injustiça tributária.
O Globo
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