Editorial
Defesa da Constituinte feita pela
presidente do PT, Gleisi Hoffmann, dá certeza de haver no PT um programa
bolivariano para ser aplicado no país
Enquanto
morriam pessoas nas ruas de Caracas e outras cidades venezuelanas, devido à
forte repressão das tropas da Guarda Nacional Bolivariana e a ação de grupos
paramilitares, a presidente do PT, senadora Gleisi Hoffmann (PR), e a
secretária de Relações Internacionais do partido, Mônica Valente, assinaram
artigo na “Folha de S.Paulo” em defesa da Constituinte lançada por Nicolás
Maduro, para converter de vez o regime numa ditadura.
Gleisi e
Mônica ressaltam o acerto da decisão de Maduro de chamar o “povo” para resolver
a grave crise política, desconhecendo as maquinações para a convocação desta
assembleia, rechaçada em consulta popular feita pela oposição. Uma Constituinte
eleita com baixa presença nas zonas eleitorais, em meio a fraudes que
envolveram um milhão de votos, segundo a Smartmatic, empresa que forneceu a
tecnologia usada na votação. Sequer todos os chavistas apoiaram a manobra.
Não
teria importância se não assinassem o texto duas dirigentes do PT, uma delas
presidente. À primeira vista, algo despropositado. Nada disso. O artigo reflete
mesmo o que pensa uma corrente radical que existe desde sempre no PT, e que
parece ganhar mais espaços dentro do partido à medida que se aproximam as
eleições de 2018, tenha Lula ou não condições legais de disputá-las. Quem
acompanha o PT não se surpreende. Nos 13 anos em que o partido esteve no poder
em Brasília, há inúmeros exemplos de tentativas de impor esquemas bolivarianos
ao país.
A
Constituinte de Maduro já havia sido feita por Chávez em 1999, em outro contexto,
com o presidente recém-eleito e sustentado por alta popularidade — ao contrário
de Maduro. Como era o plano, a assembleia serviu para garrotear o Legislativo e
o Judiciário. Maduro segue a mesma cartilha, mas a conjuntura lhe é adversa.
No Brasil,
a cartilha foi seguida — sem êxito, devido à solidez das instituições — na
proposta de uma “Constituinte exclusiva” para tratar da reforma política —
ilegal, porque não pode haver uma assembleia com poderes constituintes a não
ser em ruptura de regime.
Também é
parte desta cartilha uma lei dos meios de comunicação, para desestruturar as
empresas privadas que sustentam o jornalismo profissional. Na Argentina, o
casal Néstor e Cristina Kirchner, aliado de Chávez, conseguiu aprovar esta lei,
para desestabilizar o grupo “Clarín” e o “La Nación”. A derrota de Cristina
para Macri barrou este projeto. Este e tantos outros necessitam de um regime
fechado para serem executados. Daí a importância de uma “Constituinte”.
Não se
deve esquecer, também, que, ainda no primeiro governo Lula, surgiram duas
iniciativas cujo DNA é conhecido: a da Agência Nacional do Cinema e do
Audiovisual (Ancinav), idealizada no Ministério da Cultura de Gilberto Gil e
Juca Ferreira, para controlar o conteúdo da produção audiovisual—leia-se,
censura —,e o do Conselho Federal de Jornalismo, saído do Ministério do
Trabalho, afim de supervisionar a profissão, com objetivos óbvios. Diante da
reação, Lula os engavetou.
No
impeachment de Dilma Rousseff, o Diretório Nacional do PT aprovou resolução de
autocrítica em que o partido lamenta não haver modificado o currículo das
academias militares e intervindo na Polícia Federal e no Ministério Público.
Portanto, o artigo de Hoffmann e Valente tem coerência com o PT. Não foi
escrito por descuido ou desinformação. Reflete um projeto autoritário para o
Brasil.
O Globo
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