IGNACIO
FARIZA
O nome
escolhido nas eleições do dia 1° de julho terá de enfrentar a dívida pública e
propor uma reforma fiscal para resolver o problema da arrecadação
Muitas questões econômicas e poucas respostas concretas a quatro dias
daseleições
presidenciais mexicanas. Dada a avalanche de temas urgentes, com a
corrupção e violência entre as questões mais preocupantes, a economia passou
quase despercebida na campanha, e as soluções propostas foram predominantemente
improvisadas, sem profundidade e um plano de acompanhamento fiscal. Mas os
desafios, latentes há décadas, agora parecem mais prementes do que nunca:
apesar da estabilidade macroeconômica, o crescimento e o investimento ainda são
baixos; a lacuna da desigualdade permanece aberta; os salários estão estagnados
e o Acordo de Livre Comércio da América do Norte (NAFTA,
na sigla em inglês), do qual depende um terço do PIB mexicano, está em risco
enquanto Donald Trump estiver
na Casa Branca.
Reativar
a economia será a primeira tarefa do próximo Governo. Nos últimos seis
anos, o crescimento médio anual se manteve em pouco mais de 2%, um resultado
que cai ainda mais se o que é medido é a renda per capita — o indicador que
melhor reflete a evolução da riqueza real de uma sociedade. O ainda presidente
mexicano Enrique
Peña Nieto iniciou seu mandato de seis anos de forma brilhante, com
uma bateria de reformas que renderam-lhe o aplauso unânime do FMI e
da OCDE. No entanto, o retorno foi menor do que o esperado: a realidade,
teimosa, deixou em quimera os augúrios de uma expansão anual de 5%. O sul do
país continua desconectado da globalização e do investimento público em pelo
menos 70 anos.
"Nas últimas campanhas, pelo menos se falava sobre como íamos
tentar crescer mais, mas ainda continuamos na mesma e nenhum candidato propôs
algo novo", lamenta Valeria Moy, diretora do think tank Mexico
Cómo Vamos?. O modelo seguido há décadas, com base nas exportações e contenção
salarial, já mostra suas deficiências, e o fortalecimento do mercado interno,
mediante o reajuste de salários que estão entre os mais baixos da América Latina e o
aumento do investimento público, mostra-se essencial. Mais ainda em um momento
em que o por muito tempo maior parceiro comercial, os Estados Unidos, país do
qual depende quase um terço do PIB mexicano, se opõe à visão global e abraça o
protecionismo. "Além do TLC [NAFTA], o México pode fazer muito para
impulsionar sua economia com mais investimentos em infraestrutura", diz
Robert Blecker, da American University. "É uma parte essencial do plano de
Andrés Manuel López Obrador [o grande favorito], mas pouco enfatizado na
campanha."
Preservar
o NAFTA, que une México, Estados Unidos e Canadá desde 1994, será, no
entanto, uma tarefa essencial para o próximo presidente.
Diferentemente de anos atrás, a política comercial quase não entrou na
campanha, e todos os candidatos defenderam o acordo, mas o desafio será redirecionar
uma negociação que, ano após ano, quase não deu frutos. Também diversificar a
matriz comercial: isso não depende de um único parceiro, diz Gabriel Lozano,
economista-chefe para México e América Central do
banco de investimento JP Morgan.
Mas retomar o crescimento, salvar o NAFTA e expandir o horizonte
comercial seriam medidas inócuas se não forem acompanhadas de inclusão social. Em
um país em que a pobreza continua a afetar mais da metade da população e na qual as tímidas melhorias da
produtividade só conseguiram retribuir melhor o capital e não o trabalho, o
aspecto social deve ser uma das pedras angulares da futura política econômica.
"A desigualdade sempre esteve ausente do curso de política macro, e não
pode continuar assim", destaca Juan Carlos Moreno Brid, professor de
economia da UNAM. Desta vez, a desigualdade entrou com força na campanha: os
dados não são nada encorajadores —1% da população acumula mais de um terço da
riqueza e 10% ganha 21 vezes mais do que o decil mais pobre— e os mexicanos
exigem soluções.
O indicador de desigualdade mais utilizado, o índice de Gini, ficou
ancorado em níveis inaceitavelmente altos na comparação internacional. E o
sistema tributário corrige muito menos do que seus parceiros brasileiros,
argentinos, chilenos ou uruguaios. A mobilidade social também permanece
escassa: a pobreza afeta 40% dos mexicanos, 7 em cada 10 pessoas nascidas nessa
situação não podem escapar dela. E, embora tenham provado ser uma medida muito
boa para aliviar a pobreza extrema, as transferências condicionais servem
apenas para superar o primeiro elo do desenvolvimento. "O que falta é
justamente dar o salto para o próximo andar: que as pessoas que recebem esses
programas possam avançar no trabalho, mas a informalidade e a precariedade o
impedem", diz Gabriela Ramos, diretora-geral da OCDE.
"O grande desafio será político: convencer os empresários de que o México
só avançará se dividir sua fatia do bolo aumentando os salários", completa
Moreno Brid.
O pequeno esforço em gastos sociais não ajuda. Apesar de ter
quadruplicado desde meados dos anos oitenta, até 8%, este item continua a
anos-luz de outros países industrializados (21%) e da média da América Latina
(14%). Aumentar os gastos é, no entanto, tão premente quanto reformular os
programas sociais: 8 em cada 10 não atingem suas metas e apenas 10% conseguem
um desempenho "ótimo".
Qualquer passo para tentar combater a desigualdade e a pobreza também
corre o risco de ser em falso se não for acompanhado por uma nova reforma
tributária. Embora a dívida pública permaneça em níveis não tão preocupantes, o
forte crescimento dos últimos anos reduz a margem de manobra do Governo que
saia das urnas. Opções para adicionar músculo financeiro ao Estado são muitas,
mas quase todos os especialistas concordam em dois pontos: aplicar o IVA a
alimentos e medicamentos —hoje isentos—, introduzindo compensações aos setores
menos abastados para evitar a regressividade e aplicar um verdadeiro imposto de
propriedade (sobre os bens imóveis), hoje praticamente inexistente.
Em março, a OCDE deu um passo adiante e recomendou taxar as heranças
para aumentar a arrecadação enquanto se reduz a desigualdade. Mas os candidatos
continuam paralisados no não. "É preocupante que continuem prometendo
reduzir ou manter os impostos", opina Rodolfo de la Torre, do Centro de
Estudos Espinosa Yglesias, que espera que, já na residência presidencial Los
Pinos, percebam o rombo da arrecadação e mudem sua aversão fiscal. Muitas
questões pendentes para os próximos seis anos que se apresentam, pelo menos em
seu envoltório, mais problemáticos do que qualquer mandato anterior.
ESTABILIDADE
MACROECONÔMICA, MAS COM DÍVIDA PÚBLICA EM ALTA
A relativa estabilidade econômica tem sido a marca predominante dos
últimos anos. Para um país que conviveu, não há muito tempo, com taxas anuais
de preços de três dígitos, uma inflação de 7% não é uma boa notícia, mas é
facilmente digerível. Apesar da abrupta queda dos preços do petróleo, que em
tempos não tão distantes teria sido um golpe quase fatal para a economia mexicana,
o PIB do México manteve uma taxa de crescimento baixa, mas estável. E, no
entanto, o cenário macro tem sabor agridoce: o déficit cresceu e arrastou a
dívida pública, que já está em torno de 50% do PIB.
EL
PAÍS
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