Carlos Alberto
Sardenberg
Desconfie de todos os políticos que
dizem: sim, a reforma da Previdência é necessária, mas precisamos debater os
termos com a sociedade
Claro
que é preciso debater tudo com a sociedade, mas, caramba!, há quanto tempo
estamos debatendo a reforma da Previdência? Qual discussão é mais antiga, essa
ou a reforma tributária? Francamente: nos dois casos, já está tudo dito, há
números abundantes, todo mundo já deu suas opiniões. O que precisa agora,
especialmente neste momento de eleições federais e estaduais, é definir
propostas.
Em
outras palavras, desconfie de todos os políticos que dizem: sim, a reforma da
Previdência é necessária, mas precisamos debater os termos com a sociedade.
Mesmo admitindo que cabem mais algumas conversas, a obrigação das lideranças
que buscam votos é iniciar o debate apresentando a sua proposta de solução.
Sem
isso, estão subindo no muro, se esquivando e tentando passar a falsa impressão
de que, no governo, vão buscar uma saída que satisfaça todo mundo. E que não
existe.
Vale
para a reforma tributária, outra veteraníssima. Tudo dito, façam suas opções,
candidatos, e se comprometam perante o eleitor de modo explícito.
Vale
também para a reforma trabalhista. Aqui, aliás, temos um caso mais claro de
tentativa de embuste. O Congresso aprovou, e o presidente sancionou uma
reforma, justamente entendendo-se que o debate estava feito, e decisões tinham
de ser tomadas. Foram, mas sobram candidatos dizendo que a votação foi
prematura e que é preciso rediscutir tudo de novo.
Por
exemplo: seria preciso chamar as entidades de trabalhadores e de empregados
para perguntar o que acham do imposto sindical obrigatório, que foi extinto.
Ora, para que chamar essa turma? Eles vão dizer o quê? Que não querem o
dinheiro fácil do imposto recolhido e distribuído pelo governo?
Do mesmo
modo, de que adianta perguntar às pessoas se preferem se aposentar na faixa dos
50 anos ou só depois dos 65?
Argumentam
marqueteiros: mas o candidato não se elege se disser que vai aumentar a idade
de aposentadoria. Bom, então diga que não precisa de reforma da Previdência e
que vai pagar essa despesa com mais impostos, por exemplo. O embuste é dizer:
vamos debater com a sociedade.
Vamos
mal. Decisões cruciais demoram séculos e, quando são tomadas ... melhor
rediscutir. Não acaba nunca.
PRIVILÉGIOS
Dia
desses, o Tribunal Superior Eleitoral lançou edital para comprar equipamentos
de “reabilitação fisioterápica”. Ou seja, uma academia, que ficaria à
disposição dos funcionários. Isso, lógico, exigirá a contratação de
fisioterapeutas.
Indagada,
a direção do TSE disse que outros tribunais superiores já tinham esse serviço e
que se tratava de igualar benefícios.
De fato,
o Supremo Tribunal Federal e o Superior Tribunal de Justiça têm essas
academias, com fisioterapeutas de carreira, ganhando pouco mais de R$ 16 mil
mensais. Está bom? Uma consulta às empresas de recursos humanos mostra que, no
setor privado, os fisioterapeutas mais bem pagos estão em São Paulo: salário
médio de R$ 3.700, teto de R$ 10 mil. No Brasil, média de R$ 2.200.
Não é
uma questão de quem merece ou não. A questão é: pode o setor público pagar sete
vezes mais para oferecer reabilitação gratuita a seus funcionários, que estão
também entre os mais bem pagos?
Dirão: é
coisa pequena, não é daí que vem o déficit das contas públicas.
Mas é
daí, sim, especialmente nos governos estaduais e prefeituras. Nestes dois
níveis de administração, a despesa com pessoal subiu sistematicamente desde os
anos 90, até o ano passado, inclusive. Em 2017, esse gasto chegou a 9,1% do
PIB. Muito, mas muito mais do que os investimentos. E todo dia saem notícias
mostrando que esses níveis de governo estão quebrados, ou quase e, ainda assim,
concedem aumentos salariais diversos.
Resumindo:
todo mundo sabe que é preciso conter os gastos com o funcionalismo — uma
questão econômica — e eliminar os privilégios — questão moral e política.
Não
apenas aqui no Brasil, mas no mundo todo se sabe como funciona uma boa
administração pública. É só copiar, em vez de propor um enganador debate sobre
“soluções brasileiras”.
Tudo
considerado, o setor público está quebrado. No governo federal, o principal
gasto está na Previdência (INSS e aposentadoria dos servidores e militares).
Nos níveis estaduais e municipais, a despesa que mais cresce é com salários do
pessoal. Fato. Desconfie do candidato que propuser debates.
O Globo
Nenhum comentário:
Postar um comentário