Editorial
PT pretende radicalizar o confronto
a propósito do julgamento do ex-presidente Lula
“Em
defesa da democracia e do direito de Lula ser candidato” – é a palavra de ordem
com a qual o PT pretende manter-se em evidência, radicalizando contra tudo e
contra todos o confronto a propósito do julgamento em segunda instância do
ex-presidente, no caso relativo ao triplex do Guarujá. Até o dia 24, quando o
Tribunal Regional Federal da 4.ª Região (TRF-4) decretará sua sentença em Porto
Alegre, a militância petista e “movimentos sociais” manipulados por sectários
da esquerda como João Pedro Stédile e Guilherme Boulos estarão mobilizados numa
campanha que pretende ter âmbito nacional, com o ambicioso objetivo de promover
uma rebelião popular em defesa do “maior líder popular que o Brasil já
conheceu” e está sendo vítima de “perseguição” por parte de um “governo
golpista” que se tem dedicado a acabar com as “conquistas populares”.
Numa
democracia ninguém pode ser contra o direito de quem quer que seja de
candidatar-se ao que bem entender, principalmente quando se trata de um líder
popular – melhor dito, populista. Mas não é esta a questão em jogo. O que está
em jogo na atual conjuntura é questão institucional da maior relevância: o
império da lei e, em particular, das regras da disputa eleitoral que
estabelecem, em defesa da legitimidade dos mandatos populares, restrições a
políticos com “ficha suja”. São regras que cumprem o mesmo objetivo de
“moralizar a vida pública” fortemente defendidas pelo PT antes de chegar ao
poder.
No dia
24, o TRF-4 não vai decidir se Lula poderá ou não ser candidato à Presidência.
Vai limitar-se ao que lhe cabe: confirmar, ou não, a condenação imposta ao
ex-presidente em primeira instância pela mesma Justiça que já colocou atrás das
grades adversários históricos do PT como Eduardo Cunha e Paulo Maluf e está
investigando denúncias contra muitos outros. Se houver condenação em segunda
instância – ou seja, por um órgão colegiado, como determina a lei –, a
candidatura de Lula estará enquadrada na chamada Lei da Ficha Limpa, o que
resultará no impedimento de sua candidatura à Presidência da República.
Nunca é
demais lembrar, principalmente quando está envolvido na questão um partido como
o PT, que se considera monopolista da defesa dos interesses populares, que a
Lei da Ficha Limpa nasceu, em dezembro de 2010, por iniciativa popular. Foi
coletado 1,6 milhão de assinaturas – 300 mil a mais do que o necessário – e o
projeto tramitou normalmente no Congresso Nacional, sendo aprovado na Câmara
dos Deputados e no Senado Federal para ser, finalmente, sancionada a lei, em 4
de junho de 2010 pelo presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva.
A
estratégia adotada agora pelo PT, transparente em sua página oficial na
internet, é politizar o julgamento do TRF-4 de modo a exacerbar a campanha de
vitimização de Lula, na qual estariam empenhadas “forças poderosas” que
conspiram contra os interesses do povo brasileiro. Para dramatizar a encenação
programada até o dia do julgamento em Porto Alegre, Lula anunciou que pretende
estar presente à sessão, tendo reivindicado ao tribunal o direito de se
manifestar na ocasião.
Fica
difícil entender que esteja em campanha “em defesa da democracia” um partido
político que acredita que a lei deve valer para todos, menos para seu líder.
Este “democrata”, num incontido impulso de revelar suas convicções mais
genuínas, recentemente declarou, em mais uma tola e pretensiosa provocação à
Justiça, que talvez algum dia ele mesmo decida prender aqueles que hoje querem
botá-lo na cadeia. A “defesa da democracia”, para os petistas, resume-se no
momento à preservação do “direito de Lula ser candidato”. O próprio
ex-presidente e seu partido se apresentam como vítimas. Mas as vítimas são
outras. Lula e o PT legaram essa sofrida condição ao povo brasileiro, como
resultado de uma jornada de 13 anos que começou em festa e terminou em
tragédia.
O Estado de S. Paulo
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