Rachel Judah - EJ Robinson
Notícias do mundo exterior chegam à
Coréia do Norte através de canais ilegais
De quem
Kim Jong-un mais tem medo? Não é de Trump, de Xi e nem de Putin, mas do seu
próprio povo. Existe um antigo provérbio coreano que diz que "está escuro
diretamente debaixo da lanterna". Isso significa que, às vezes, a resposta
está bem debaixo do seu nariz. Enquanto o mundo se concentra em forças externas
para encontrar uma solução para o problema da Coreia do Norte, ninguém presta
atenção ao que realmente está acontecendo dentro do país.
Na
verdadeira Coreia do Norte, além dos testes com mísseis, a história está
prestes a se repetir. De acordo com um relatório da ONU, publicado no início
deste ano, 4,4 milhões de norte-coreanos vivem à beira da fome. Isso é quase um
quinto da população. É um cenário surpreendente, especialmente porque há menos
de duas décadas três milhões de norte-coreanos morreram de fome durante a
chamada "Marcha Árdua".
De
acordo com Jihyun Park, uma desertora norte-coreana que agora vive em
Manchester, "todo mundo está no limite. Sessenta anos acreditando no
Querido Líder, no Grande País, para nada. Eles estão cansados de viver."
Kim Jong-un pode ter conseguido impor o poder e o medo sobre o resto do mundo,
mas esqueceu seu próprio povo. Park diz que o povo norte-coreano acolheria uma
guerra já que como "eles morrerão de qualquer maneira, não importa como
morrerão".
O novato
Kim Jong-un não achou fácil perpetuar o legado do pai e do avô, e acredita que
precisa se tornar um super-herói nuclear para manter seu povo marchando em
direção à ordem. Mas os norte-coreanos não são mais tão dóceis como antes.
Desde a fome dos anos 1990, uma rede de Jangmadangs (mercados negros)
introduziu o capitalismo rudimentar, o que lhes mostrou um novo caminho a
seguir na comercialização de mercadorias na fronteira com a China. As pessoas
alcançaram o mundo exterior e não são facilmente enganadas pela propaganda do
governo.
Desertores
como Park também representam uma ameaça para o regime. Ao longo da última
década, dezenas de milhares como ela fugiram do reino do eremita na esperança
de uma vida melhor, e eles se esforçam ao máximo para manter contato com suas
famílias. O grupo ativista "Combatentes pela Coreia do Norte livre"
lança pen drives, DVDs e literatura pró-democracia no Norte por meio de balões.
Notícias do mundo exterior chegam ao país através desses canais ilegais.
Em vez
de assumir cegamente que existe apenas uma solução para o problema e aumentar
as participações através de espetáculos no Twitter, devemos procurar fortalecer
a população da Coreia do Norte. Devemos concentrar nossa energia em criar um
movimento de oposição local forte o suficiente para derrubar Kim Jong-un e
permitir que as pessoas tomem o caminho para mudanças democráticas e não para a
guerra.
Mas como
se empodera uma população faminta? Não enviando assistência internacional. A
ajuda alimentar é desviada para o Exército e acaba ajudando Kim Jong-un a
desenvolver sua base militar. A dinastia de Kim usou sua população faminta como
isca em meados da década de 1990 para extrair subsídios internacionais, que
nunca chegaram às pessoas mais necessitadas.
Não é
apenas uma ajuda alimentar que precisa ser reduzida pela entrada de moeda
estrangeira crucial. Dezenas de milhares de norte-coreanos são enviados para o
exterior para trabalhar como escravos e enviar para casa mais de 1,5 bilhão de
libras por ano, de acordo com a ONU. Nós devemos deixar de oferecer essas
permissões de trabalhadores. Além disso, devemos reprimir o abuso da imunidade
diplomática por coreanos que, no passado, foram pegos contrabandeando ouro.
A
informação precisa fluir - sem ajuda alimentar, sem moeda forte - e os
refugiados precisam fluir. Embora possa soar brutal, deve se permitir que os
norte-coreanos cuidem de seu próprio monstro. O colapso do culto ao Grande
Líder é apenas uma questão de tempo. O que devemos planejar são as
consequências, pois é quando os norte-coreanos precisarão da nossa ajuda mais
do que nunca.
Rachel Judah é jornalista. EJ
Robinson é um autor norte-coreano que mora em Londres. Eles escreveram este
artigo para o "Independent".
O Globo
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