Editorial
É
sintomático que apenas no Judiciário haja pedidos de criação de 5.516 novos
cargos e de gratificações, inclusive de contratações sem concurso
Marca
registrada da burocracia estatal brasileira, o crescimento do número de
funcionários resiste a tudo. Mesmo a momentos como o atual, de grave crise
financeira do Estado. A mais recente comprovação deste viés, noticiada pelo
GLOBO no início da semana, é o acumulo de pedidos de contratações, bem como de
gratificações, encaminhados ao Conselho Nacional de Justiça (CNJ).
Desde
2013, quando a economia já sinalizava dificuldades, chegaram ao CNJ 15 pedidos
de abertura de 5.516 novos cargos e gratificações. No pacote, incluem- se
juízes, com salários iniciais de R$ 27,5 mil, e muitos cargos de livre
provimento — ou seja, a serem preenchidos sem a necessidade de concursos
públicos —, com remunerações entre R$ 6 mil e R$ 14,6 mil. Atendidas as
demandas, as já excessivas despesas da União com pessoal cresceriam R$ 606
milhões em um ano.
Diante
de contas expressas em bilhões de reais, pode- se achar pouco. Mas não é, se
considerarmos que a União já faz grande esforço para encerrar este e o próximo
ano com déficits primários ( sem os juros da dívida) de R$ 159 bilhões, causa
do crescimento ainda sem rédeas da dívida pública em relação ao PIB, um dos
principais termômetros da solvência de um país. No caso do Brasil,
perigosamente em alta. É crucial conter esta corrida ao precipício.
De forma
sintomática, esses milhares de pedidos de mais vagas e verbas de pessoal vêm do
Judiciário, em que, na esfera federal, estão alocados bem mais que 100 mil
funcionários. Outro aspecto é que os tribunais, por características próprias,
costumam ser refratários à modernização de métodos de gestão. Nem todos, é
certo.
A
independência do Judiciário, garantida pela Constituição, necessária para
conceder liberdade ao juiz na interpretação da lei, às vezes é usada a fim de
blindar tribunais contra a modernização administrativa. Por isso, nem sempre
metas estabelecidas pelo CNJ são atingidas, porque não se adotam novos métodos
de trabalho.
O fato é
que, mesmo nesta crise, conceitos como os de eficiência, de produtividade, de
avaliação dos serviços continuam a passar ao largo do Estado.
Tudo
leva à reprodução mecânica do Orçamento, de R$ 3,5 trilhões este ano, sem
qualquer preocupação com a qualidade dos gastos. Tampouco dos serviços
prestados por mais de 2 milhões de servidores, apenas na esfera federal.
Nessa
discussão, costumam- se apresentar comparações internacionais em que o Brasil
não fica distante de outros países em termos de quantidade de servidores em
relação à população e de folha de salários comparada ao PIB.
Trata- se
de falsear a realidade, de tentativas de se escamotear, por exemplo, a má
distribuição de servidores brasileiros entre atividades- meio e fim; de jogar
fumaça sobre a discrepância entre salários de segmentos do funcionalismo e a
qualidade do serviço prestado, por exemplo. A crise deveria estimular este
debate.
O Globo
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