Vera Magalhães
Ação
mais firme do Supremo é medida urgente e eficaz para que políticos recuem de
sua ousadia
Em 25 de
novembro de 2015, o Senado manteve a prisão em flagrante de Delcídio do Amaral
por 59 votos a 13. Anteontem, a Assembleia Legislativa do Rio resolveu soltar
Jorge Picciani e dois asseclas por um placar também dilatado: 39 a 19.
O que
mudou nesses dois anos? Não, não foi o entendimento do STF (Supremo Tribunal
Federal) sobre Aécio Neves, uma vez que a Constituição já prevê desde sempre
que o Legislativo tem de votar a prisão de parlamentares – o que, aliás, não
era o caso do mineiro.
que
mudou foi que os políticos perderam os pruridos de reagir de peito aberto à
Lava Jato e às demais investigações que ameaçam sua sobrevivência. E o caso
Aécio foi, certamente, um dos impulsos para o “liberou geral”, mas não foi o
primeiro.
Antes de
o presidente do PSDB ser pilhado numa conversa de comparsas com Joesley Batista
justamente numa tentativa desesperada de se safar da Lava Jato, já havia uma
espécie de aliança tácita de todos os partidos para tentar “separar o joio do
trigo”: pagariam aqueles implicados até a medula e se safariam os que “só”
praticaram aquele caixa 2 romântico, a corrupção-moleque. Mas a reação da
sociedade, da imprensa e de setores do Judiciário e do Ministério Público
impedia que a operação-abafa prosperasse.
O que
permitiu que se perdesse a vergonha de tentar colocar um freio no combate à
impunidade foi, paradoxalmente, uma sucessão de erros por parte do Ministério
Público e do Supremo. E a proximidade das eleições.
Ao
chancelar o acordo indefensável com os delatores da J&F, nas condições que
agora são conhecidas, Rodrigo Janot desguarneceu os flancos e permitiu o
contra-ataque voraz dos políticos. Colocou em xeque não só aquele acordo, mas o
instituto da delação premiada como um todo, com aval de uma parcela do STF.
Da mesma
maneira, ao resolver inovar e determinar uma medida cautelar que nem havia sido
pedida pelo MPF no caso de Aécio, a Primeira Turma do STF criou uma crise entre
Poderes que o próprio pleno teve de consertar, constrangido, e deu a desculpa
que os senadores precisavam para posar de ofendidos e salvar o colega. Não
seria o caminho correto a turma decidir sobre a denúncia contra Aécio – já
apresentada há cinco meses! –, tornar o mineiro réu, se for o caso, e depois
julgá-lo?
Com um
STF assim hesitante, os políticos perderam a vergonha e decidiram escancarar o
“salve geral”. Valeu no Senado, se repetiu na Alerj e será a regra daqui por
diante. Portanto, não foi o entendimento legal que mudou de Delcídio para Aécio
ou Picciani. Foi o ambiente.
Ir às
ruas ou fazer abaixo-assinados pela mudança de institutos legais como o artigo
53 da Constituição, que está claramente defasado ao garantir imunidade plena a
parlamentares que usam os mandatos para delinquir, também não parece ser
eficaz.
Assim
como a licença para os políticos se espalharem foi dada pela hesitação do
Supremo, cabe a ele dar um basta nesse vale tudo. Unificando o entendimento
sobre questões cruciais às investigações – a extensão do foro privilegiado, que
vai à pauta na semana que entra, prisões em segunda instância, validade dos
acordos de delação, prazo das prisões preventivas etc. Mas, sobretudo,
julgando!
Os
processos contra políticos se eternizam, num ritmo que permite, sim, à
sociedade concluir que, em sua instância mais alta, a Justiça contribui para
perpetuar a impunidade. Uma ação mais firme da Suprema Corte é a medida urgente
e eficaz para que os políticos recuem de sua ousadia.
O Estado de São Paulo
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