Lucianne Carneiro
Embaixador defende reformas
política, previdenciária e tributária para que crescimento do país se torne
sustentável
Ex-ministro
da Fazenda, o embaixador Rubens Ricupero acredita que o Brasil tem hoje duas
imagens no exterior: uma mais positiva, ligada à recuperação da economia, e
outra negativa pela corrupção e criminalidade. A despeito do maior dinamismo
econômico, ele não vê sustentabilidade do crescimento se não avançarem
reformas. Hoje, lança seu livro “A diplomacia na construção do Brasil”, com um
debate na Academia Brasileira de Letras (ABL), às 10h, promovido pelo Centro
Brasileiro de Relações Internacionais (Cebri).
Qual é hoje a imagem do Brasil lá
fora?
Os
empresários e as pessoas ligadas ao mercado financeiro de outros países estão
informados de que a economia começa a se recuperar e sair da recessão,
tornando-se um destino atrativo. Esse lado é positivo. Mas, para o público em
geral, o Brasil tem uma imagem negativa. Para eles, conta mais a corrupção, o
aumento da criminalidade e a incapacidade de o sistema político adotar as
reformas necessárias. E não se pode dizer que a imagem não corresponda à
realidade. A única solução seria o país mudar, aprovar as reformas políticas, o
que não ocorreu agora. Desperdiçou-se a oportunidade.
A recuperação da economia que se vê
é sustentável?
Sem
outras reformas, o crescimento não será sustentável. Pode até animar por dois
anos, mas é a história do voo da galinha. Um presidente que se eleja em 2018,
mesmo bom, terá dificuldade de fazer algo com as atuais regras. Penso que os
mercados, tanto no Brasil quanto lá fora, apostam que as coisas vão melhorar,
que haverá um presidente que vai fazer a reforma da Previdência... Mas isso é
puramente sonho. Se, no ano que vem, começa a pintar que um sujeito complicado
vai ganhar a eleição, tudo vem abaixo: câmbio, ações... Como em 2002.
Quais reformas vê como importantes
além da política?
A
reforma da Previdência é um caso óbvio. O abono salarial tem pesado muito no
Orçamento, a questão de usar o salário mínimo como padrão para os benefícios de
prestação continuada também. Tudo isso tem que ser revisto. (...) A reforma
tributária também é importante: é preciso ter faixas mais altas de tributação
para quem ganha mais, e defendo o fim da isenção do Imposto de Renda sobre os
dividendos.
O senhor disse que se desperdiçou a
oportunidade da reforma política...
Pouco
foi feito, e o que eu lamento é que, naquilo que poderíamos compensar um pouco,
como no meio ambiente e nos direitos sociais, a situação está se agravando. Não
é um caso isolado, é um padrão, com uma série de medidas — quase todas com
origem no setor mais retrógrado da bancada ruralista, que, por seu peso e pela
fragilidade do governo, consegue concessões. O projeto de licenciamento
ambiental, da forma como saiu da Presidência, liquida o licenciamento como o
conhecemos. É o caso das reservas indígenas, que foram paralisadas pelo
Ministério da Justiça; é o caso dos quilombos; agora é o caso do trabalho
escravo... Antes, uma comissão da Câmara aprovou um projeto que permite deduzir
do salário do trabalhador rural sua alimentação. Isso tudo é grave. No caso da
política, as reformas não são feitas. Nesse caso, estamos retrocedendo em
avanços que tínhamos feito. Tudo era um avanço social, que começamos a perder.
Lembra muito o governo (Donald) Trump.
Como avalia o grau de corrupção?
Não
acredito que países do tamanho do Brasil e com grau de participação do governo
na economia, como China, Rússia, Índia, África do Sul e Paquistão, entre
outros, sejam muito melhores que o Brasil em corrupção. Mas nenhum deles tem a
combinação que permitiu o aparecimento da Lava-Jato, que é uma imprensa moderna
com um setor do Judiciário que teve coragem de levar isso adiante. Isso é uma
questão de geração. Os que são de confiança (na Justiça) são os de 30, 40 anos.
A geração mais antiga ficou constrangida em seguir esse movimento. (...) Daqui
a cinco anos, teremos a comemoração do bicentenário da Independência. No
centenário, o ano começou com a Semana de Arte Moderna, teve a fundação do
Partido Comunista do Brasil, a Revolta dos 18 do Forte de Copacabana e a
criação do Imposto de Renda. Todos dizem que o Brasil carece de um projeto de
nação, e é verdade. Mas um projeto precisa ter metas e prazos. O Brasil poderia
adotar um projeto de chegar a setembro de 2022 melhor do que está hoje e, para
isso, aprovar uma série de metas, como a ONU fez nas áreas de política,
economia, meio ambiente e direitos sociais.
Qual é a principal ideia do livro?
Procurei
mostrar nesse livro que a política externa, política interna e economia é tudo
a mesma coisa. A divisão é apenas por efeito didático. Enquanto o Brasil não
melhorar, a diplomacia não vai poder retomar sua trajetória positiva.
O Globo
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