Editorial
Déficits gigantescos justificam que
os governantes façam cumprir legislação já existente que determina a abertura
de fato da caixa-preta das despesas públicas
Chefes
do Executivo, Legislativo e Judiciário deveriam se reunir e impor, com
urgência, normas harmônicas e obrigatórias em todas as instâncias de governo,
organismos estatais e paraestatais, com o objetivo de possibilitar a rápida e
clara compreensão sobre como o poder público gasta o dinheiro dos cidadãos. É o
mínimo que podem e precisam fazer: expor à luz do sol o real significado de um
rombo de R$ 318 bilhões nas contas públicas deste e no próximo ano. Os
brasileiros têm o direito de saber como, onde, quando e por que se produz um
déficit de cerca R$ 7,3 milhões a cada minuto nas administrações federal,
estadual e municipal.
Leis
sobre a transparência no uso de dinheiro público existem há muito tempo. Falta
empenho dos gestores responsáveis em fazê-las cumprir em todos os níveis, com a
devida prestação de contas em formato simples, que possibilite a leitura e
compreensão de forma direta e clara pela sociedade.
Nos
últimos anos parte dos órgãos do Executivo, Legislativo e Judiciário habilitou
na internet seções de dados sob a rubrica "Transparência".
Naufragou-se nos complexos formatos, na falta de padrões e obstáculos de toda
natureza impostos a quem não tem o dever de dominar técnicas orçamentárias.
A
maioria dos órgãos públicos nem mesmo atualiza os dados, quase sempre
ilegíveis. Assembleias Legislativas, como a do Rio, demonstram absoluta
despreocupação com a lei. Um terço das prefeituras nem presta contas aos órgãos
de controle nem ao contribuinte.
O
Supremo Tribunal Federal, porém, acaba de demonstrar que a transparência no uso
do dinheiro público é possível. Expôs na internet, de forma simplificada,
acessível, organizada e legível, os gastos da instituição com pessoal, custeio
e investimentos. O Conselho Nacional de Justiça obrigou os tribunais a apresentar
dados detalhados sobre todos os pagamentos. É um começo.
O
gigantismo do Estado brasileiro ainda não está retratado para a sociedade. Como
se sabe, o aparato estatal vai muito além da administração pública. Estende-se
por uma miríade de entidades privadas, dependentes de recursos orçamentários.
Mostram-se resilientes à transparência e controle. É o caso, por exemplo, das
16 mil organizações sindicais trabalhistas e patronais inscritas no Ministério
do Trabalho.
As mais
ricas entidades patronais recebem R$ 1 bilhão por ano apenas para “gerenciar” o
chamado Sistema S (Sec, Senac, Sesi e Senai). Assim como as centrais
trabalhistas, dissimulam, quando não ocultam, o detalhamento do uso de recursos
públicos. Da mesma forma procedem as universidades. Zelam pela autonomia, mas
esquecem de prestar contas à sociedade. É dinheiro público apropriado e usado
como se fosse privado. Os chefes do Executivo, Legislativo e Judiciário
deveriam se unir e expor a verdade da crise fiscal aos brasileiros pelo caminho
mais simples e direto — o da transparência no uso do dinheiro público.
O Globo
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