JOSÉ
NÊUMANNE
As
chances de o Brasil continuar a não dar certo são de 77% e as necessárias
reformas e modernização para o País crescer e prosperar não são inviáveis, mas
dependem de a maioria do eleitorado ser convencido de que a melhor saída seria
essa.
O ano começou com uma expectativa generalizada de que teria início nele algo que um romancista inspirado chamaria de “o verão de nossas esperanças”. Antes de setembro chegar, trazendo a primavera, ninguém precisará ser muito pessimista para lembrar, neste “inverno de nossas desilusões”, que agosto é, de fato, um mês de muito desgosto e que o verão de 2019 em nada corresponderá aos sonhos de renovação de oito meses atrás. Por quê?
Em 2005 teve início no Supremo Tribunal Federal (STF) o julgamento da Ação Penal 470, que ficou popular com o apelido de mensalão e radiografou a podridão das vísceras do primeiro governo soit-disant socialista da História, sob a égide do ex-sindicalista Luiz Inácio Lula da Silva. Nos debates do plenário da Corte, acompanhados com interesse antes só despertado pelos festivais da canção e pela Copa do Mundo, foi revelado ao povo um esquema de compra de apoio parlamentar com o erário sendo tratado como quirera.
Os
“supremos” magistrados condenaram à prisão políticos de alto coturno, que
trataram os partidos que dirigiam como se fossem organizações criminosas: José
Dirceu e José Genoino, que tinham presidido o Partido dos Trabalhadores (PT),
Roberto Jefferson, suserano do Partido Trabalhista Brasileiro (PTB), Valdemar
Costa Neto, rei do Partido Liberal (PL), que viraria Partido da República (PR),
Pedro Corrêa, dirigente do Partido Progressista (PP), e outros.
Reza o
folclore político que, instado a participar de um movimento para depor o então
presidente Lula, o ex-chefão do Partido da Frente Liberal (PFL), hoje o
Democratas (DEM), Antônio Carlos Magalhães, disse que preferia derrotá-lo nas
urnas. Como a História, implacável, registra, Lula bateu o tucano Geraldo
Alckmin na eleição de 2006. Os chefões das quadrilhas partidárias seriam,
depois, indultados pela companheira Dilma Rousseff, que Lula elegeria sua
sucessora, e, afinal, perdoados pelos companheiros nomeados para o fiel e
desleal STF.
Mas, ah,
ora, direis, ouvindo estrelas, o povo foi às ruas para reclamar daquilo que,
antes de comandar a rapina nos cofres públicos, o PT chamava de “tudo o que
está aí”. A rebelião das ruas, que apoiou o combate à corrupção por uma geração
de jovens policiais, procuradores e juízes federais, porém, passou ao largo de
alguma mudança de fato no Brasil que Machado de Assis chamava de “oficial”, em
contraponto ao nobre, pobre e probo “País real”. No ano seguinte às
espetaculares manifestações de rua em nossas cidades, 2014, Dilma foi reeleita
com Temer e o PMDB na chapa em campanha de que, como depois revelaria outra
devassa, nem os vencidos sairiam inocentes. Tudo como dantes no cartel de
Abrantes.
Para
cúmulo da ironia, levado a julgamento no Tribunal Superior Eleitoral (TSE), o
triunfo da chapa que juntou a fome com a vontade de comer passou a ser dado
como absolvida “por excesso de provas”. Mas a decisão, tomada numa sessão
presidida pelo ministro do STF Gilmar Mendes, manteve Temer na Presidência,
depois do impeachment da titular da chapa vencedora. E Dilma sem cargo, mas
liberada para ocupar posto público por uma canetada praticada pelas mãos
esquerdas do senador peemedebista Renan Calheiros e do então presidente do STF,
Ricardo Lewandowski.
Isso
ocorreu apesar do enorme entusiasmo popular com novo feito da Justiça em
primeira instância, a Operação Lava Jato, iniciada em 2014 e responsável pela
sequência da AP 470, levando às barras dos tribunais e às celas os maiores
empreiteiros do Brasil, Marcelo Odebrecht à frente, e o ex-presidente Lula.
Este havia saído incólume do mensalão por obra e graça da omissão do relator,
tido como implacável, Joaquim Barbosa, e a atenta proteção do sucessor deste na
presidência do STF, Lewandowski. O que não impediu que depois fosse condenado e
preso como “chefe da quadrilha”.
No
verão, esperava-se que se elegessem um presidente para limpar a máquina pública
e um Congresso para apoiá-lo na guerra à corrupção. No inverno, 90% dos
deputados e 65% dos senadores candidatos sepultam o devaneio do “não reeleja
ninguém”. Dos seis pretendentes à Presidência com chance, nenhum se compromete
com o que de fato importa: o combate a privilégios, política econômica para pôr
fim à crise e ao desemprego e o basta à impunidade de criminosos armados ou de
colarinho branco. Quem está em primeiro lugar nas pesquisas de preferência de
voto é um condenado por corrupção e lavagem de dinheiro a 12 anos e 1 mês de
prisão.
O
economista Cláudio Porto, da Macroplan, acaba de divulgar a pesquisa Cinco
cenários para o governo do Brasil 2019-2023, que conclui que qualquer governo
terá de conviver com cinco condicionantes imediatos: renda per capita 9% abaixo
da de 2014 e desemprego de 14 milhões de pessoas; contexto externo menos
favorável do que o dos últimos anos; tensão permanente entre a população
impaciente e a maioria fisiológica dos políticos; demandas da sociedade por
mais e melhores serviços públicos, em confronto com a manutenção e a conquista
de mais benesses pelo baronato de políticos; e combate à corrupção menos intenso.
Para
enfrentar esses problemas o eleitorado, segundo Porto, divide-se pela metade,
não entre esquerda e direita, mas entre a sedução do populismo e a saída não
populista. A pesquisa, feita para a Macroplan pelo economista Flávio Tadashi
entre 6 e 8 de agosto, situa em 16,1% a adesão ao populismo de esquerda; 17,4%
ao de direita e 16,5% ao “de ocasião”. A saída não populista divide-se em 27%
para a conservação do status quo e 23% para o “reformismo modernizante”.
As
chances de o Brasil continuar a não dar certo são de 77% e as necessárias
reformas e modernização para o País crescer e prosperar não são inviáveis, mas
dependem de a maioria do eleitorado ser convencido de que a melhor saída seria
essa.
O Estado de São Paulo
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