Estadão
O funcionalismo público desfruta de um rol de benefícios e privilégios
inacessível à imensa maioria dos trabalhadores do setor privado. Um exemplo bem
conhecido dessa realidade é a disparidade entre as regras do regime
previdenciário dos funcionários públicos e as do regime geral aplicadas aos
trabalhadores. Há também outras benesses menos conhecidas, restritas a alguns
setores ou estatais, que são igualmente deploráveis. Recentemente, o Estado
revelou uma série de privilégios encontrados na Empresa Brasileira de
Comunicação (EBC), estatal criada no segundo governo Lula. A empresa tem 2.307
empregados, que, nos últimos seis meses, apresentaram 2.845 atestados médicos e
pedidos de afastamento. Certamente, o departamento pessoal da estatal tem muito
trabalho: são, em média, quase 16 solicitações por dia.
O número descomunal de ausências não é fruto do acaso. Na EBC vigora
um peculiar acordo coletivo que permite aos funcionários faltarem até cinco
dias por ano para acompanhar, em consultas ao médico ou ao dentista, o cônjuge,
o companheiro, o pai, a mãe, o filho, o enteado ou dependente legal. Fica fácil
encontrar motivo para faltar ao trabalho.
Outra generosidade da estatal da comunicação é que, se o período do
afastamento for inferior a quatro meses, o empregado tem direito ao salário
integral. Sendo assim, também não é de estranhar a quantidade de pedidos de
afastamento.
A EBC também é generosa com os salários. Na sua folha de pagamento,
constam ao menos 83 empregados que recebem mais de R$ 20 mil, além de outros
benefícios. No setor de contabilidade, há uma funcionária concursada que recebe
R$ 35,8 mil mensais. Conforme a Constituição estabelece, o teto salarial do
funcionalismo é o salário de ministro do Supremo Tribunal Federal, que hoje é
de R$ 33,7 mil.
Em maio, por exemplo, houve cinegrafistas que receberam R$ 25 mil da
EBC. A iniciativa privada paga, em média, R$ 4 mil para a mesma função. Uma
secretária recebeu R$ 27,8 mil, valor similar ao do salário inicial de um juiz.
Em nota sobre os altos valores, a EBC informou que os vencimentos mais altos se
referem a salários de empregados que “obtiveram progressão salarial em décadas
de carreira” ou que “recorreram à Justiça para incorporar valores a sua
remuneração”.
Além de lembrar as distorções salariais causadas pela submissão do
Judiciário às pressões das corporações públicas, a explicação da EBC desmonta o
discurso, sempre repetido por setores do funcionalismo público, a respeito do
achatamento dos salários na área pública, que estariam sempre defasados. Como
se vê, longe de ocasionar perdas salariais, o transcurso do tempo – a
“progressão salarial em décadas de carreiras” – tem proporcionado a
funcionários públicos pródigos salários, completamente fora da realidade do
mercado de trabalho.
Outra estatal com uma folha de pagamento extravagante é a Infraero,
segundo informações da Folha de S.Paulo. Com a concessão de vários aeroportos à
iniciativa privada, a empresa reduziu suas atividades operacionais, mas não
reduziu, na mesma proporção, o número de seus funcionários, havendo, agora,
gente excedente. Como medida para alocar seus empregados, a Infraero chegou ao
descalabro de inventar funções, até então desnecessárias, como a de vigia de
refeitório.
Com uma folha de pagamento de R$ 2,1 bilhões, representando 68% das
despesas operacionais, não há outra solução para a Infraero que a redução do
número de funcionários. No entanto, na época das concessões, o governo federal,
Dilma Rousseff à frente, assinou um acordo comprometendo-se a não demitir, sem
justa causa, mais que sete trabalhadores por ano até 2018. Hoje, a empresa tem
cerca de 10 mil funcionários. Como se não bastasse, o acerto foi prorrogado até
2020.
Não é sem razão que boa parte do funcionalismo público vive num mundo
à parte. Há um conjunto, aparentemente ininterrupto, de péssimas decisões a
sustentar, com dinheiro do contribuinte, essa vida tão diferente da do mundo
real.
Nenhum comentário:
Postar um comentário