Rubens Valente
Há mais
de 20 anos, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva e o ex-deputado José
Dirceu choraram em um encontro nacional do PT quando um militante foi à tribuna
para criticar os rumos que a corrente majoritária do partido vinha tomando. No
centro da polêmica estavam pagamentos feitos pela Odebrecht ao partido.
A
história começou na campanha eleitoral de 1994, quando José Dirceu se lançou ao
governo de São Paulo, mas foi derrotado. Após a disputa, a imprensa revelou a
lista dos doadores. Naquela época, os financiadores só eram divulgados pela
Justiça Eleitoral após o fim da campanha.
Dirceu
declarou ter arrecadado R$ 1,1 milhão. Desse total, 42% vieram da Odebrecht e
de uma empresa sob seu controle, a CBPO. A empreiteira também doou para as
campanhas do PT no Distrito Federal e no Espírito Santo.
A
notícia chocou a militância mais à esquerda no partido porque a Odebrecht havia
passado por dois escândalos duramente atacados pelo PT– em especial por José
Dirceu, na época deputado federal– nas CPIs que investigaram o esquema PC
Farias, durante o governo de Fernando Collor, em 1992; e dos Anões do
Orçamento, em 1993.
Uma
corrente do PT em Brasília tentou até mesmo devolver à empreiteira os R$ 200
mil que a sigla havia recebido. Um dos fundadores do partido, o economista e
ex-guerrilheiro Paulo de Tarso Venceslau disse à Folha que soube do próprio
Dirceu o quanto o caso Odebrecht o incomodou na época.
"Eu
tive reuniões com ele e estava frustradíssimo. Ele dizia que esses recursos da
Odebrecht estavam aparecendo na prestação de contas dele, mas que o dinheiro
era para a campanha do Lula. A campanha do Dirceu foi usada para fazer a
triangulação", disse Venceslau, que contou a mesma história à CPI dos
Bingos, em 2006.
Venceslau
disse que, no começo de 1995, Dirceu se mostrava disposto a deixar a
organização do partido e chegou a procurar um imóvel para montar um escritório
de advocacia na companhia de outras duas militantes petistas. Mas ele se
acertou com Lula e passou a ser apoiado para a presidência nacional do PT,
segundo Venceslau.
"Esse
é o maior mistério: como foi esse acordo. É uma coisa que ninguém sabe
direito", afirmou o ex-guerrilheiro que, nos anos 1990, denunciou o que
ficou conhecido como Caso CPEM.
Considerado
o primeiro escândalo do PT, o caso gerou uma investigação conduzida pelo
partido sobre Lula e seu compadre, o advogado Roberto Teixeira –hoje, o
ex-presidente e Teixeira são réus na Operação Lava Jato.
Meses
depois de ficarem conhecidas as doações da Odebrecht para Dirceu, o PT realizou
em Guarapari (ES) seu 10º encontro nacional para escolher o novo presidente da
sigla. Contra o candidato de Lula –José Dirceu–, estava Hamilton Pereira,
apoiado pelo editor e ex-guerrilheiro César Benjamin na corrente "A hora
da verdade".
Benjamin
foi ao microfone para uma plateia estimada em 500 delegados da sigla de todo o
país. Ele denunciou que "parte da campanha" de Dirceu havia sido
bancada pela Odebrecht e fez duras críticas à cúpula da legenda por receber de
empreiteiras.
A Folha,
que acompanhou o encontro, narrou na época que petistas do grupo de Lula e
Dirceu "avançaram em direção a Benjamin", enquanto Dirceu chorava,
sentado. "Lula também chorou, assim como outros dirigentes." Uma
fotografia mostra Dirceu passando o dedo no olho direito enquanto é consolado
pelo hoje deputado Arlindo Chinaglia (PT-SP).
Três
dias depois, Benjamin anunciou em artigo publicado pela Folha, que deixaria o
PT. "Minha frase sobre a Odebrecht não foi dúbia nem irônica",
escreveu.
"Não
houve desvio individual de conduta. Tudo decorreu de uma lógica, a das máquinas
eleitorais (que, aliás, só no PT, entre os grandes partidos, ainda pode ao
menos ser questionada). Dirceu é inocente, mas não o sistema de poder que
governa o PT, aliás, com apoio das bases", concluiu Benjamin.
Folha de São Paulo
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