Luiz Carlos Azedo
Um dos
fatores de instabilidade do processo político, muito maior do que a
impopularidade do presidente Temer, é a morosidade da Justiça
O
governo Temer herdou de Dilma Rousseff uma herança pesada, a começar pelo
desgaste político dele próprio, que não goza de popularidade e enfrenta uma
oposição encarniçada, que não prima pela honestidade no discurso e, em alguns
casos, pela propriamente dita. É uma herança maldita, para usar uma expressão
cunhada pelo ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva para maldizer seu
antecessor, Fernando Henrique Cardoso.
Primeiramente,
como diria o Odorico Paraguaçu — o impagável personagem criado por Dias Gomes e
personificado por Paulo Gracindo —, Temer herdou a Operação Lava-Jato, que pode
levar o ex-presidente Lula para a cadeia, como outros petistas e seus aliados,
mas agora ronda o miolo do atual governo e ameaça boa parte da elite política
do país. Essa é a variável mais imponderável.
Segundo
(vamos deixar o Odorico de lado), enfrenta a maior recessão da história do
país, resultado, de um lado, da roubalheira na Petrobras e seu “capitalismo de
laços”; de outro, do experimentalismo irresponsável da “nova matriz econômica”
(eufemismo de um projeto de capitalismo de estado nacional-desenvolvimentista)
da ex-presidente Dilma Rousseff.
Estamos
com uma brutal taxa de desemprego e somente agora a inflação cedeu. A curto
prazo não teremos reversão desse quadro.
Terceiro,
uma base política muito heterogênea, da qual fazem parte as forças de
centro-direita que apoiavam o governo anterior, a começar pelo PMDB, e as de
centro-esquerda que protagonizaram o impeachment da presidente Dilma Rousseff.
Essa base é ampla para garantir a estabilidade do governo, mas rasa demais para
aprovar reformas profundas. Além disso, em parte, padece dos velhos males do
fisiologismo e do patrimonialismo que caracterizam a política tradicional
brasileira, o que dificulta o ajuste fiscal.
Resumidamente,
essa é a herança maldita com a qual teremos que conviver até 2018, quando
haverá eleições gerais, conforme o calendário estabelecido pela Constituição
brasileira. O tempo é curto para enfrentar os desafios do presente, e o futuro,
incerto, principalmente por causa do julgamento das contas de campanha da chapa
Dilma-Temer.
A tutela
Um dos
fatores de instabilidade do processo político, muito maior do que a
impopularidade do presidente Temer, é a morosidade da Justiça. Tudo bem que
decorre do acúmulo de processos, mas é um problema político grave. O
devagar-quase-parando do Supremo Tribunal Federal (STF), que julga
parlamentares e ministros; do Superior Tribunal de Justiça (STJ), os
governadores; e do TSE, que aprecia as contas de campanha, na medida em que
aumenta o estoque de políticos enrolados na Justiça, tutela os demais Poderes e
desequilibra as relações entre Executivo, Legislativo e Judiciário.
Essa
questão tende a agravar a instabilidade política no decorrer do ano, no qual os
desdobramentos das delações premiadas de Emílio e Marcelo Odebrecht prometem
fortes emoções políticas. Os tribunais não julgam, não separam o joio do trigo,
não põem na cadeia quem merece, não livram a cara de quem não tem culpa no
cartório. Com isso, o bloco dos que querem mudar as regras do jogo para
garantir a impunidade no Congresso só aumenta. É inevitável, a não ser que os
julgamentos ocorram.
Deixemos
de lado a Lava-Jato. Vejamos o caso das contas de campanha de Dilma Rousseff.
Até o flanelinha do estacionamento que separa a Câmara do STF sabe que já estão
comprovados o uso de caixa dois da Odebrecht e a lavagem de dinheiro na
campanha da petista. O que não sabe é se Michel Temer será condenado também ou
se suas contas serão apartadas e aprovadas.
Caso o
julgamento tivesse ocorrido, Temer estaria menos vulnerável ou já estaríamos
com um novo presidente eleito pelo voto direto. Como não ocorreu (é a tal
história, se vovó tivesse barba, era vovô), caso seja condenado como Dilma,
teremos uma inédita eleição indireta no Congresso e muita “balbúrdia”, como
diria o sociólogo Luiz Werneck Vianna. Quem tira partido dessa situação? O
ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que já é réu em cinco processos, a
maioria em Curitiba. Jararaca criada, o petista agora prega abertamente a
antecipação das eleições gerais, com o argumento de que Temer não tem
legitimidade para governar nem o Congresso para fazer reformas. Lula finge que
a herança maldita não é sua também, só de Dilma. Quer ser absolvido da
Lava-Jato pelas urnas.
Correio Brasiliense
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