Editorial
Enquanto
Luiz Inácio Lula da Silva dá tratos à bola para se livrar da cadeia, os
intelectuais petistas preparam propostas para “resgatar” a imagem do PT, a
serem apresentadas ao 6.º Congresso Nacional do partido, marcado para abril.
Nesse
contexto, duas questões se destacam: a que é objeto dos textos Balanço de
Governo Estrutura e Funcionamento, voltados para uma avaliação crítica da
atuação do PT desde a primeira eleição de Lula à Presidência da República, e
Luta Contra a Corrupção, dedicado à análise dos desvios éticos dos petistas
desde que chegaram ao poder. Trata-se, de um lado, de elucubrações requentadas
sobre o papel da esquerda na política brasileira. De outra parte, a que cuida
de corrupção, todo o conteúdo também é puramente ficcional.
Para entender
melhor a enrascada em que o PT está metido desde que o povo brasileiro
descobriu quem são de verdade Lula e sua turma, convém rememorar os primórdios
da fundação daquele que se propunha a ser “o” partido dos trabalhadores.
Empenhados no combate à ditadura militar, intelectuais de esquerda, aliados a
setores ditos “progressistas” da Igreja Católica, chegaram à conclusão, em
meados dos anos 70, de que precisavam de alguém que personificasse a luta pela
democratização do País e que este papel era perfeito para um jovem e aguerrido
líder sindical que então se destacava no comando da elite do movimento
operário: Lula, presidente do Sindicato dos Metalúrgicos de São Bernardo do
Campo.
Naquela
época Lula não queria nem ouvir falar de política e políticos, pelos quais
nutria indisfarçável desprezo, comparável apenas ao que dedicava a intelectuais
e acadêmicos. Mas logo descobriu que a liderança de um partido político “de
operários” lhe cairia bem, até porque estava certo – como demonstrou acima de
qualquer dúvida – de que não teria nenhuma dificuldade para enquadrar
devidamente os “professores” que imaginavam poder manipulá-lo.
Durante
mais de 20 anos, o PT lutou contra tudo e contra todos, inclusive contra a
Constituição de 1988, o Plano Real, a Lei de Responsabilidade Fiscal e,
principalmente, contra a economia de mercado. Até que Lula se deu conta de que
estava tudo errado, mas com o próprio PT. E que, para ganhar uma eleição
presidencial – a terceira que disputaria, em 2002 –, era preciso fazer aquilo que
hoje, no documento Estrutura e Funcionamento, a esquerda petista critica:
“deslocou-se para o centro” e “deixou vago o espaço político de esquerda”. O
instrumento dessa guinada foi a famosa Carta ao Povo Brasileiro, por meio da
qual – denuncia agora o documento Balanço de Governo – Lula propôs “um pacto de
não agressão em relação aos capitalistas” e, em vez da “ruptura” até então
defendida pelo PT, optou por promover programas sociais “sem confrontar o
capital”.
Fica
claro, assim, que a esquerda do PT continua mais bolivariana do que nunca e
defende para o Brasil a mesma “ruptura” com a economia de mercado que colocou
Cuba e Venezuela onde estão hoje. Para esses salvadores da Pátria nostálgicos
dos anos 50 do século passado, o Brasil precisa de um regime “democrático”
totalmente controlado pelo Estado, com “proibição de bancos privados, limites
regionais para propriedades rurais”, além, é claro, de um bom controle da mídia
por meio da criação de um “Fundo de Defesa da Liberdade de Imprensa e do
horário sindical gratuito na TV”.
Essa é
uma pregação até capaz de ainda animar corações e mentes de jovens sonhadores,
generosos e mal informados. E assim esse ideário poderá voltar ao programa
partidário. O mais difícil, na verdade, impossível, é o PT chegar a um acordo
sobre o tema “Combate à Corrupção”. A ideia é criar um “tribunal de honra” no
qual personalidades do partido sejam julgadas internamente por eventuais
transgressões éticas e legais. Dá para imaginar Lula sentado no banco dos réus
desse tribunal?
O
notório Marco Aurélio Garcia, um dos donos do partido que cultivam
irrepreensível fidelidade ao Grande Chefe, deu o recado: “O 6.° Congresso do PT
não é um tribunal nem será ocasião para um ajuste de contas mesquinhas entre
tendências”. Perfeitamente claro.
O Estado
de S. Paulo
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