Vicente Nunes
Se boa
parte do mundo ficou atônita com as medidas anunciadas pelo novo presidente dos
Estados Unidos, Donald Trump, em sua primeira semana de governo, no mercado
financeiro, não houve comoção. O que realmente importa para os investidores
ainda é uma incógnita: os estímulos fiscais. Durante toda a campanha, Trump
disse que promoveria um amplo corte de impostos e destinaria uma montanha de
recursos públicos para obras de infraestrutura.
Em uma
publicação denominada Scoring the Trump Economic Plan: Trade, Regulatory &
Energy Policy Impacts, Peter Navarro e Wilbur Ross, conselheiros econômicos do
presidente dos EUA, estimam que pelo menos US$ 513 bilhões poderão ser
injetados na economia norte-americana todos os anos. Esses recursos teriam por
objetivo impulsionar o Produto Interno Bruto (PIB) e abrir vagas para abrigar
trabalhadores nascidos na principal potência do planeta.
Na
avaliação dos investidores, se realmente cumprir essa promessa, Trump obrigará
o Federal Reserve (Fed), o Banco Central dos EUA, a pisar no acelerador e
aumentar mais rapidamente as taxas de juros. Crescimento maior, como já
ressaltou o próprio Fed em seus documentos mais recentes, pressionará a
inflação, exigindo uma ação mais enérgica da política monetária. A elevação
mais forte dos juros obrigará o mercado financeiro, que anda em lua de mel com
Trump, a rever uma série de posições, sobretudo em países emergentes como o
Brasil.
Isso
quer dizer que todo o movimento positivo que se viu nos últimos dias nas bolsas
de valores e no mercado de câmbio pode cessar, caso o Fed responda com vigor às
ações de Trump na questão fiscal. Os investidores entendem que Trump não dará
todos os estímulos de uma vez nem na proporção sinalizada por ele, pois várias
das medidas têm que passar pelo Congresso dos EUA. Apesar de tanto a Câmara
quanto o Senado serem dominados pelo partido Republicano, do presidente,
historicamente, a legenda não é afeita a deficits nas contas públicas e a
crescimento expressivo da dívida interna.
Infraestrutura
Rafael
Cardoso, economista da Daycoval Investimentos, afirma que, a despeito de um
aumento mais expressivo dos juros pelo Fed afetar o Brasil, o país pode tirar
proveito de parte das medidas de estímulos à economia que venham a ser adotadas
por Trump, especialmente em relação às obras de infraestrutura. Esses
empreendimentos devem elevar os preços de commodities importantes produzidas no
país, como as metálicas.
Somente
a expectativa de as obras saírem do papel fez com que o preço do minério de
ferro disparasse e encerrasse as negociações de ontem a US$ 83,30 a tonelada, o
dobro do verificado no início de 2016. As ações da Vale responderam, neste ano,
por um terço da valorização da Bolsa São Paulo. E mais: commodities em alta
significam, em geral, dólar em queda, um alívio para o BC brasileiro.
Para o
mercado, seria mais importante que Trump concentrasse os estímulos fiscais em
investimentos em infraestrutura, ainda que o impacto na inflação seja maior por
impulsionar mais a demanda do que o corte de impostos. Cardoso ressalta que, da
forma como estão estruturados os estímulos fiscais, 80% virão por meio de
redução de tributos e 20%, por meio de obras. Tudo, porém, são estimativas.
Imprevisível, Trump pode rever o que pregou ainda como candidato.
Estudo
da Congressional Budget Office, agência não partidária de consulta do Congresso
dos Estados Unidos, estimou o multiplicador fiscal para diversas medidas que
possam vir a ser anunciadas por Trump. De cada US$ 1 a menos nos impostos pagos
pela classe média, entre US$ 0,1 e US$ 0,6 vão para a economia. Já de cada US$
1 em compras de bens e serviços pelo governo federal, o impacto varia entre US$
0,5 a US$ 2,5. Portanto, a equipe do presidente norte-americano tenderá a pesar
esses números na hora de decidir pelos incentivos à economia.
Caminho penoso
A grande
preocupação do Palácio do Planalto é de que Trump siga pelo caminho menos
penoso para o Brasil. Não sem razão. A equipe econômica apresentou ao
presidente Michel Temer números comprovando que a atividade começou a reagir e
que, depois de oito trimestres de recessão, o PIB fechará positivo nos
primeiros três meses de 2017. O mais relevante, destacam os técnicos, é que a
reação da economia está se dando sem que a inflação se assanhe. Ou seja, o
Banco Central terá uma longa avenida pela frente para reduzir a taxa básica de
juros (Selic), que está em 13% ao ano.
Blog do Vicente –
Correio Brasiliense
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