Editorial
Coerente
com sua visão estatista do mundo, segundo a qual o governo é o Grande Provedor,
inclusive de empregos diretos, ao longo de mais de 10 anos no poder o
lulopetismo transformou a administração federal – bem como as estaduais e
municipais sob seu comando – em generosa fonte de trabalho para sua devotada
militância. Não há números precisos, até porque a ampla e complexa dinâmica das
nomeações públicas não favorece a transparência, mas contam-se às dezenas de
milhares os cargos e funções na administração pública direta e indireta que
foram ocupados por petistas de carteirinha enquanto a bandeira da estrela
vermelha tremulou no Palácio do Planalto.
Aí veio
o impeachment de Dilma e o início do processo de “despetização” do governo
federal. Pouco tempo depois ocorreu o desastre das eleições municipais, que
reduziram de 630 para 256 (-60%) as prefeituras petistas. Nove legendas
elegeram mais prefeitos do que o PT. Uma verdadeira catástrofe para o partido
que transformara a prática habitual do aparelhamento do Estado, em todos os
níveis, em método político como nunca antes na história deste País. Segundo o
site Contas Abertas, com base em dados fornecidos pelo Ministério do
Planejamento, em julho de 2015 o número de cargos de confiança na administração
federal direta havia batido um recorde histórico ao superar a casa dos 100 mil,
o equivalente a cerca de 16% dos 618 mil cargos providos por concurso, apenas
no Poder Executivo. Somem-se a esses 100 mil os petistas comissionados em
cargos e funções no Legislativo, no Judiciário e nas administrações petistas
nos Estados – Acre, Bahia, Ceará, Minas Gerais e Piauí – e nos municípios, que
eram 630 até 31 de dezembro de 2016.
Apeado
do poder, o PT
enfrenta hoje o problema de manter empregados dezenas de milhares de militantes
que não podem mais contar com a mamata dos cargos públicos. Também
sobre esse assunto o partido está hoje dividido entre os “ideológicos” – que
defendem o “retorno às ruas” para o resgate das antigas bandeiras que pregavam
a luta radical e sem tréguas contra as injustiças sociais – e os “pragmáticos”
– para os quais a sobrevivência da legenda e a garantia de emprego aos
militantes dependem de concessões políticas que garantam um mínimo de acesso às
fontes de poder no plano federal.
Não
bastasse esse dilema, o PT ainda hesita, nas negociações políticas para a
eleição dos novos presidentes do Senado e da Câmara dos Deputados, entre
apoiar, discretamente que seja, os chamados “candidatos oficiais” ou manter-se
coerente com a postura oposicionista. Apoiar as candidaturas de Eunício
Oliveira (PMDB-CE) para o Senado e Rodrigo Maia (DEM-RJ) para a Câmara
significaria garantir o acesso à nomeação de dezenas de funcionários
comissionados.
A
disputa na Câmara parece ser menos problemática para o PT, uma vez que boa
parte de sua bancada já havia avalizado a eleição de Rodrigo Maia para cumprir
o mandato-tampão decorrente da renúncia de Eduardo Cunha. Cogita-se da
possibilidade de os petistas ficarem com a 1.ª Secretaria da Mesa, cargo que
controla a nomeação de cerca de 80 funcionários. Mas, se votar em Maia, não
terá sido esta a primeira vez que o PT deixará um aliado – neste caso o
deputado André Figueiredo (PDT-CE), disposto a manter sua candidatura até o fim
– no sereno.
Arranjo
semelhante ao que parece estar sendo costurado pelo PT na Câmara pode ser
acertado com o senador Eunício Oliveira, que ambiciona suceder a Renan
Calheiros. Mas a simples ideia de algo parecido com um acordo com o governo
Temer tem sido fortemente repelida pelos dois parlamentares petistas que mais
se destacaram na defesa de Dilma Rousseff e não parecem dispostos a colocar em
risco os pontos que ganharam com a militância radical: Lindbergh Farias (RJ) e
Gleisi Hoffmann (PR).
É essa a
grande dúvida existencial do PT: permanecer no palanque ou se garantir com os
cargos que puder agarrar.
O Estado de S. Paulo
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