Samuel Pessôa
Quando a
bolha imobiliária do Japão estourou e o preço de imóveis e terrenos e a cotação
da Bolsa de Valores despencaram, as empresas japonesas passaram a apresentar
balanço negativo: o valor de seus ativos ficou menor do que suas dívidas, dado
que estas não caíram.
Foi
queimada, também, parcela apreciável da riqueza dos consumidores.
A reação
à enorme perda patrimonial do setor privado foi a queda do consumo e,
principalmente, do investimento das empresas.
A
tentativa de todos em aumentar suas poupanças para reduzir dívidas ou recompor
riqueza resultou em situação crônica de carência de demanda. A inflação desabou
e, mesmo trazendo os juros nominais para zero, não foi possível evitar a
deflação.
O
economista Richard Koo, que cunhou a expressão "recessão de balanço"
no livro "O Santo Graal da Macroeconomia", notou adicionalmente que
havia uma pitada de irracionalidade no comportamento conservador das empresas
em adiar os investimentos para reduzir seu endividamento: os juros muito baixos
garantiam a rentabilidade de diversos negócios mesmo considerando o baixo
desempenho da economia.
Ainda
que adicionasse valor à empresa, o investimento era adiado devido às práticas
gerenciais e à forma como os gestores são avaliados, com prioridade para
redução das dívidas. A economia ficou atolada em uma crise keynesiana típica,
com deflação, juros nulos e baixo crescimento, situação que Keynes chamou de
armadilha da liquidez.
No
Brasil, nos anos de vigência da nova matriz econômica, houve excesso de
endividamento, como apontado por Marcos Lisboa em sua coluna da Folhana semana
passada, "A gerente repetiu o fracasso do general".
No entanto,
a dificuldade de retomada do investimento por aqui nada tem de parecido com a
crise de balanço do Japão, identificada por Koo. Por aqui temos ainda juros
reais elevados, que estão assim por causa da inflação alta. A inflação agora
está caindo e, portanto, os juros também.
Se houve
por aqui alguma irracionalidade, certamente não foi das empresas, que agora
cortam o investimento e recompõem seus balanços. Não há irracionalidade no
corte de investimento da Petrobras, por exemplo.
Qualquer
empresa petrolífera cuja dívida como fração da capacidade de geração de caixa
passa de quatro corta investimentos, pois o custo de financiamento se torna
muito elevado e a rentabilidade dos projetos fica negativa. O oposto do que
ocorreu no Japão na crise de balanço.
A
irracionalidade ocorreu (tema para o pessoal de administração investigar)
quando o setor privado acreditou nos planos mirabolantes e megalomaníacos de
Dilma e companhia e se expôs à crise.
Pergunta
para o setor de construção civil: como acreditar que o Tesouro Nacional teria
recursos para subsidiar a aquisição de unidades habitacionais para baixa renda
de forma quase ilimitada e resolver o deficit habitacional, problema que nos
aflige há pelo menos um século?
Como
tenho escrito neste espaço, nossa depressão tem componentes estruturais —a
crise fiscal e o sobreinvestimento em inúmeros setores— e cíclicos, as
dificuldades de trazer a inflação para a meta em um contexto de elevada
indexação e baixa credibilidade do BC.
No
entanto, o elevadíssimo combustível monetário -taxa básica de juros ainda a 13%
ao ano- sugere que há muito espaço para estimular a recuperação da demanda
agregada.
Folha de S. Paulo
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