Editorial
Corporações
controlam maior parte do Orçamento, e a isso se soma o desprezo com a Cultura
em geral
Não é um desastre qualquer a destruição pelo fogo do Museu Nacional,
no Rio, instituição de 200 anos, abrigo de um acervo de 20 milhões de peças,
recolhidas a começar pela própria família real, que teve no prédio incendiado a
sua residência oficial.
A dimensão da catástrofe é ampla: atinge a memória nacional, devido à
perda de importante acervo histórico; afeta a área científica, por interromper
pesquisas, e representa um prejuízo cultural impossível de ser quantificado.
Sabe-se apenas que é enorme. A impossibilidade de a população em geral e, em
particular, estudantes e pesquisadores, terem acesso no país a registros da
história da nação e da própria Humanidade é um empobrecimento sério no campo da
cultura.
Por mais óbvio que seja, deve-se enfatizar a necessidade de governos,
de políticos e da própria sociedade aprenderem com a tragédia. Mais uma neste
setor. A coincidência da campanha eleitoral dá oportunidade de o assunto ser
discutido, embora também possa ser utilizada para manipulações típicas de candidatos
em busca de votos.
A reclamação da falta de recursos para museus e outras instituições
públicas da área cultural é conhecida. E justificada. Mas não se trata de uma
particularidade deste segmento do Estado, pois o país enfrenta grave crise
fiscal. É bastante provável que o incêndio sirva de argumento a candidatos para
pregar o fim do teto dos gastos públicos, tema da campanha.
Mas, sem o
combate aos déficits, recursos ficarão ainda mais escassos, por força da volta
da inflação e da queda na coleta de impostos provocada pela inexorável
recessão, causada pelo retorno à irresponsabilidade fiscal desvairada. No campo
do aprendizado, ainda está viva a lição da crise aguda de 2015/16, cuja origem
foi esta.
A tragédia do Museu Nacional reforça a necessidade de governos,
políticos e sociedade fazerem melhores escolhas. É indiscutível que os diversos
acervos da história nacional, de sua cultura, precisam ser protegidos. Para
isso, é necessário dinheiro, mas, antes de tudo, consciência da importância da
Cultura, da Ciência e da História. Num Orçamento trilionário como o brasileiro,
é possível encontrar os recursos para isso, mas só se houver o entendimento de
que há muito dinheiro mal gasto pelo Estado.
Espera-se que a evidente necessidade de acervos públicos serem
protegidos ajude na pressão para que, a partir do próximo governo e da próxima
legislatura, a política de gastos públicos seja revista, e reformas urgentes,
como a previdenciária, realizadas.
A degradação do Museu e, enfim, a sua transformação em cinzas, um
desastre previsível, são um estridente alerta para a urgência da revisão das
prioridades orçamentárias, concentradas em despesas de custeio.
A tragédia da Quinta da Boa Vista não pode ser em vão.
O
Globo
Nenhum comentário:
Postar um comentário