FEDERICO RIVAS MOLINA
IPC de agosto sobe 3,9%, e as
previsões de consultorias privadas para dezembro já superam 40%
Os
argentinos, doutores em crise, acabam de incorporar um novo conceito ao
vocabulário popular: pass through. Assim os economistas chamam o impacto
da taxa de câmbio sobre os preços. O pass through é, portanto, o
novo pesadelo da Argentina, que vê o Governo perder diariamente a batalha
contra a inflação. O órgão estatístico nacional anunciou nesta quinta-feira
o índice de preços ao consumidor (IPC) com os primeiros efeitos
da desvalorização da moeda registrada no mês passado: 3,9% em relação ao
mês anterior. O dado eleva a 24,3% a inflação acumulada desde janeiro, e a 34,4%
o índice dos últimos 12 meses. Setembro será ainda pior, porque registrará em
toda sua dimensão o impacto do pass through.
Que os
poupadores argentinos “pensam em verde” (a cor do dólar) já é um lugar comum
que busca explicar a dependência em relação à moeda norte-americana. Diante de
qualquer turbulência, compram dólares para se proteger. E
a cotação sobe: em 1º. de agosto, bastavam 28 pesos para adquirir um dólar;
hoje são necessários quase 40. O peso perdeu 28% de seu valor desde agosto, e
mais de 50% desde janeiro. A queda do peso se traduz imediatamente numa maior
inflação, em parte por razões técnicas, e em parte por medo.
Os
empresários sobem seus preços “por via das dúvidas”, temerosos de que a taxa de
câmbio faça a inflação subir. É a profecia autorrealizada. A tempestade é
completada por exportadores, que tentam igualar no mercado local os lucros
extraordinários que agora obtêm em pesos ao vender produtos em dólares no
exterior, e todos aqueles que produzem com insumos importados.
Agosto,
por enquanto, não dará trégua na guerra
que Mauricio Macri trava contra a inflação desde que chegou ao poder, em
dezembro de 2015. O ano passado fechou com uma alta de 24,7% no IPC, 46% acima
das previsões oficiais. Para este ano, o Governo estimou a inflação em 15%, mas
depois teve que abandonar a meta, por ser inalcançável. Em
junho, Macri aceitou um resgate financeiro do FMI que previa, no pior
dos cenários possíveis, uma inflação de 32% em todo o ano de 2018. Essa cifra,
muito pessimista, foi pelos ares em poucas semanas. A inflação deste ano
rondará os 44%, se nada de mau voltar a acontecer no mercado cambial.
O
afundamento do peso se concentrou na última semana de agosto, mas seu efeito
inflacionário se potencializou com altas nos combustíveis, eletricidade e
alimentos. A soma de fatores terminou por fechar o mês com maior inflação do
ano. Se agosto foi ruim, setembro será pior. Consultorias privadas como a
Ecolatina preveem que a inflação deste mês seja de pelo menos 6%, reflexo de todo
o efeito negativo do pass through. Esse rastro chegará até outubro, com
uma alta de pelo menos 4% no IPC. Este ano está perdido na batalha contra a
inflação, e Macri prometeu que todas as esperanças ficam para o ano que vem. Os
argentinos terão que esperar.
EL PAÍS
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