HELOÍSA
MENDONÇA
Militares
não foram incluídos na reforma proposta pelo Governo. Ministério da Defesa diz,
no entanto, que projeto de lei com mudanças nas regras já está em discussão
Preservados da proposta da
reforma da Previdência apresentada pelo Governo Temer, os integrantes das Forças Armadas fazem
parte do regime previdenciário mais deficitário em valores per capita. Os
militares respondem por quase metade do rombo da Previdência dos servidores
públicos da União – que chegou a 72,5 bilhões de reais no ano passado –, embora
representem apenas um terço dos servidores.
Segundo cálculos do ex-secretário da previdência e consultor do
Orçamento da Câmara dos Deputados Leonardo Rolim, o regime da previdência dos
militares beneficiou 296.000 pessoas – entre reformados, na reserva e
pensionistas - no ano passado e apresentou um déficit de 32,5 bilhões de
reais. Ou seja, cada um dos beneficiados gerou um rombo anual de 109.000 reais
aos cofres públicos. O valor é 32 vezes maior que o déficit gerado por um
aposentado no regime geral (Instituto Nacional do Seguro Social -INSS). No ano
passado, o rombo gerado no regime geral foi de 89 bilhões de reais em um
universo de 26 milhões de beneficiários, o que significa dizer que cada
aposentado do INSS gerou um déficit de 3.414 reais. A contribuição dos
militares também é abaixo da dos civis: 7,5% do salário bruto contra 11% dos
aposentados pelo INSS.
O Governo justificou a decisão de não incluir os militares na reforma
da Previdência em função das condições especiais da carreira das Forças
Armadas, que incluem desde possíveis riscos de vida ao preparo físico exigido.
“Nada justifica deixar os militares de fora da reforma. Ele é o regime mais
deficitário em valores proporcionais. Além disso, o contingente de militares no
Brasil é exagerado”, explica Rolim.
A exclusão dos militares é também considerada por Sonia Fleury,
professora da FGV, como uma das distorções da reforma apresentada. “Ela mostra
claramente que os setores que têm mais capacidade de pressão conseguem empurrar
para frente essa mudança, enquanto pessoas extremamente vulneráveis passam a
ter obrigação de passar mais cinco anos sem receber o benefício”, afirma
Fleury.
A PEC proposta
pelo Governo fixa uma idade mínima de aposentadoria de 65 anos tanto para
homens quanto para mulheres (atualmente mulheres podem se aposentar aos 60 e os
homens aos 65). Enquadram-se nessa nova categoria mulheres que tenham até 45
anos e homens com até 50 anos. A regra também prevê que será preciso um mínimo
de 25 anos de tempo de contribuição - atualmente o tempo mínimo de contribuição
é de 15 anos. O Governo Temer argumenta que, tal como está, a Previdência é
insustentável. De acordo com projeções do Ministério da Fazenda, mantidas a
legislação em vigor, as despesas do sistema geral, o INSS, passariam de 8% do
PIB em 2016 para 17,5% do PIB em 2060. As mudanças na Previdência são
precedidas da aprovação do teto de gastos, os pilares do programa do Governo
para tentar conter o déficit nas contas públicas sem aumento imediato de
impostos ou uma reforma tributária.
Segundo o ministro da Defesa Raul Jungmann, um projeto de lei
complementar com mudanças nas regras previdenciárias para os militares já está
em discussão e deve ser enviado à Casa Civil entre janeiro e fevereiro de 2017.
Ainda de acordo com o ministro, todas as regras poderiam ser negociadas,
inclusive um aumento da contribuição e do tempo de serviço.
“Não queremos nenhum privilégio, apenas que se reconheça as
especificidades. Tudo está na mesa. Não há nada excluído da agenda”, afirmou
Jungmann em coletiva de imprensa em Brasília neste mês. O ministro negou também
que a participação dos militares no déficit da Previdência seja de 32,5 bilhões
de reais e disse que há uma “confusão contábil” neste cálculo.
Segundo o ministro da Defesa, o INSS arca somente com as pensões pagas
a dependentes dos militares. Para o ministro, o déficit real é de 13,85 bilhões
de reais. Segundo ele, serão pagos 16,55 bilhões aos pensionistas das três
Forças, mas haverá 2,69 bilhões arrecadados com as contribuições da categoria
no ano de 2016.Já os salários dos inativos e reservistas, de acordo com
Jungmann, são pagos pelo próprio Ministério da Defesa. Isso ocorre porque os
militares estão enquadrados em um sistema de proteção social custeado pelo
Tesouro Nacional. Dele, saíram os recursos para o pagamento de militares ativos
e inativos que, neste ano, somaram 20,23 bilhões de reias e 18,59 bilhões de
reais, respectivamente. Os valores já estavam consignados por lei ao orçamento
do ministério, segundo o ministro.
“Quem paga nossos inativos somos nós. Ou seja, os nossos inativos não
pressionam a Previdência. Isso é computado na Previdência por um óbvio equívoco
contábil, que está sendo desfeito do balanço da União”, declarou o ministro que
informou ainda que o pagamento aos homens da reserva não pode ser classificado
como gasto previdenciário já que eles podem ser convocados a voltar a serviço.
Segundo Leonardo Rolim, o que o ministério da Defesa está fazendo é
uma contabilidade criativa para fingir que não existe um rombo. “Se a
justificativa é falar que é o Ministério que paga o benefício, não existiria
déficit de servidor público. Via Forças Armadas eles estão dando argumentos
para não fazerem a reforma. De onde acham que vem o dinheiro do ministério?”,
critica Rolim.
Em defesa das contas da pasta, o ministro da Defesa ressaltou que os
valores da folha de pagamento dos militares estão em um movimento
decrescente. Segundo números da Defesa, em 2003 os gastos com pagamento de
pessoal equivaliam a 1,17% do Produto
Interno Bruto (PIB), soma das riquezas produzidos em um país). Em 2015,
caíram para 0,87%. O ministro ressaltou ainda que houve uma grande reforma na
Lei de Remuneração da categoria, que já tirou vários benefícios da categoria
como pagamento por tempo de serviço e a polêmica pensão para as filhas
solteiras. O benefício da pensão vitalícia para filhas foi extinto em 2000 para
servidores admitidos a partir daquela data, mas quem já integrava o quadro das
Forças Armadas pode optar pelo pagamento de um adicional de 1,5% na
contribuição previdenciária para manter o privilégio.
Especialistas argumentam, no entanto, que mesmo com o fim da pensão
para as filhas solteiras, ainda há particularidades na previdência militar que
deveriam ser revistas. A categoria não tem idade mínima de aposentadoria e eles
vão para a reserva com 30 anos de serviço.
Recuo
Ainda que a proposta da reforma da Previdência não contemple regras
para os integrantes das Forças Armadas, o texto original proibia o acúmulo de
aposentadorias e pensões por morte referentes ao INSS para todos os regimes. Um
dia após a apresentação do documento, no entanto, depois de pressões políticas,
o Planalto recuou e alterou a PEC. Na proposta modificada, o governo retirou do
texto qualquer mudança no regime de previdência dos bombeiros, dos policiais
militares e dos militares das Forças Armadas. Assim como as Forças Armadas,
segundo o Governo, os bombeiros e policiais militares têm leis específicas
estaduais.
EL
PAÍS
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