Bernardo Mello Franco
Horas antes de assumir o STF, Dias
Toffoli livrou Guido Mantega da Lava-Jato. A decisão dá mais pistas sobre os
novos tempos que o seu discurso de posse
O novo
presidente do Supremo Tribunal Federal não disse a que veio em seu discurso de
posse. Em 27 páginas, o ministro Dias Toffoli se esquivou de polêmicas e fez
uma promessa vaga de “pacificação”. Citou os pensadores Renato Russo e Leandro
Karnal, mas não encontrou tempo para falar de mordomias e privilégios.
A
palavra “corrupção”, que tem dominado a agenda da Corte, foi lembrada apenas
duas vezes. Numa delas, o orador discorria sobre um programa de TV. Horas antes
do falatório, Toffoli deu uma pista mais quente do que esperar de sua gestão.
Numa canetada, ele suspendeu a ação penal contra o ex-ministro Guido Mantega
por corrupção e lavagem de dinheiro. O petista foi acusado de cobrar R$ 50
milhões da Odebrecht em troca da edição de duas medidas provisórias.
Segundo
o dono da empreiteira, o dinheiro serviu para “fins diversos” e abasteceu a
chapa Dilma-Temer na eleição de 2014. De acordo com a denúncia do Ministério
Público Federal, o petista beneficiou a construtora em troca do pagamento de
propina. Marcelo Odebrecht disse que o negócio foi fechado em reunião no
escritório do Ministério da Fazenda em São Paulo.
O
delator contou que Mantega exibiu o valor desejado numa folha de papel. Para
não deixar rastros, ele teria ficado com a anotação. A conversa entre o
ministro e o empreiteiro ocorreu em 2009, mas o processo só foi aberto em
agosto passado. No dia em que completaria um mês, voltou à estaca zero. Toffoli
tirou o réu das mãos do juiz Sergio Moro, titular da 13ª Vara Criminal de Curitiba.
O ministro acusou o juiz de “burlar” um entendimento do Supremo. Ele alegou que
o processo de Mantega se limitaria à prática de caixa dois. Por isso, deveria
correr na Justiça Eleitoral, paraíso dos políticos investigados pela Lava-Jato.
Moro já
cometeu muitos excessos, mas a denúncia contra o ex-ministro descrevia um caso
típico de corrupção. Há uma diferença sensível entre as duas acusações. A lei é
mais dura com os corruptos, que podem pegar até 12 anos de prisão. Quem faz
caixa dois responde por falsidade ideológica eleitoral. Neste caso, a pena é de
no máximo cinco anos.
Na
prática, ninguém vai para a cadeia. A conversa de “pacificação” soa como música
para quem não desistiu de estancar a sangria da Lava-Jato. O Supremo tem
livrado figurões da tormenta, mas ainda há gente com medo de terminar o ano à
deriva. Agora o ministro Toffoli acenou aos náufragos com uma boia.
Gilmar
Mendes não falha. Na sexta-feira, o supremo ministro libertou Beto Richa. O
ex-governador passou apenas três noites na cadeia. A Sociedade Protetora dos
Tucanos ainda deve uma estátua ao magistrado. O habeas corpus também beneficiou
Joel Malucelli, suspeito de fraudar licitações e desviar verba pública no
Paraná. O empresário é financiador e suplente de Alvaro Dias, o presidenciável
que manda o eleitor abrir o olho.
O Globo
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