Editorial
O ex-presidente Lula da Silva disse diversas vezes que “sempre”
aceitou o resultado das várias eleições que perdeu. “Quando perdi, nunca fui
para rua reclamar. Voltava para casa e discutia com minha mulher e com meu
partido. Depois, me preparei para disputar uma nova eleição”, declarou em 2016
o demiurgo petista, repetindo pela enésima vez essa fábula na expectativa de
enganar os inocentes. Pois Lula e o PT nunca aceitaram o resultado das eleições
presidenciais que perderam e jamais enxergaram legitimidade nos presidentes aos
quais faziam oposição - basta lembrar que o partido pediu o impeachment de
Fernando Collor, de Itamar Franco e de Fernando Henrique, além de liderar uma
campanha pela destituição do presidente Michel Temer.
Essa reiterada demonstração do espírito antidemocrático do PT e de
Lula precisa ser relembrada no momento em que está em curso uma tentativa de
higienizar a trajetória flagrantemente autoritária do partido e de seu líder
para, com isso, marcar diferença em relação ao candidato Jair Bolsonaro (PSL).
Segundo essa versão imaginosa, somente o truculento ex-capitão representaria
uma ameaça real à democracia, enquanto o PT, malgrado seus eventuais arroubos,
sempre se pautou pelas “regras do jogo”.
Provas disso, segue a lenda, seriam não somente a alegada disposição
de Lula da Silva de aceitar os resultados das eleições que perdeu, como também
o suposto comportamento exemplar do partido quando esteve no poder. Segundo se
diz, o PT passou 14 anos no poder sem ameaçar a ordem institucional e a
Constituição, razão pela qual não haveria nenhum motivo para temer uma ruptura
se o lulopetismo voltar ao governo.
Já com Bolsonaro, sustenta essa narrativa, a história é bem outra. O
ex-capitão já elogiou o regime militar e os torturadores de presos políticos,
além de ter em sua chapa, como vice, um general que admite publicamente a
hipótese de que o presidente da República dê um “autogolpe” se houver
“anarquia”. Isso bastaria para demonstrar que o País estaria à beira de uma
ditadura militar caso Bolsonaro venha a ganhar a eleição, enquanto com o PT
esse risco não existiria.
Ora, não é preciso grande esforço para atestar a falácia de tal
versão. Ameaças à democracia não se dão somente sob a forma de golpes militares
clássicos, como o que Bolsonaro é acusado de estar tramando. É possível
arruinar a democracia por meio de sua desmoralização paulatina e constante,
como faz o PT sistematicamente há mais de três décadas.
O PT nunca admitiu contestação à sua ideologia. Impôs-se pela
arrogância, patrulhando o pensamento e instaurando aquilo que John Stuart Mill,
em seu clássico Sobre a Liberdade, chamou de “tirania da opinião e dos
sentimentos dominantes”. Para isso, estendeu seus tentáculos sindicais e
militantes às universidades e ao mundo artístico, atrelando o debate acadêmico
e cultural à doutrina lulopetista. Quando esteve a ponto de ser destruído em
razão dos muitos esquemas de corrupção que capitaneou - esquemas que, aliás,
são também uma forma de minar a democracia -, o PT renasceu capturando a causa
dos chamados movimentos identitários - de luta por reconhecimento de diversas
minorias - e a transformou em arma partidária para dividir ainda mais o País. O
PT viceja na discórdia radical e insuperável, inviabilizando o debate
democrático.
Ademais, o partido não titubeou em fazer campanha sórdida, inclusive
internacional, contra o Judiciário, o Congresso e a imprensa, classificando
magistrados, parlamentares e veículos de comunicação como “golpistas” - todos,
é claro, mancomunados para perseguir o PT. Não bastasse corroer a democracia
por dentro, envenenando as relações entre os cidadãos e atacando as
instituições, o PT ainda foi capaz de emprestar entusiasmado apoio a ditaduras
como a de Cuba e a da Venezuela, sinalizando perigoso apreço por regimes de
força tão ou mais violentos que a ditadura militar brasileira, a qual os
petistas vivem denunciando.
A ameaça de Bolsonaro se restringe, por ora, a palavras toscas - e
isso é muito ruim. Tão ruim quanto o PT, que já pôde demonstrar, na prática e
extensivamente, seu espírito antidemocrático.
O
Estado de São Paulo
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