domingo, 16 de julho de 2017

Ideologia

Russel Kirk

 “A mazela que afeta os adolescentes perpétuos de nossa ‘Civilização do Espetáculo’ criou gerações de criaturas que temem encontrar a Verdade e não reconhecem, deliberadamente ou por ignorância, a existência do Bem e do Belo, preferindo a ilusão confortante oferecida tanto pelas falsas promessas de ideólogos ou demagogos quanto pelos ilusórios confortos medíocres.

Entorpecidos pelo ópio da ideologia ou embriagados pelo absinto do hedonismo relativista, os homens (e mulheres) ocos de nossa época são netos da ‘Idade da Razão’ e filhos da ‘Era da Informação’. Fundado nas percepções reducionistas da ideologia do cientificismo, durante a Idade da Razão houve um gradativo processo de substituição do ideal de sabedoria proposto pela Filosofia Clássica por um tipo de conhecimento prático que deu ensejo para que esse mesmo saber utilitário, posteriormente, fosse subjugado pela informação, que veio a se tornar o instrumento de dominação dos manipuladores e o entretenimento dos manipulados.

Na Era da Informação a promessa de aproximar as pessoas por meio das novas tecnologias, paradoxalmente, está afastando os seres humanos ao criar o novo vício de indivíduos conectados ao mundo virtual, mas desconectados da realidade.

Nesta terra desolada, em que a mente dos homens (e mulheres) ocos é inebriada por ideologias ou pelo relativismo, não há possibilidade de compromisso intelectual com a Verdade, apenas com a opinião da maioria; aí a informação pode ser apropriada e manipulada como melhor aprouver aos desejos subjetivos. 

Nesse contexto, a moralidade perde qualquer relação com os absolutos morais, com as noções de certo e errado cuja aplicação passa a ser uma mera questão de preferência e de escolhas individuais; a linguagem perde o sentido, transforma-se na ‘novafala’ do politicamente correto, em que palavras passam a significar o que deseja o arbítrio de quem as profere, fazendo com que os debates sobre qualquer temática não mais se submetam à razão e aos fatos objetivos, que são substituídos por opiniões subjetivas expressas em jargões; e, também, a lógica argumentativa, na maioria das vezes, cede espaço às ofensas pessoais e ao sentimentalismo.

Nessas circunstâncias, vemos desvencilhados, na produção artística, os padrões estéticos objetivos da ‘grande arte’, acusados de elitismo, são substituídos por critérios subjetivos, justificados ideologicamente pela nova classe dos críticos de arte ou pelas demandas mercadológicas das massas, muitas delas criadas artificialmente.

Guiado pelo reformismo pedagógico, o propósito da educação deixa de ser a busca pelo autoconhecimento e pelo entendimento do sentido das coisas, essenciais ao ordenamento da alma e da comunidade política, e passa a assumir, confusamente, um caráter ideológico de adestramento voltado à promoção pessoal, treinamento técnico, sociabilidade, socialização, certificação profissional e interesses dos políticos governantes.

Igualmente, os bons costumes aprendidos no exercício disciplinado das virtudes, sustentadas pelo senso religioso e pelo espírito de cavalheirismo, nutridos pela imaginação moral e pela educação liberal, são descartados como moda ultrapassada e dão lugar ao barbarismo.

O necessário equilíbrio político entre direitos e deveres bem como a meritocracia são substituídos pela ideologia do democratismo, que transforma a comunidade de cidadãos num aglomerado massificado de indivíduos apáticos, preocupada, apenas, com as mesquinhas vantagens da barganha com o Estado, transformado num poder onipotente, controlado por políticos corruptos e inescrupulosos e pela burocracia opressora, que passa a regular todos os aspectos da vida social”.

Russell Kirk
“O Peregrino na Terra Desolada”

Thoth3126

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