Percival Puggina
A crise
que jogou o Brasil na mais prolongada e perigosa depressão econômica e social
de sua história não pode ser entendida sem que se conheça o peso do
patrimonialismo, do corporativismo e do clientelismo na vida nacional. É pelo
peso do patrimonialismo que o exercício do poder político se confunde com
usufruto (quando não com a posse mesma) dos recursos nacionais.
É pelo peso do corporativismo, cada vez mais entranhado e influente nas estruturas do Estado, que os bens e orçamentos públicos vêm sendo canibalizados desde dentro pelo estamento burocrático. É pelo peso do clientelismo que elites corruptas são legitimadas numa paródia de representação política, comprando votos da plebe com recursos tomados à nação.
É pelo peso do corporativismo, cada vez mais entranhado e influente nas estruturas do Estado, que os bens e orçamentos públicos vêm sendo canibalizados desde dentro pelo estamento burocrático. É pelo peso do clientelismo que elites corruptas são legitimadas numa paródia de representação política, comprando votos da plebe com recursos tomados à nação.
Na
perspectiva do cidadão comum, o que resulta mais visível, lá no alto das
manchetes e no pregão dos noticiários de rádio e TV, é o que vem sendo chamado
de mecanismo, ou seja, o modo como, nos contratos de obras e serviços, o
recurso público é desviado para alimentar fortunas pessoais, partidos políticos
e campanhas eleitorais que, por sua vez, garantem, a todos, a continuidade dos
respectivos negócios. Com efeito, esse é o topo da cadeia.
É o que se poderia chamar de operação contábil que viabiliza e formaliza o patrimonialismo.
É o que se poderia chamar de operação contábil que viabiliza e formaliza o patrimonialismo.
O
corporativismo, de longa data, se configura como forma de poder exercido com
muito sucesso e responde, ano após ano, pela crescente apropriação dos
orçamentos públicos e dos recursos de empresas estatais pelas corporações
funcionais. É uma versão intestina do velho patrimonialismo.
Raymundo Faoro, a laudas tantas de "Os Donos do Poder", escreve sobre a centralização política ocorrida no Segundo Reinado e a singela constatação de que existem duas possibilidades: ou a nação será governada por um poder majoritário do povo ou por um poder minoritário. Era como exercício de poder minoritário que Faoro via o reinado de D. Pedro II. E o entendia à luz da teoria de Maurice Hariou, que fala de um poder formado "ao largo das idades aristocráticas, pelo exercício mesmo do direito de superioridade das minorias diretoras".
Raymundo Faoro, a laudas tantas de "Os Donos do Poder", escreve sobre a centralização política ocorrida no Segundo Reinado e a singela constatação de que existem duas possibilidades: ou a nação será governada por um poder majoritário do povo ou por um poder minoritário. Era como exercício de poder minoritário que Faoro via o reinado de D. Pedro II. E o entendia à luz da teoria de Maurice Hariou, que fala de um poder formado "ao largo das idades aristocráticas, pelo exercício mesmo do direito de superioridade das minorias diretoras".
Maurice
Hariou (1856-1929) reparte com Kelsen o apelido de Montesquieu do século XX. Na
sua perspectiva, são as instituições que fundamentam o Direito, e não o
contrário. Correspondem ao conceito, as organizações sociais subsistentes e
autônomas nas quais se preservariam ideias, poder e consentimento. A isso, dava
ele o nome de corporativismo.
Após 127 anos de república, é comum vê-lo em pleno exercício quando representantes de outros poderes, de carreiras de Estado, e de seus servidores ocupam ruidosamente galerias dos plenários ou palmilham corredores onde operam os gabinetes parlamentares. Raramente saem frustrados em suas reivindicações. E assim, bocado a bocado, ampliam, além de toda possibilidade, a respectiva participação no bolo dos recursos públicos. Em muitos casos, a soma das fatias já ultrapassa os 360 graus.
Após 127 anos de república, é comum vê-lo em pleno exercício quando representantes de outros poderes, de carreiras de Estado, e de seus servidores ocupam ruidosamente galerias dos plenários ou palmilham corredores onde operam os gabinetes parlamentares. Raramente saem frustrados em suas reivindicações. E assim, bocado a bocado, ampliam, além de toda possibilidade, a respectiva participação no bolo dos recursos públicos. Em muitos casos, a soma das fatias já ultrapassa os 360 graus.
Os ônus
do corporativismo representam um prejuízo vitalício, que se perpetua através
das gerações. Como tal, muito certamente, excede o conjunto das falcatruas
operadas pelo mecanismo. O Estado brasileiro poderia ser menor, onerar menos a
sociedade e enfrentar adequadamente o drama das camadas sociais miseráveis, carentes
de consciência política.
Por que iriam os operadores do mecanismo, os manipuladores da miséria e o estamento burocrático interessar-se em acabar com a ascendência que exercem sobre essas vulneráveis bases eleitorais? Os três juntos - patrimonialismo, corporativismo e clientelismo - põem a nação em xeque. Não sairemos dele se não identificarmos, acima e além dos partidos e seus personagens, estes outros adversários, intangíveis mas reais, que precisam ser vencidos.
Por que iriam os operadores do mecanismo, os manipuladores da miséria e o estamento burocrático interessar-se em acabar com a ascendência que exercem sobre essas vulneráveis bases eleitorais? Os três juntos - patrimonialismo, corporativismo e clientelismo - põem a nação em xeque. Não sairemos dele se não identificarmos, acima e além dos partidos e seus personagens, estes outros adversários, intangíveis mas reais, que precisam ser vencidos.
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