Maria Clara R. M. do
Prado
Provavelmente o futuro auspicioso
previsto por Zweig há 76 anos não estará garantido a partir das eleições de
2018
Deslumbrado
com a exuberância da floresta amazônica, com a pujança de São Paulo e com a
criatividade do povo, Stefan Zweig, escritor austríaco e autor, entre outros,
do livro Brasil, um País do Futuro (1941), impôs ao país a marca que ficaria
para sempre registrada no imaginário popular. A sensação de um futuro que nunca
chegará, de um futuro eterno e inalcançável, acabou por firmar-se, com os
desmandos e a mediocridade prevalente no sistema político, como a mais
realística interpretação do vaticínio de Zweig.
Já se
disse que no Brasil até o passado é incerto. O futuro, então, não passaria de
uma miragem recheada por um misto de devaneio, esperança e torcida. Via de
regra, o futuro dificilmente se confirma no presente, o que o coloca sempre
mais distante.
Pior do
que um futuro fora de alcance é a cegueira que persiste em não querer enxergar
o futuro como desdobramento natural das condições conforme se apresentam no
presente. O aumento de impostos determinado pelo governo sobre o preço dos
combustíveis é um exemplo claro da resistência em perceber que a ampliação da
carga tributária seria, mais uma vez, a alternativa para compatibilizar a
receita com a despesa do setor público diante do tremendo quadro de recessão
que tem afetado o país nos últimos três anos.
Não basta
o eufemismo, nem o marketing político. O crescimento da economia depende da
conjugação de vários fatores, como se sabe, mas tem hoje estreita relação com a
absoluta incerteza quanto à situação política atual e, ainda mais obscuro, com
a sucessão presidencial em janeiro de 2019.
Vive-se
no Brasil ao sabor dos altos e baixos, entre os acontecimentos que impactam a
política pela via das investigações da Lava-Jato e das denúncias da
Procuradoria-Geral da República (PGR) e o fôlego do governo Temer em resistir
no poder. É possível que o ritmo de gangorra se mantenha por mais tempo, mas
isso não alivia os efeitos perversos que a insegurança política causa na
economia.
Com
Temer ou sem Temer à frente do poder executivo até o final deste período
presidencial, começa a ganhar cada vez mais relevância os exercícios de
adivinhação sobre quem vencerá as eleições do ano que vem. Em um país que não
tem futuro porque não se prepara para ele, tudo pode acontecer. Em especial,
considerando a acefalia de lideranças reconhecidamente legítimas por parte da
sociedade, fica difícil imaginar um governo sucessório com capacidade de
implementar políticas que atendam aos interesses dos eleitores e não da classe
governante. Ainda mais se não houver alternância do grupo que tem garantido a
maioria no Congresso.
Independentemente
de ser mais à direita ou mais à esquerda, é importante a eleição de
parlamentares conscientes de que os desejos particulares não devem prevalecer e
de que não são eleitos para formarem grupos políticos com o objetivo de
perpetuarem-se indefinidamente no poder.
As
implicações da corrupção no setor público sobre o desenvolvimento econômico são
dramáticas e, pode-se dizer, auto-alimentadas pelos mesmos efeitos daninhos que
provocam. A lista é longa. Segundo estudos do Banco Mundial, a corrupção:
•
influencia a formação de cartéis que afetam os preços e a qualidade de produtos
e serviços, tornando a economia vulnerável à inflação e a baixos níveis de
competitividade;
•
contribui para a ineficiência na alocação dos recursos, pois viabiliza a
expansão da riqueza de indivíduos e grupos privados que sustentam
interlocutores corruptos na administração pública;
•
estimula o desequilíbrio na distribuição de renda porque opera de forma a
manter desproporcionalmente reduzido o tamanho da classe média e a dificultar
as atividades dos pequenos empreendedores;
•
desestimula o avanço tecnológico pela desconfiança sobre os retornos com
patentes e o uso das inovações;
• afeta
a qualidade da educação porque desvia recursos do setor, deixando de priorizar
a melhoria da formação educacional e profissional da grande massa em idade
escolar;
•
compromete a qualidade da saúde na medida em que não há controle sobre o uso da
verba pública em postos de saúde e hospitais, nem sobre a qualidade e a
presteza do atendimento médico;
•
dificulta o equilíbrio fiscal pelo comprometimento dos canais de arrecadação,
de um lado, e pelo uso do dinheiro em finalidades não previstas no orçamento.
Não é
difícil perceber que a continuidade das situações adversas provocadas pela
corrupção e pela malversação do dinheiro público acaba por alimentar um ciclo
vicioso que, de tão enraizado, dificulta o rompimento do paradigma.
É certo
que a Lava-Jato e tudo o mais levantado por juízes e procuradores têm a
fantástica função de funcionar como condutores a uma mudança de comportamento
no sistema político brasileiro, mas desanimam os procedimentos na Câmara dos
Deputados com o intuito de introduzir no Código de Processo Penal mudanças nas
regras da delação premiada e na prisão preventiva com claro objetivo de
diminuir o poder dos procuradores.
O Brasil
vive uma espécie de batalha subliminar entre forças organizadas, que pretendem
manter o status quo através de manobras e artimanhas que lhes garantam
preservar o poder, e o anseio difuso e desorganizado de uma sociedade
interessada em radical transformação no sistema político, onde os
representantes dos eleitores no legislativo e no executivo possam atuar nos
moldes de uma democracia civilizada.
Tudo
depende do voto e o voto depende da conscientização dos eleitores para as
grandes questões que estão em jogo. Muito provavelmente, o futuro auspicioso
previsto por Zweig há 76 anos não estará garantido a partir das eleições de
2018, mas com boa vontade pode-se esperar que esteja mais próximo de ser
alcançado. Ilusão?
Valor Econômico
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