Editorial
(*)
A
vitória do candidato liberal independente Emmanuel Macron no primeiro turno, à
frente da extrema-direita da Frente Nacional de Marine Le Pen, afastou de
imediato o perigo de saída da França da zona do euro, mas deixou o sistema
político francês em frangalhos. As fundações da V República de Charles De
Gaulle, construída em 1958, ruíram, com a expulsão nas urnas de suas principais
forças partidárias - Republicanos, à direita, e Partido Socialista, à esquerda.
Macron é o franco favorito para o segundo turno, em 7 de maio, mas terá de
criar um partido para governar, algo que seu movimento Em Marcha não tem, e
conquistar o apoio da direita moderada, o que não está assegurado.
Os
mercados financeiros comemoraram a vitória parcial com alívio. O socialista
Benoît Hamon (6,36 milhões de votos, 6,3% do total) e o republicano François
Fillon (20%, 7,2 milhões de votos) conclamaram os franceses a votarem em
Macron. As pesquisas, que acertaram o resultado, dão vantagem de mais de 60%
para ele na próxima rodada nas urnas. O rompimento da União Europeia por um de
seus núcleos, a França, tornou-se remoto.
Mesmo
assim, as tensões criadas pela globalização continuam a trazer mudanças de
fundo. Donald Trump implodiu o jogo político de centro, onde a política
americana era jogada, e chegou à Presidência. Os franceses rejeitaram os
partidos tradicionais, incapazes de reverter a decadência econômica do país,
uma crise econômica séria e um desemprego que parece permanente de dois
dígitos.
As
bruxas continuam à solta, porém. A Frente Nacional, de extrema direita,
conseguiu arregimentar pela primeira vez mais de 20% dos eleitores, sua maior
marca percentual, conquistando 7,68 milhões de votos. O esquerdista Jean-Luc
Mélenchon quase derrota os republicanos, com 19,58% dos votos - 7 milhões de
sufrágios. Com uma campanha moderna, Mélenchon teve média bem acima da nacional
e chegou a primeiro colocado em Marselha, Grenoble, Le Havre, Montepellier e
Lille. Ou seja, 41% dos franceses rejeitaram os partidos tradicionais nas urnas
e optaram pelos extremos, diante de 24% que colocaram suas esperanças em um
candidato que nunca concorreu a um cargo eletivo.
A
clivagem entre os candidatos no segundo turno estão claras. Macron defende a
União Europeia, um programa moderado de redução do Estado (demissão de 120 mil
funcionários), redução de impostos em direção à média da UE (de 33% para 25%) e
para empresas que contratem trabalhadores pouco qualificados. Macron não é
avesso à imigração, com controle. Marine já divisou o que julga flancos
vulneráveis do candidato novato. Qualificou-o de "fraco", de
"candidato dos oligarcas", incapaz de deter o terrorismo islâmico e
partidário da "globalização descontrolada". Ela defende a saída da
UE, é avessa a acordos comerciais e favorável a limites à imigração, tarifas
protecionistas e taxação de empresas que contratem mão de obra "não
francesa".
Após
décadas correndo da direita para a esquerda, e vice-versa, o eleitorado francês
tenta uma saída pelo centro. A eleição legislativa de junho pode surpreender e
ofertar boa bancada a Macron, diante de disputas intestinas nos partidos que
foram humilhados nas urnas, como os socialistas e republicanos. Perto de chegar
ao poder, Macron deve atrair bom número de políticos oportunistas. Mas é também
provável que tenha que negociar, em posição de minoria, com legendas
tradicionais que reinaram até agora.
A tarefa
de Macron não é fácil. Em leitura clara, o maior partido francês, por votos, é
hoje a Frente Nacional. O segundo, os Republicanos em baixa, tem um eleitorado
em que parcela não desprezível tende para Le Pen. O grande empresariado apoia o
liberal Macron e suas promessas de modernização das leis trabalhistas, abertura
de mercado e libertação do jugo da histórica e pesada burocracia estatal. Com
um programa moderado liberal e sem um partido dominante, o ex-executivo do
banco Rothschild terá de encarar adversários imponentes, como os sindicatos, e
a rejeição da esquerda e direita radical.
Macron
terá provavelmente de governar saltitando da direita à esquerda em busca de
acordos, para executar um programa de compromisso. É último biombo entre forças
extremistas de direita e de esquerda em franca ascensão. Se finalmente vencer o
segundo turno, terá de sepultar a quinta versão da República francesa, sem o
apoio popular entusiasmado que a primeira obteve.
Valor Econômico
(*) Comentário do editor do
blog-MBF:
1 - “Macron
é o franco favorito para o segundo turno, em 7 de maio, mas terá de criar um
partido para governar, algo que seu movimento Em Marcha não tem ...”
2 - “Com
um programa moderado liberal e sem um partido dominante, o ex-executivo do
banco Rothschild ...”
1 – Está demorando para o mundo se
conscientizar que partidos políticos, artificialmente ideológicos, acabaram.
Não precisamos deles para exercitar a democracia em sua plenitude. Pelo
contrário.
2- Rothschild. Desde o século XVIII
são os principais acumuladores de capital. Mais uma vez provam porque estão
sempre na frente.
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