Editorial
Deputados
e senadores, antes de votarem a reforma, deveriam acompanhar os números do
esforço do governo para fechar este ano ainda com um déficit gigantesco
Qualquer
reforma em sistema previdenciário pode ser comparada à conhecida imagem da
manobra no transatlântico — aconselha-se fazê-la com grande antecedência, para
o navio poder se mover a tempo. Quando isso não acontece, aumenta o risco de
acidentes, porque se torna mais difícil a correção de rumo. No caso, por
resistências políticas, principalmente de corporações sindicais e de categorias
existentes dentro da máquina burocrática do Estado, em defesa de privilégios.
É
sintomático que um juiz no Rio Grande do Sul tenha aceitado pedido de liminar
de sindicatos para impedir o governo federal de colocar no ar uma campanha de
esclarecimento sobre a reforma. Não
passa despercebido que o Poder Judiciário é uma das castas do funcionalismo que
se opõem à proposta de uniformização crescente das regras de aposentadorias
entre setores público e privado.
Já em
tramitação na Câmara, a PEC da reforma tem sido atacada por vários lados, com o
objetivo de descaracterizá-la. Mas o tempo não para e com ele também cresce o
déficit do sistema. Informações não faltam para alertar sobre o desastre em
construção. Deputados e senadores deveriam prestar atenção a dados sobre o
Orçamento deste ano e, em especial, acerca das despesas de fevereiro.
O
secretário de Acompanhamento Econômico do Ministério da Fazenda, Mansueto
Almeida, alerta que a Previdência “já começou a comer” o orçamento de outras
áreas. Ele cita números da ginástica que faz o governo para cortar R$ 42
bilhões e ainda conseguir receitas extras de R$ 16 bilhões, do que resultaria
um superávit primário de R$ 50 bilhões. No entanto, ao se considerar o déficit
do INSS estimado para o ano, de R$ 189 bilhões, o saldo positivo se transforma
num buraco de R$ 139 bilhões, a meta do ano.
O mês de
fevereiro foi exemplar: o Tesouro e o Banco Central melhoraram seus números,
com a redução do déficit em relação ao mesmo mês do ano passado. Mas como o
rombo da Previdência aumentou de R$ 10,26 bilhões para R$ 13,55 bilhões,
perdeu-se a margem que Tesouro e BC haviam conseguido.
Não se
duvide que esta tendência é inexorável, porque as causas do desequilíbrio
previdenciário são estruturais: a ampliação da expectativa de vida dos
aposentados e o fato de se aposentarem cedo. Daí não haver alternativa a não
ser, entre outras medidas, o estabelecimento dos 65 anos como idade mínima para
o pedido do benefício.
Entende-se
a necessidade de negociações para a aprovação das reformas, mas a margem de
tolerância nas barganhas é estreita, diante da grave situação fiscal. Tome-se o
exemplo da aposentadoria rural. Há quem veja com alguma benevolência o fato de
o agricultor poder se aposentar sem ter contribuído. Talvez porque não saiba que a aposentadoria rural fechou 2016 com um
déficit de R$ 103,4 bilhões.
Algo
semelhante ocorre com benefícios sociais, como o de Prestação Continuada (BPC),
para idosos carentes e com deficiências. No Brasil, este benefício equivale a
35% da renda per capita, igual ao pago na Irlanda e Bélgica. Na Alemanha, é de
12%. São dados que explicam por que a não aprovação desta reforma, nos seus
termos, será um salto no escuro.
O Globo
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