O
próximo governo assumirá tendo que cortar R$ 30 bilhões e, além disso, terá que
aumentar o diesel ou encontrar nova solução. Toda a complexa engenharia para
reduzir menos de meio real no preço do litro do diesel não pode ser mantida no
ano que vem porque não há espaço para mais este gasto. E para este ano foi
preciso inventar inúmeras saídas fiscais e tributárias.
Quem for
eleito herdará um aumento de despesas obrigatórias de R$ 74 bilhões, a maior
parte disso Previdência e salário do funcionalismo. O problema é que o espaço
para elevação de gastos é de R$ 40 bilhões. Por isso, o novo governo terá que
abrir os trabalhos cortando outras despesas no valor em torno de R$ 30 bi. Ao
lado disso, receberá a bomba do reajuste do diesel, porque o gasto extra de R$
9,5 bilhões será suficiente apenas para o subsídio ao diesel este ano.
No
oitavo dia de greve do setor de transporte de carga, o governo já havia cedido
tudo o que fora pedido, ainda havia paralisação e o país vivia os efeitos da
desorganização do abastecimento. A esperança ontem cedo era que o setor de
inteligência do governo estivesse certo. Eles detectaram uma melhora no tom das
lideranças mais radicais a partir da madrugada e avisaram o governo. Durante o
dia, no entanto, a situação se manteve tensa, ainda que com alguns pequenos
avanços. No fim do dia, a Polícia Rodoviária Federal admitia haver 594 pontos
de bloqueios.
Os
caminhões-tanque escoltados foram para aeroportos e serviços essenciais, mas
segundo uma fonte do governo não conseguiam atender mais do que 5% da
necessidade do país. A situação permanece crítica, portanto. E, mesmo quando o
movimento acabar, o próprio governo admite que levará dias até que o país
esteja normalizado.
Para
tentar encerrar o movimento dos transportadores de carga, que envolveu os
caminhoneiros autônomos e as empresas do setor, o governo fez uma engenharia
fiscal e financeira complexa. Uma MP está criando um programa de subvenção. O
dinheiro veio de um remanejamento: parte de uma arrecadação extra que houve no
ano e outra parte de uma reserva feita para capitalização de estatais, que não
ocorrerá. Mas para que esses recursos possam ser usados, é preciso que o
Congresso aprove o crédito extraordinário pedido pelo governo. Mesmo assim não
é suficiente. Será preciso aprovar o projeto de reoneração. Se e quando for
aprovado não será o bastante e por isso o Ministério da Fazenda estava ontem
preparando outros cortes.
O
governo precisou fazer toda essa ginástica para pôr de pé o subsídio ao diesel.
Além disso, criará um imposto de importação flexível, que subirá quando o preço
externo cair e será reduzido quando o preço externo estiver subindo. Essa é
mais uma das medidas necessárias para manter essa nova política. A preocupação
é com a possibilidade de o preço externo cair abaixo do preço fixo no Brasil.
Neste caso, o importador independente poderia trazer o produto mais barato e
distorcer o mercado. O governo confirmou
o que foi publicado aqui na coluna: a compensação financeira será paga à
Petrobras e a qualquer importador do diesel. Um quarto do mercado é abastecido
com importação.
Por
enquanto está preservada a política de preços da Petrobras. Mas para tornar
realidade esse desconto será necessário mover mundos e fundos, subverter leis
econômicas e abandonar o projeto de reduzir a enorme conta de subsídios e
incentivos fiscais. No mercado não se confia no futuro dessa política e é por
isso que a ação da Petrobras já caiu 34%, reduzindo em R$ 126 bilhões o valor
de mercado da empresa, segundo a Economática.
O Brasil
nos últimos anos acentuou sua escolha pelo transporte de carga através de
caminhão a diesel. Um erro duplo: caminhão e diesel. Nas outras greves, como a
de 2013, na esteira das manifestações contra o governo Dilma, ficou claro o
quanto o país é vulnerável. O mundo caminha na direção de reduzir a dependência
do petróleo. Recentemente num estudo feito pela OCDE, o Brasil foi aconselhado
a aumentar o imposto sobre os combustíveis fósseis. E ele agora está fazendo
exatamente o contrário. O sofrimento do país nos últimos dias tem sido imenso.
Ele mostra, uma vez mais, como temos sido insensatos nas nossas escolhas
coletivas.
O Globo
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