Editorial
Comissões
provisórias que se eternizam em diretórios sequestram legendas e impedem
renovação dos quadros
Mais uma campanha eleitoral em que se repetem personagens. Em si,
nenhum problema, porque também é desejável que haja políticos experientes. Mas
o fenômeno brasileiro é de outra natureza, não demográfica ou geracional.
Deriva de distorções do nosso sistema de representação, em que é possível
eternizar-se em cargos de direção partidária, pela facilidade que a legislação
dá para a existência de coronéis que tudo controlam nas legendas. São chefes
quase no sentido tribal do termo.
Reportagem do GLOBO, feita com base em informações do Tribunal
Superior Eleitoral, constatou que 15 dos 35 partidos registrados têm
presidentes há muito tempo no cargo. Um exemplo é o indefectível Valdemar Costa
Neto, de São Paulo, que era “dono” do PL em 2002, quando entabulou negociações
com o PT que serviram de pedra fundamental do esquema do mensalão: vender a cessão
do empresário José Alencar para ser vice de Lula e dar um lustro de pluralismo
democrático à candidatura do PT. Do pacote, fez parte o apoio político e
parlamentar ao governo, também negociado pelos petistas com outras legendas.
Passados 16 anos, Costa Neto, mesmo sem mandato, continua no controle
do PL, que agora atende pela sigla de PR. Foi denunciado, processado, condenado
e preso como mensaleiro. Cumpriu pena e voltou ao mesmo ofício, agora fazendo
acertos com candidatos a presidente, como parte do centrão, junto com caciques
do DEM, PP, PRB e SD. O grupo lançou as bases de um acordo, anunciado
quinta-feira, fechado para apoiar o tucano Geraldo Alckmin na eleição presidencial.
Há outros personagens neste enredo que fossiliza apolítica brasileira.
Um deles, Gilberto Kassab, ministro da Ciência e Tecnologia, prefeito de São
Paulo duas vezes, pelo PFL/DEM e representando o PSD, refundado por ele. Tem
controle total da legenda. Paulinho da Força é outro que criou um partido, o
Solidariedade (SD), o qual maneja da maneira que quer. Na extrema esquerda, há
o exemplo de Zé Maria, proprietário do PSTU. Nesta proximidade ideológica,
reina, no PDT, Carlos Lupi. Enquanto no PPS, nascido do Partido Comunista
Brasileiro (PCB), Roberto Freire é o chefe desde 1992.
O grande segredo dos coronéis partidários, permitido pela legislação,
é intervir em diretórios e nomear comissões provisórias que se eternizam, para
dirigi-los, em âmbito estadual e municipal. A Justiça Eleitoral baixou
resolução para acabar com a prática, mas sua entrada em vigor tem sido adiada.
Há partidos em que todos ou quase todos os diretórios são provisórios.
Não surpreende que a renovação na política brasileira seja muito
falada e pouco realizada. A porta de entrada dos partidos é controlada sempre
pelos mesmos, que passaram a ter ainda mais poder com o financiamento público
total das campanhas, em que o dinheiro é distribuído aos candidatos pelo
coronelato partidário. O trabalho de oxigenação da vida partidária é árduo, mas
precisa ser executado. Pelo menos tem de ser mais debatido e denunciado. Pode
ser um começo.
O
Globo
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