Editorial
Apego de magistrados a penduricalhos
dá ideia de como será a batalha para reformar o Orçamento
Entre a
desfaçatez e o ridículo, magistrados federais tentam fazer avançar a ideia de
uma paralisação da categoria —movimento cujo propósito, embalado em retórica
jurídica e sindical, limita-se à defesa do indefensável.
O
alvoroço decorre da decisão do Supremo Tribunal Federal, já tardia, de marcar
para 22 de março o julgamento que pode acabar com a concessão generalizada de
auxílio-moradia a juízes, incluídos os que residem em imóvel próprio na cidade
onde trabalham.
Essa
benesse, de R$ 4.377,73 mensais, está amparada em decisão provisória de 2014 do
ministro Luiz Fux, e apenas afinidades corporativas parecem explicar a delonga
do STF em deliberar de modo definitivo sobre o assunto.
Basta o
bom senso mais elementar, afinal, para entender que tal modalidade de
remuneração extra só faz sentido nos casos de profissionais deslocados para
regiões distantes de sua residência habitual.
Entretanto
a Associação dos Juízes Federais do Brasil (Ajufe) faz o que pode para desafiar
a lógica. Em nota pública, a entidade reclama que outras vantagens, a exemplo
das pagas na Justiça estadual, não serão examinadas —como se um privilégio
justificasse outro.
Já em
mensagem aos associados, a Ajufe repete a cantilena de que o Judiciário não tem
recebido reajustes salariais —e o auxílio-moradia, presume-se, seria uma forma
tortuosa de compensação.
É
espantoso que o argumento venha de uma categoria instalada no 1% mais bem pago
da população nacional, além de protegida do elevado desemprego que aflige os
brasileiros há três anos.
Em
média, cada um dos 18 mil magistrados do país custa R$ 47,7 mil mensais aos
cofres públicos. O montante, bem superior ao teto do funcionalismo (R$ 33,8
mil), evidencia que o auxílio-moradia é apenas um de muitos mimos custeados
pelo contribuinte.
O apego
mesquinho de uma corporação de elite a penduricalhos desse tipo dá ideia de
como serão árduas as batalhas para reformar o Orçamento público. Privilegiados
pelas garantias do Estado, no mais das vezes, refugiam-se às lamúrias no papel
de vítimas para manter seus ganhos ou reivindicar novos.
Uma
eventual paralisação dos juízes, por sinal, acrescentará mais um período de
folga aos dois meses de férias a que eles têm direito.
Folha de São Paulo
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