Adriano
Gianturco
O ato de
regulamentar é essencialmente sem custos para o regulador e só gera custos para
os empreendedores e os consumidores
O fenômeno do nosso tempo não é o aumento dos impostos, mas o da
regulamentação. A carga tributaria tem um limite natural (veja a Curva de
Laffer), mas a regulação é potencialmente infinita. A regulamentação estatal
está aumentando no mundo inteiro, mas por aqui talvez estejam exagerando.
Cada dia é uma nova, até mais de uma por dia! Eis algumas das mais
recentes: obrigatoriedade de manutenção periódica do ar-condicionado (os
técnicos da área agradecem); regulamentação do esporte eletrônico (imagine que
lindo um sindicato de gamers!); multas para pedintes nas ruas; subsídios
a food trucks que vendem comida local; obrigatoriedade de colocar
rádio nos celulares (lobismo de quem?); criação de um novo tipo de carteira
para carros automáticos; proibição de uso de celular em local de trabalho;
proibição de cobrança para orçamentos (não existe orçamento grátis); proibição
de desconto para mulheres em boates e bares; uma lei que define se a espuma da
cerveja é cerveja ou não; uma lei que dificulta a compra e o uso de fogos de
artifício, e outra que quer proibi-los para não incomodar os cachorros (se o
incômodo fosse para crianças, velhos e doentes ninguém ligava); proibição de
porte de armas brancas; faróis do carro ligados até de dia (ninguém diga que é
para arrecadar, é claro que é para a sua segurança); proibir às empresas
telefônicas a limitação de dados na internet fixa (para que ter livre
concorrência quando se pode ter um oligopólio hiperregulamentado?);
regulamentação da profissão do administrador; proibição da cobrança mínima em
bares (como assim, não posso sentar na sua mesa sem consumir nada?); reservar
uma vaga para jovens nos ônibus; e, claro, a “segunda sem carne” – tudo isso só
em dezembro!
É assim que
se perde a liberdade, com uma regulamentação por dia
Ampliando um pouco o horizonte temporal, vale lembrar de palitos,
canudos e guardanapos no plástico; antibióticos com prescrição medica;
curativos só no hospital; proibição de primeiro socorro por telefone dos planos
de saúde; proibição de venda de álcool liquido puro; regulamentação da
profissão de fotografo, designer, DJ, músico, esteticista etc.; extintor no
carro (salvo depois para retirar a regulação); personal trainer na academia;
instrutor de ginástica nas praças; proibição de sal na mesa etc.
A variedade das propostas, do rádio no celular ao esporte eletrônico,
da segunda sem carne aos guardanapos no plástico, mostra que o Estado não é um
“ator único racional”, mas a “estrutura através da qual todo mundo quer viver à
custa de todo mundo”. Nunca um agente único poderia pensar todas estas coisas!
Estas demandas vêm do lobismo de minorias organizadas diretamente interessadas.
Todas as áreas mais importantes são regulamentadas. Saúde e finanças
são as mais regulamentadas no mundo inteiro (mitos à parte); a regulamentação
ambiental é a que mais está aumentando; no urbanismo a mentalidade de que tem
de regulamentar tudo é tão enraizada que quase nem se debate. A sua profissão é
regulamentada. A sua comida, a sua roupa, seu carro, todas as atividades de lazer
também, para nem falar da escola de seus filhos. E, agora, até o que você pode
dizer.
Mas há também o fenômeno da microrregulamentação (rótulos de comida,
palitos no plástico, sal na mesa, faróis ligados etc.) geralmente acompanhada
por alguma justificativa de higiene, de saúde publica, de irracionalidade dos
consumidores.
Algumas regulamentações são menos danosas pois não são aprovadas. O
jurista McChesney mostra que o objetivo é extorquir dinheiro do regulado a fim
de retirar a proposta (menos pior). Talvez seja o caso de Uber e da profissão
dos fotógrafos.
Em geral, a regulamentação aumenta por três motivos: o ato de
regulamentar é essencialmente sem custos para o regulador e só gera custos para
os empreendedores e os consumidores; cada associação de categoria, vendo uma
regulação aprovada em outro setor, quer aprovar uma também no próprio setor
para encarecer o processo produtivo e, assim, jogar fora do mercado os
concorrentes, é o “efeito emulação”; e, por fim, população acaba aceitando.
A retórica ajuda, claro. Esconder os interesses reais atrás do bem
comum compensa. Vivemos em um país onde não é clara a diferença entre
“irregular” e “não regulamentado”, ou entre “regulamentação estatal” e
“regulamentação de mercado”. Afinal, se o Estado não regulamentasse, não teria
regulação nenhuma, não é mesmo? A regulamentação estatal é feita para o bem
comum, não é? E as consequências são só positivas, certo? A tão amada
fiscalização não gera oportunidade de corrupção, certo? Quem paga o custo,
afinal, não é o consumidor, não é?
E é assim que se perde a liberdade, com uma regulamentação por dia.
Não resta que esperar para ver o que vão nos regulamentar amanhã.
Gazeta
do Povo
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