Celso
Ming
Os bancos centrais podem errar a mão e produzir bruscos deslocamentos
de capital
A economia mundial está cada vez mais integrada, mas a economia do
Brasil nem sempre dança a música da integração tocada no salão global. E, às
vezes, como agora, corre o risco de enfrentar esbarrões e alguns tropeços
sérios.
A atividade da economia global segue em alentada expansão: produção em
avanço, desemprego em baixa e inflação quase inexistente. Mas uma ameaça paira
no ar: a de que os grandes bancos centrais saiam a combater a inflação – que
ainda não mostrou sua cara, mas pode mostrar – e, com isso, retirar centenas de
bilhões de dólares dos mercados.
O risco aí é o de que os bancos centrais errem na mão e produzam
bruscos deslocamentos de capital, por exemplo das ações para as aplicações em
juros. Esta é a principal causa do tombo global das bolsas em fevereiro.
Ou seja, a inflação nos países avançados, hoje sumida, pode voltar a
se mostrar, ainda em consequência do enorme despejo de moeda nas economias,
como recurso para enfrentar a crise de 2008 e de suas consequências. Este foi o
tema da Coluna da última quinta-feira (Vem aí o superajuste).
Nos dois últimos anos, enquanto a economia mundial já vivia bons
momentos, a economia brasileira permaneceu mergulhada na recessão, no
desemprego e no caos das contas públicas. Mas, já no último trimestre de 2017,
começou vigorosa recuperação que se caracteriza pelo fim da recessão e avanço
do PIB ao redor dos 3% (em 2018), reação da indústria, resultados exuberantes
no agronegócio, mergulho histórico da inflação e dos juros, excelentes
resultados do balanço de pagamentos com o exterior, alguma queda no desemprego
e certa recuperação da arrecadação.
Esse cenário interno otimista pode ser contaminado se a turbulência
externa ganhar força, como tantos analistas vêm advertindo. A contaminação pode
acontecer por ação de alguns transmissores.
O principal deles é o câmbio. A alta internacional dos juros, hoje
muito próxima do zero, tende a gerar certa valorização do dólar. Essa
valorização do dólar pode intensificar-se no câmbio do Brasil se também se
generalizar a percepção de aprofundamento da desordem fiscal por aqui. Ou seja,
o estrago que não chegou a ser produzido em janeiro pelo rebaixamento da nota
do Brasil pela Standard & Poor’s, pode acontecer a partir do momento em que
o mundo inteiro fugir do risco e saltar para as aplicações de segurança.
O resultado imediato de uma forte valorização do dólar também no
câmbio interno seria o aumento dos preços dos produtos importados e, em alguma
proporção, a volta da inflação e da alta dos juros também por aqui.
Outro transmissor da crise externa para o Brasil poderia pousar nas
contas externas. O encarecimento das importações e certa redução no influxo de
capital estrangeiro poderiam prejudicar as boas previsões para este ano.
Enfim, a crise poderia chegar aqui com mais força do que a simples
marolinha de 2008, mas ninguém deve esperar que se transforme em alguma coisa
parecida com fuga de dólares, o maior problema do Brasil nas crises dos anos
80. Para evitar fortes turbulências é que existe aqui o poderoso para-choque
dos US$ 380 bilhões de reservas externas.
O
Estado de São Paulo
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