BBC-Mundo
O presidente da Polônia sancionou um polêmico projeto de lei sobre o
Holocausto, apesar de protestos de Israel e dos Estados Unidos.
Andrzej Duda defendeu a legislação, que torna ilegal que cidadãos
acusem a Polônia de conivência com os crimes cometidos pelos nazistas durante a
ocupação do país na Segunda Guerra Mundial. A pena é de até três anos de
prisão.
O governo polonês diz que a ideia é impedir que a nação e o Estado
poloneses sejam culpados pelas atrocidades.
Em Israel, o governo está preocupado com a possibilidade de que isso
impeça de vir à tona a verdade sobre o envolvimento de alguns poloneses, além
de fomentar o antissemitismo.
Também há temores de que sobreviventes do massacre possam sofrer
processos criminais ao dar testemunhos que incriminem poloneses.
Em um discurso nesta terça, Duda disse que a lei "protege os
interesses poloneses e sua dignidade e a verdade histórica".
"Assim podemos ser julgados de modo justo no mundo, em vez de
sermos difamados como Estado e nação', disse ele.
O presidente reconheceu que houve poloneses que cometeram crimes
contra judeus durante a guerra, mas disse que o Estado não teve
responsabilidade porque deixou de existir depois de ser invadido pela Alemanha
nazista. Ele diz que não houve colaboração sistemática de instituições
polonesas com o regime.
Em aceno à Israel, Duda disse que pediria para que o Tribunal
Constitucional averiguasse se a nova regulação é condizente com as regras da
Constituição polonesa – mas isso só vai acontecer depois que o projeto virar
lei.
Mas a nova lei, que têm como um dos objetivos preservar a imagem da
Polônia no exterior, criou um mal-estar diplomático sem precedentes.
O Departamento de Estado dos EUA advertiu, na semana passada, que
haveria "repercussões" à medida nas relações bilaterais.
"Os EUA estão decepcionados com o fato de o presidente da Polônia
ter sancionado a lei ", disse em comunicado o secretário de Estado
americano, Rex Tillerson. "Colocar a lei em vigor afeta negativamente a
liberdade de expressão e os questionamentos acadêmicos."
Israel, por sua vez, pediu que a lei fosse modificada, alegando que os
dois países "têm uma responsabilidade conjunta" em preservar a
memória do Holocausto.
Mais de 3,2 milhões de judeus que moravam na Polônia foram mortos
pelos nazistas - o que equivale a cerca da metade de todos os judeus mortos no
Holocausto.
O que diz a
lei
A lei determina que "qualquer um que acuse, publicamente e contra
os fatos, a nação Polonesa ou o Estado Polonês de serem reponsáveis ou
coniventes com os crimes cometidos pelo Terceiro Reich Nazista estará sujeito a
multa ou prisão de até três anos".
A exceção é se o ato for parte de atividades científicas ou
artísticas.
O Senado polonês aprovou o projeto na semana passada.
O país protesta há anos contra o uso de frases como "campos de
concentração poloneses", que sugerem que o Estado polonês de alguma forma
teve responsabilidade por atrocidades cometidas em lugares como o campo
Auschwitz.
Os campos de concentração foram construídos e gerenciados pela
Alemanha nazista depois da invasão da Polônia, em 1939.
O que diz
Israel
O primeiro-ministro de Israel, Benjamin Netanyahu, chamou a lei de uma
tentativa de reescrever a história e negar o Holocausto.
Deputados de diversos partidos diferentes se uniram para criticar o
projeto.
A vice-ministra de Relações Exteriores Tzipi Hotovely disse no mês
passado que a atitude da Polônia poderia gerar "um efeito de bola de
neve" e acabar ajudando a "minimizar a responsabilidade de poloneses
que participaram dos crimes de guerra cometidos pelos nazistas".
Políticos da Polônia se disseram abismados com a resposta de Israel.
O ministro da Justiça interino Marcin Warchol disse que é errado supor
que o projeto impedirá as pessoas de pesquisarem a história da Polônia.
O primeiro-ministro Mateusz Morawiecki disse que seu país está
comprometido a combater mentiras sobre o Holocausto. "Os campos onde
milhões de judeus foram assassinados não eram poloneses. A verdade precisa ser
protegida", disse.
O país é governado por um partido nacionalista, o PiS (Lei e Justiça),
que tenta mostrar ao mundo como a Polônia foi violetamente devastada pela
Alemanha e pela União Soviética na guerra.
Poloneses
Mais cidadãos da Polônia do que de qualquer outro país foram homenageados
por Israel por salvarem a vida de judeus durante a guerra.
No entanto, historiadores dizem que outros foram cúmplices – cometeram
atos como informar sobre judeus escondidos em troca de vantagens ou participar
de massacres incitados pelos nazistas, como o massacre de Jedwabne, quando
centenas de judeus foram assassinados pelos vizinhos.
O historiador Efraim Zuroff, conhecido como "caçador de
nazistas", diz que o número de colaboradores está na casa dos milhares.
"O Estado polonês não foi conivente com o Holocausto, mas muitos poloneses
foram", disse Zuroff ao jornal Times of Israel.
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