Editorial
O governo perde feio a guerra da informação. Corporações, em especial
de servidores públicos, conseguem passar a ideia de que se trata de reforma
contra ‘os pobres’
O governo Temer acumula avanços importantes, por exemplo, na reforma
trabalhista e na aprovação da emenda constitucional que instituiu o teto para o
total dos gastos públicos primários, barreira essencial para forçar a contenção
das despesas.
Porém, a mais importante das reformas, a da Previdência, principal
causa da impossibilidade de se equilibrarem as contas públicas, para conter o
crescimento da dívida em proporção do PIB, tem sérias dificuldades para
decolar. É um tema difícil em qualquer país, mas no Brasil tem enfrentado
especial resistência.
Pelo desregramento fiscal do lulopetismo, iniciado no final do segundo
governo Lula e aprofundado por Dilma Rousseff até o impeachment, a dívida, que
estava em 50% do PIB, em quatro anos chegou a 74%, enquanto o bloco de
economias emergentes oscila na faixa dos 45%. E, até ser iniciada a reforma da
Previdência, esta corrida para o precipício continuará.
As razões da inevitabilidade da reforma são sólidas e evidentes: a
possibilidade da aposentadoria por tempo de contribuição permite a formação de
um grande contingente de adultos de meia idade aposentados (na faixa dos 50
anos), com uma expectativa de vida adicional para além dos 80, sem que haja
recursos para financiar os benefícios. Daí a imperiosidade da criação do limite
de idade, como na expressiva maioria dos países, para que se requeira o
benefício (65 anos, nos homens; 62, mulheres). Numa transição feita de forma
escalonada, suave.
Mas o governo perde feio a guerra da informação. As corporações sindicais,
principalmente de servidores públicos, conseguem passar a ideia de que se trata
de uma reforma contra “os pobres”. Uma farsa. Na quarta, a “Folha de S.Paulo”
trouxe foto de uma manifestação de sindicalistas contra a reforma, coreografada
por idosos em cadeiras de rodas e em camas de hospital, supostas vítimas das
mudanças na Previdência.
Ora, as pessoas com aposentadoria básica, de um salário mínimo, de
baixa renda, procuram o INSS aos 60 anos, porque não ficam muito tempo em
empregos formais. O limite de idade, na prática, já vale para elas. Quem não se
interessa pela reforma são os que têm renda na faixa de seis e sete salários, e
se aposentam aos 50 anos. Um grupo representado por sindicalizados que
protestam em nome do “povo”. Basta observar quem lidera passeatas. Não há
pobres.
Castas as mais diversas do funcionalismo também rejeitam a ideia,
justa, de que a Previdência tem de ser igual para todos, e que cada
pessoa/categoria deve constituir sua poupança em fundos de pensão, para
complementar a futura aposentadoria. Desejam permanecer sustentados pelos
contribuintes, o que não é mais possível.
No encontro promovido pelo GLOBO, quarta-feira, na série “E agora,
Brasil?”, com o ministro do Planejamento, Dyogo Oliveira, e o economista José
Márcio Camargo, da PUC, foram apresentados números acachapantes. Por exemplo: o
Brasil tem a parcela de 11% da população formada por idosos; o Japão, 30%, mas
os dois países gastam os mesmos 14% do PIB em aposentadorias. Algo muito errado
acontece na Previdência brasileira, mas o discurso de castas em geral e as do
funcionalismo em particular não tem sido retrucado à altura pelo governo.
Números não faltam.
O
Globo
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