Fernão Lara
Mesquita
Volta com força
aos jornais a especulação em torno das movimentações de Lula para
forçar a troca de Joaquim Levy por Henrique Meirelles. Seria só
mais uma manobra diversionista. Joaquim Levy não é a crise, é só
uma esperança abortada de saída dela.
A crise é a
incerteza que instalou-se no país quanto à possibilidade de
sobrevivência da democracia diante da desfaçatez com que, 24 horas
depois da eleição, o governo que vinha se dedicando ha 12 anos a
solapar todas as instituições que garantem o Estado de Direito pela
corrupção sistemática e o “aparelhamento”
ostensivo assumiu-se oficialmente como mentiroso e passou a ameaçar
o país com um confronto – armado, até – caso fosse
judicialmente responsabilizado por seus crimes.
Essa incerteza
perdurou durante os seis meses que duraram as dúvidas do próprio PT
sobre a possibilidade de levar a economia de volta a uma equação
sustentável sem perder o poder. Desde que se convenceu do contrário
e passou a reafirmar a rota de desastre e agir apenas e tão somente
para colocar-se fora do alcance da Justiça essa incerteza só tem
feito diminuir.
As “pedaladas”
foram postas sob a guarda segura daquele senhor com certificação
internacional de corrupção por cujas probabilíssimas contas no
exterior o Banco Central não mostra nenhuma curiosidade; da Lava
Jato ameaçam deixar só a casca para Curitiba; a acusação no TSE
de uso de dinheiro do “petrolão”
na campanha “caiu”
de volta para a ministra que já tinha votado anteriormente pelo seu
arquivamento que, confirmado, enterraria todas as provas levantadas
pelo TCU e pela Lava Jato; a Operação Zelotes, que andou até o
bolso do filho de Lula assim que saiu delas, voltou dois dias depois
às mãos do mesmo juiz que, até então, mantivera seu interesse
restrito às cercanias dos passageiros privados da corrupção
patrocinada pelos chefões políticos dos agentes públicos.
Diante de tão
completa coleção de sucessos – que confirmados configurariam já
de si o fim do Estado de Direito – não é atoa que a pretensão
dos acusados por roubalheira nunca antes tão vasta na história
desta humanidade tenha evoluído para nada menos que “legalizar
a corrupção”, projeto
que, como Modesto Carvalhosa demonstrou com todos os fatos e números
na 4a feira, 4, nesta página, vem avançando livre e
aceleradissimamente.
Já as contas
públicas, estas são um abismo que o governo torna mais fundo a cada
dia distribuindo mais e mais postos de tocaia ao dinheiro público a
gente desqualificada, declaradamente para aliciá-la para deixar
impunes os autores do desastre fiscal que a reeleição custou e
arrancar exclusivamente das suas vítimas um “ajuste”
que mantenha onde estão cada um dos desqualificados que cavaram a
primeira metade desse buraco tocaiando o dinheiro público.
Lula quer trocar
Levy por Meirelles “para
promover a retomada do crédito e o aumento do consumo”
por uma população com salário nunca antes tão ameaçado, metade
da qual já está inadimplente das dívidas que lhe foram instiladas
na veia para engraxar a eleição, e para “liberar
empréstimos no exterior para os estados”
nesse dolar que subiu 60% só nos primeiros seis meses da ressaca
eleitoral. A “única
alternativa” seria o
restabelecimento da CPMF que abriria as veias de uma economia que já
está morrendo de inanição.
O que alimenta esse
falso dilema é a inépcia da imprensa.
A única solução
sustentável para o drama brasileiro é atuar diretamente sobre a
fonte do desastre que é a gordura mórbida que, para além de tornar
o estado muito mais pesado do que o país é capaz de sustentar,
travou o seu funcionamento pelo caráter cancerígeno dos agentes
infiltrados nele, mais que para simplesmente parasitá-lo, para
devorá-lo. Só que para tornar politicamente viável essa linha de
ação seria preciso que essa gordura viesse sendo sistematicamente
exposta até que o país inteiro tivesse uma noção exata da sua
existência, da sua natureza e dos valores envolvidos.
O cérebro
brasileiro é tão capaz de processar uma equação quanto qualquer
outro, desde que conheça os elementos que a compõem. Mas a imprensa
não tem gasto um minuto de seu tempo para esmiuçar a composição
do peso morto que, considerado o “por
dentro” e o “por
fora”, come metade ou
mais dos valores envolvidos. O Brasil não chega, portanto, à
resposta certa porque é sistematicamente induzido a partir da
pergunta errada.
É emblemática
dessa distorção a monopolização do noticiário político pelo
tema “Eduardo Cunha”,
figura que tomada isoladamente não tem implicação maior que a sua
própria insignificância, em detrimento de “A
fritura de Eduardo Cunha”
ao fim de 20 anos de desfile inadvertido da sua coleção de Porches
na cara da imprensa e da miséria nacional na véspera de um
impeachment, tema cujo desaparecimento do noticiário implica o
resgate da impunidade ameaçada e proporciona aos agentes diretos da
desgraça nacional espaço para voltarem ao desmonte acelerado do
Estado de Direito, sob a desculpa da “obrigação
de registrar os fatos”
que, incidentalmente, são os que vêm sendo produzidos aos borbotões
pela única “investigação”
de agente do “núcleo
político” do petrolão
que o governo e seus auxiliares nos demais poderes houveram por bem
levar adiante.
Ha um agravante
geográfico da nossa equação política que torna mais difícil o
que já é naturalmente difícil. Entre Brasília e o Brasil tudo que
resta são os jornalistas de política. “Expatriados”
para o isolamento do Planalto eles constroem por lá a sua teia de
relacionamentos e acabam fatalmente por ter cônjuges, pais, filhos e
parentes vivendo daquele Brasil que está acima das crises. Com os
anos, passam a “entender”
tão bem aquele mundo que deixam de entender o nosso. Só que, cada
vez mais, são mundos regidos por lógicas mutuamente excludentes.
Para que um saia do inferno será preciso que o outro seja expulso do
paraíso. É preciso que a imprensa, que só cabe num deles, reveja
suas prioridades enquanto é tempo.
Vespeiro
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