FAUSTO MACEDO E RICARDO
GALHARDO
Ao
condenar Sombra a 15 anos e meio de prisão, magistrada afirma que quadros
importantes do PT 'cederam à corrupção'
Em
sentença de 117 páginas, na
qual condenou a 15 anos e seis meses de prisão o empresário Sérgio Gomes da Silva, o Sombra, a juíza Maria Lucinda da Costa, da 1.ª
Vara Criminal de Santo André, assinalou que ‘o esquema de corrupção era tão
estruturado que se ramificou’ e atingiu a administração federal. “Encontrou no
pensamento coletivo corrompido terreno fértil e se alastrou inclusive para a
esfera federal”, escreveu a juíza.
Sombra
é um emblemático personagem do caso Santo André. Ele era muito próximo de Celso
Daniel, ex-prefeito do PT executado a tiros em janeiro de 2002. Para o
Ministério Público Estadual, o esquema de propinas abastecia caixa 2 do
partido. Os promotores afirmam que Celso Daniel foi eliminado porque resolveu
dar um fim na arrecadação ilícita em sua gestão ao descobrir que o dinheiro
estaria sendo canalizado para o enriquecimento pessoal de Sombra e de outros
personagens do caso.
A
condenação de Sombra é a primeira imposta pela Justiça no episódio que se
transformou em um pesadelo para o PT. Além de Sombra, a juíza condenou o
empresário do setor de transportes e de comunicação em Santo André Ronan Maria
PInto ( 10 anos e 4 meses de pena) e o ex-secretário municipal Klinger Luiz de
Oliveira Souza (15 anos e seis meses). Todos poderão recorrer em liberdade.
A
Promotoria atribuiu a Sombra, Ronan e Klinger a liderança de um esquema de
arrecadação de propinas no setor de transporte público da cidade do Grande ABC.
A
suspeita sobre o suposto caixa 2 do PT surgiu com o depoimento do médico
oftalmologista João Francisco Daniel, irmão mais velho de Celso Daniel. Ele
revelou que a propina ia para o partido, na ocasião presidido por José Dirceu,
mais tarde ministro-chefe da Casa Civil no primeiro governo Lula.
“Os
réus, especialmente Klinger e Sérgio (Sombra), ligados que são ao Partido dos
Trabalhadores, ocuparam posição de destaque no partido, em uma cidade que
congregava a liderança partidária”, assinalou a juíza Maria Lucinda da Costa.
“Da administração de Celso Daniel saíram pessoas que ocuparam cargos no
primeiro escalão do governo federal petista, como Miriam Belchior e Gilberto
Carvalho.
Portanto,
tinham eles condições de, em fazendo uma administração limpa, fazer frutificar
frutos bons. Mas, não, optaram por ceder à corrupção, o que possibilitou a
proliferação do esquema maléfico, como depois se tornou público e notório.”
A
juíza cita na sentença uma ‘testemunha sigilosa’. “Ouvida no procedimento
preparatório, (a testemunha) relatou que soube pela ex-mulher de Celso Daniel
que as empresas contratadas pela Municipalidade desviavam recursos dos cofres
públicos para o Partido dos Trabalhadores, para utilização em campanhas
eleitorais e que os valores eram entregues em mãos do presidente do Partido,
José Dirceu.”
A
juíza destaca que ‘no caso específico dos autos, não se pode ignorar, ainda,
que a estrutura criminosa se instalou em torno de serviço público essencial,
utilizado pela camada mais sofrida da população que, não obstante seja a menos
favorecida economicamente, foi a que mais sofreu com o aumento dos custos dos
serviços impostos para suportar o pagamento da verba ilícita’.
“Como
se não bastasse, são atos da espécie que prejudicam a evolução social, o
crescimento da economia, a estruturação do Estado Democrático de Direito e, na
medida em que causam o descrédito do administrador público, comprometem a
imagem de todas as autoridades públicas e toda a estruturação dos entes
federativos”, alerta a magistrada.
A
juíza cita João Francisco Daniel, irmão de Celso Daniel. “Relatou que após o
falecimento do prefeito Celso Daniel, soube por Miram Belchior, ex-esposa do
alcaide, que havia um ‘caixa 2′, cuja receita era destinada ao Partido dos
Trabalhadores. Ocorre que pouco antes do falecimento de Celso, cogitou-se que
parte deste dinheiro estava sendo desviada em proveito próprio de Klinger,
Ronan e Sérgio, tanto que Celso confidenciou ao irmão que estava fazendo um
dossiê contra os réus. Posteriormente, Miriam teria relatado à testemunha que
“…Klinger direcionava as licitações, o denunciado Ronan seria o beneficiário
dessas licitações….e por fim o denunciado Sérgio era o responsável para manter
o contato com os empresários de Santo André….Sérgio era um homem violento e
responsável pela arrecadação junto aos empresários…”, inclusive, exibindo-lhes
arma de fogo durante as reuniões. Finalmente, o dinheiro seria encaminhado ao
PT, na pessoa de José Dirceu, por Gilberto Carvalho.”
Perante
a CPI que se instalou na Câmara municipal de Santo André, João Francisco disse
que ‘o esquema lhe teria sido relatado também por Gilberto Carvalho’.
Tais
informações foram desmentidas por Miriam Belchior e por Gilberto Carvalho,
segundo a própria sentença da juíza de Santo André. “Também não se ignora que,
ouvida pela CPI, Miriam desmentiu o ex-cunhado, assim como Gilberto Carvalho o
fez. Entretanto, ainda que não se tenha provado o conhecimento de Miriam e de
Gilberto acerca do esquema criminoso, certo é que os depósitos, documentalmente
comprovados, são mais que suficientes para provar a existência do grupo
criminoso. As demais testemunhas, embora não contribuam para confirmar a
acusação, também não bastam para afastar as robustas provas produzidas.”
A
juíza cita, ainda, Ivone de Santanta, viúva de Celso Daniel. “Descreveu que no
primeiro mandato de Celso, Sérgio trabalhou no gabinete do Prefeito e Klinger
era funcionário da Prefeitura. No segundo e terceiro mandatos, Sérgio, por não
residir em São Paulo, não ocupou cargo na Prefeitura Municipal e Klinger passou
a Secretário. Asseverou que o relacionamento do falecido Prefeito com o irmão
João Francisco não era próximo, porque Celso não gostava de ser procurado para
atender interesses pessoais do irmão, cujo filho era patrocinado no basquete
pela família Gabrilli (proprietária de uma empresa de transportes). Enfatizou
que João Francisco pressionava o prefeito para interceder na Administração em
favor de Gabrilli. Por outro lado, Ivone negou que Celso estivesse fazendo um
dossiê contra Klinger, Ronan e Sérgio. Ao contrário, sustentou que a relação de
amizade entre Celso e Klinger nunca foi abalada.”
ESTADÃO
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