quinta-feira, 2 de fevereiro de 2017

Tudo “em casa”

Fernão Lara Mesquita

O prefeito pastor Marcello Crivella, do Rio de Janeiro, está negociando a venda para “servidores públicos” dos apartamentos da Vila Olímpica construída pela Odebrecht. A CEF vai financiar, com juros reduzidos, claro, porque como “servidor” não perde o emprego mesmo que não sirva, mesmo que se sirva, não ha risco de inadimplência. As estatais também foram mobilizadas para que seus empregados não percam a oportunidade. Topa-se tudo, ate uma espécie de “leasing” em que cada “aluguel” pago vai sendo somado como se fosse uma prestação até que o felizardo fique dono da propriedade.

Beleza, né? Ah se todo locador fosse igual ao Estado brasileiro! Como não é, a favela paga a conta, como sempre…

O Globo, que deu a auspiciosa noticia e chamou-a na 1a pagina, lembrou em destaque as queixas de australianos e argentinos sobre a qualidade dos apartamentos na Olimpíada de modo que a favela que não estranhe se depois de pagar mais este mimo aos “funças” for cobrada pelas reformas que eles vão exigir, possivelmente fazendo greves onde elas são mais eficientes, ou seja, em “áreas sensíveis” como saúde, transporte ou pagamento das aposentadorias miseráveis dos favelados, como de costume. Em caso de briga interna, governo x servidores ou servidores x servidores pelo melhor pedaço da presa, aí a greve se instala no setor de arrecadação de impostos, o único órgão de todo o vasto organismo da administração pública brasileira que ainda mostra algum tipo de “sensibilidade”.

A notícia sai um dia depois que o governo “festejou” o déficit primário de “apenas” R$ 156 bilhões, numero alcançado graças à repatriação de pouco mais de R$ 45 bilhões de dinheiro escondido no exterior, coisa que só acontece uma vez na vida. O déficit real foi, portanto, de R$ 201 bilhões, contra o que o “dream team” anunciou, energicamente, que vai “contingenciar”  R$ 4,67 bi do orçamento…

As estatais, por sua vez, prosseguem no seu processo de “ajuste” de contas segundo as melhores práticas de “governança corporativa” transferindo impiedosamente grossas fatias do seu excesso mórbido de empregados para a Previdência via planos de aposentadorias incentivadas, isto é, precoces e aumentadas. É um expediente fulminante. O cara, normalmente enfiado lá dentro por algum político, sai da conta do governo e dos ricos acionistas da Petrobras, da Eletrobras e etc., e cai na conta dos “beneficiários” do desemprego, da deseducação, da insegurança, da insalubridade, do desatendimento na hora da doença e da miséria geral que resulta dos grandes deficits nacionais. E as ações sobem na Bolsa e todo mundo ainda aplaude o “ganho de eficiência” assim conquistado.

Por essas e outras, o IBGE registrou que a diferença média dos salários pagos no setor público e no setor privado subiu de 59% a mais para o setor público em 2015 para 64% a mais em 2016, e que o numero de desempregados bateu recorde com 12 milhões e 300 mil chefes de família na fila do desespero extremo.

Foi a primeira vez em tanto tempo que já não me lembro da anterior, que um jornal – a Folha de S. Paulo – deu manchete ao assunto que, se houvesse jornalismo honesto no país empurrado à profundidade a que chegamos, não deveria sair das manchetes nem um único dia sequer. O jornal não chegou a mencionar explicitamente ou especular com “especialistas” a relação direta de causa e efeito entre a gordura mórbida do estado e a esqualidez de faquir da nação brasileira, o que seria pedir demais, mas ao menos deu-se uma manchete com o assunto do qual o leitor mais atento poderá eventualmente deduzi-la já que, na mesma edição, destaca que as Minas Gerais de Fernando Pimentel, do PT, que declarou estado de calamidade e pediu ao governo federal mais dinheiro dos miseráveis para sustentar o seu funcionalismo, continuou contratando a rodo neste ano da graça de 2017 que se inicia. Só neste mes de janeiro que acaba de acabar nomeou 1.867 funcionários novos. Também aumentou de 9 mil para 11 mil o salário dos funcionários do “poupatempo” mineiro e “promoveu” os da Secretaria da Fazenda (os encarregados da arrecadação de impostos que agora, no governo federal, têm “participação nos lucros” como na época de d. João VI) com um aumento de R$ 2,5 mil no salário. Já os 15 “conselheiros” da Cemig, três dos quais são secretários de Pimentel, tiveram o terceiro aumento do “jeton” desde 2015. O mimo por reunião subiu de R$ 7,1 mil pra R$ 14,3 mil por enquanto. Pros barnabezinhos, tipo professor e outros servidores que realmente servem, Pimentel tem atrasado os salários de fome desde o inicio de 2016…

Não obstante, graças ao esforço ingente do jornalismo pátrio para bem informar, o Brasil que pensa que raciocina ainda acredita que o que vai mudar ou não o seu destino é a escolha do herdeiro do trono de Teori Zavascki na relatoria dos feitos e acontecidos dos ladrões de casaca da Lava Jato, aquela operação que só “prende e arrebenta” do segundo escalão para baixo daquela pequena parcela dos que assaltam a riqueza da nação tambem por fora da apropriação indébita sistemática que está chancelado pela lei e garantida pela constituição…

Essa momentosa questão, como é adequado que aconteça numa “democracia representativa”, será decidida num quarto hermeticamente fechado do 2º andar do Anexo 2 do STF por um grupo altamente secreto de “servidores da Secretaria Judiciária” que, segundo eles próprios afirmam e dão fé – que é quanto basta neste nosso sistema inteiramente estruturado na boa fé e na confiança – que tudo será decidido aleatoriamente pelas artes de “um algoritmo”, que pinçará o nome do escolhido entre os quatro integrantes da 2a turma do STF à qual, incidentalmente, aderiu especialmente para a ocasião o ministro Edson Fachin.

VESPEIRO


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