Augusto de Franco
O que está acontecendo com o PT não
é um fenômeno isolado. Aconteceu com vários grupos da esquerda autocrática
depois da queda do muro de Berlim. Sobretudo na América Latina, em que muitos
dirigentes de organizações ditas revolucionárias enveredaram para o crime.
Conheci vários desses militantes que
viraram bandidos. Daniel Ortega, da Frente Sandinista, hoje presidente da
Nicarágua, foi um deles. Me lembro como se fosse hoje. Ele foi convidado de
honra no I Congresso do PT (que coordenei), no final de 1991. Chegando lá, no
Hotel Pampa, em São Bernardo, Daniel pediu logo ao tesoureiro do PT à época, se
não podia arranjar umas prostitutas. Esse Daniel e seu irmão Humberto, eram
teleguiados de Fidel, que lhes passava pitos, aos berros. Reuniões decisivas para
o futuro da chamada revolução sandinista foram realizadas em Havana, sob o
comando de Fidel. E enquanto as bases petistas da Igreja idolatravam por aqui
os sandinistas como expoentes de uma nova espiritualidade dos pobres, esses
bandidos assaltavam patrimônio público (inclusive passavam para seus nomes
propriedades imóveis) do Estado nicaraguense.
O mesmo ocorreu com gente da Frente
Farabundo Marti de Libertação Nacional de El Salvador, que também está no
governo. Aconteceu com o Mir (e com o Mir Militar) chileno, com alguns
Tupamaros, com as FARC colombianas e, é claro, com a nova leva de bolivarianos,
que não tinham tanta tradição de esquerda, como Chávez, Maduro e Cabello (mas
aí já estamos falando de delinquentes da pior espécie, que inclusive chefiam o
narcotráfico na região) e como Rafael Correa e Evo Morales. Bem, para resumir,
aconteceu com boa parte das organizações e pessoas que frequentam as reuniões
do Foro de São Paulo (fundado, não por acaso, um ano depois da queda do muro -
e eu estava presente na reunião de fundação, no Hotel Danúbio).
Não dando certo a revolução pela
insurreição, pelo foquismo ou pela guerra popular prolongada, essa galera
chegou à conclusão de que seria preciso fazer a revolução pela corrupção.
Bastaria adotar a via eleitoral contra a democracia e depois assaltar o Estado
para financiar um esquema de poder de longo prazo. O plano era simples:
conquistar hegemonia sobre a sociedade a partir do Estado aparelhado pelo
partido. O objetivo era claro: chegar ao governo pela via eleitoral, tomar o
poder e nunca mais sair do governo. Para isso, entretanto, era necessário, além
do tradicional caixa 2, fazer um caixa 3, encarregado de custear ações legais e
ilegais, ostensivas e clandestinas, para controlar as instituições, comprar aliados,
remover ou neutralizar obstáculos...
Afinal, pensaram eles: as elites não
fizeram sempre assim? Para jogar o jogo duro do poder não se pode ter
escrúpulos. Foi essa a conclusão de Lula, Dirceu e dos dirigentes petistas que
tomaram o mesmo caminho. É claro que, como ninguém é de ferro e como não se
pode amarrar a boca do boi que debulha, alguma compensação em vida esses bravos
revolucionários mereciam ter. E foi assim que enriqueceram, abriram contas
secretas no exterior para guardar os frutos dos seus crimes, adquiriram bens
móveis e imóveis em nome próprio ou de terceiros e foram levando a vida numa
boa enquanto o paraíso comunista não chegasse.
O ano de 1989 foi decisivo para essa
degeneração política e moral da esquerda. Mas o que aconteceu não foi um
resultado do somatório de desvios individuais. Não! Eles viram que seria muito
difícil conquistar o mundo e assumir o comando de seus próprios países,
contrapondo um bloco a outro bloco. O bloco dito comunista se desfez. A União
Soviética derreteu em 1991. Ruiu tudo. E agora? Bem, agora - pensaram eles -
seria necessário ter uma nova estratégia. E eis que surgiu uma ideologia
pervertida, baseada numa fusão escrota de maquiavelismo (realpolitik
exacerbada) com gramscismo. Eles, como operadores políticos, conduziriam a
realpolitik sem o menor pudor, enquanto que pediriam ajuda aos universitários
para dar tratos à bola do gramscismo (e reproduzir mais militantes nas
madrassas em que se transformaram as universidades).
No Brasil, porém, parece que erraram
no timing. Precisariam de mais uns três ou quatro anos para ter tudo dominado,
dos tribunais superiores, passando pelo Congresso, pelo movimento sindical e
pelos fundos de pensão, pelos (falsos) movimentos sociais que atuam como
correias de transmissão do partido, pela academia colonizada, pelas ONGs que se
transformaram em organizações neo-governamentais, por uma blogosfera suja
financiada com dinheiro de estatais e por grandes empresas (com destaque para
as empreiteiras, atraídas pela promessa de lucros incessantes quase eternos se
estivessem aliadas a um sólido projeto de poder de longo prazo).
Não deu tempo. O plano foi
descoberto antes que as instituições fossem completamente degeneradas. E
chegamos então a este agosto de 2015, ano em que alguns desses dirigentes vão
começar a assistir, de seus camarotes na prisão, o desmoronamento do esquema
maléfico que urdiram.
Augusto de Franco
Ele foi coordenador do primeiro
congresso do PT...
Blog
do jornalista Políbio Braga
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