Luiz Carlos Azedo
• A política se tornou um
empreendimento pessoal, familiar e corporativo. A riqueza privada e a vida
pública se cruzam e se reforçam reciprocamente
Uma
prática comum dos colonizadores ibéricos é que “chegavam pobres às Índias ricas
e retornavam ricos das Índias pobres”, nas palavras do Padre Antônio Vieira
(1608-1697), o Paiaçu, na língua tupi. Lusitano, passou a vida entre o Brasil
(Salvador, Olinda e São Luís) e a Europa (Lisboa e Roma). Ao morrer na Bahia,
deixou uma obra que soma 30 volumes. Um de seus sermões mais famosos é o do Bom
ladrão, de 1655, proferido na Igreja da Misericórdia de Lisboa (Conceição
Velha), perante D. João IV e sua corte, além dos dignitários do reino, juízes,
ministros e conselheiros. Vieira atacou os que se valiam da máquina pública
para enriquecer ilicitamente, denunciou escândalos no governo, as gestões
fraudulentas e, indignado, criticou a desproporcionalidade das punições nas
masmorras do século 17: “Basta, senhor, que eu, porque roubo em uma viatura,
sou ladrão, e vós, porque roubais em uma força pública, sois governador?”
Depois
de conjugar o verbo furtar de várias maneiras durante o sermão — “furtam,
furtavam, furtaram, furtariam e haveriam de furtar mais, se mais houvesse” —,
disparou contra a corte: “São companheiros dos ladrões, porque os dissimulam;
são companheiros dos ladrões, porque os consentem; são companheiros dos
ladrões, porque lhes dão os postos e poderes; são companheiros dos ladrões,
porque talvez os defendem; e são finalmente seus companheiros, porque os
acompanham e hão de acompanhar ao inferno, onde os mesmos ladrões os levam
consigo”. À época de Vieira, a política era uma via de enriquecimento patrimonial,
que, por sua vez, permitia o acesso continuado aos cargos públicos.
Desde
então, no Brasil, a política se tornou um empreendimento pessoal, familiar e
corporativo. A riqueza privada e a vida pública, dialeticamente, se cruzam e se
reforçam reciprocamente.
A fusão
entre os negócios privados e a gestão pública é um instrumento de perpetuação
no poder. Mas esse mecanismo está em xeque devido à Operação Lava-Jato, cuja
escala de combate ao chamado “crime de colarinho branco” não tem precedentes.
Graças à Constituição de 1988, que conferiu autonomia ao Ministério Público
Federal e fortaleceu os órgãos de controle e coerção do Estado, principalmente
à Receita Federal e à Polícia Federal.
Há dois
tipos de políticos profissionais: os que vivem para a política como bem comum e
os que vivem da política como negócio. Ambos têm a política como profissão
principal, o que torna essa separação uma fronteira sinuosa. São consequências
desse fenômeno os critérios plutocráticos para constituição da camada dirigente
dos partidos.
Operadores
Os
partidos que têm mais recursos econômicos elegem mais e têm mais poder. Segundo
Max Weber, isso facilita a criação de “uma casta de filisteus corruptos”. A
captação de votos e recursos valoriza os “operadores” capazes de montar
“estruturas” eleitorais com empregos, dinheiro e poder. Promove as carreiras
meteóricas, o troca-troca partidário e os escândalos, muitos escândalos. No
lugar dos projetos de nação, que deveriam definir os partidos e seus programas,
surgem poderosos projetos pessoais de poder e formaçao de fortuna.
Na
sexta-feira, a Justiça de São Paulo aceitou a denúncia apresentada pelo
Ministério Público Estadual contra o empreiteiro Léo Pinheiro, da OAS, e o
ex-tesoureiro do PT e ex-presidente da Cooperativa Habitacional dos Bancários
(Bancoop) João Vaccari Neto, além de outras 10 pessoas por irregularidades
relacionadas a oito empreendimentos imobiliários.
Vaccari
está preso desde o começo da Operação Lava-Jato. Era o típico “operador” do PT.
É acusado de associação criminosa, falsidade ideológica e violação à lei do
condomínio, que diz que é crime contra a economia popular promover incorporação
fazendo afirmação falsa sobre a construção do condomínio, alienação das frações
ideais do terreno ou sobre a construção das edificações. Léo Pinheiro é acusado
de associação criminosa e estelionato.
A juíza
excluiu da ação o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, a ex-primeira-dama
Marisa Letícia, Fábio Lula da Silva e Igor Ramos Pontes, por entender que a
denúncia contra eles, relacionada ao imóvel 164-A do edifício Solaris, foi
apresentada pelo Ministério Público Federal e recebida pela 13ª Vara Federal de
Curitiba.
Correio Braziliense
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