SAMY ADGHIRNI
A
oposição conquistou a maioria da Assembleia Nacional da Venezuela na eleição parlamentar deste
domingo (6), numa vitória arrasadora que reequilibra forças num país onde o
governo chavista exerce poder hegemônico há 16 anos.
O
resultado foi anunciado à 0h30 (3h no horário de Brasília) pela presidente do
órgão eleitoral (CNE), Tibisay Lucena. Com 96% dos votos apurados, ela afirmou
que os candidatos opositores, agrupados na coalizão MUD (Mesa da Unidade
Democrática), obtiveram ao menos 99 das 167 cadeiras do Parlamento unicameral
–72 por voto nominal e 27 por lista.
O
PSUV (Partido Socialista Unido da Venezuela) obteve 46 deputados.
"Aceitamos os resultados (...) Jogamos
limpo, perdemos a batalha, foi uma bofetada para despertar para o que
vem", disse o presidente Nicolás Maduroem
pronunciamento, deixando claro que não cumpriria a ameaça de resistir com
violência a eventual derrota.
Enquanto
Maduro falava, venezuelanos opositores soltavam rojões, gritavam de alegria e
saíam às ruas em buzinaço.
Dezenove assentos ainda estão por definir.
Se ao menos dois forem para a oposição, o antichavismo passará a ter maioria
qualificada de três quintos, que permite destituir vice-presidente e ministros
e sancionar leis habilitantes.
Se
a oposição superar 110 assentos, poderá aprovar e alterar leis orgânicas, destituir
juízes do supremo, designar reitores do órgão eleitoral e aprovar reforma
constitucional. A maioria simples já é suficiente para eleger o presidente da
Assembleia, avaliar decretos de estado de exceção e convocar referendos.
A participação foi de 74,25%, um número que
superou com folga as projeções.
REJEIÇÃO
O resultado deste domingo é amplamente
visto como rejeição em massa a um governo que, apesar de inegáveis conquistas
sociais sob a Presidência de Hugo Chávez (1999-2013), é responsabilizado pela degradação
abrupta das condições de vida.
A
Venezuela sofre recessão, desabastecimento generalizado e índices de violência
dignos de país em guerra. O processo de degradação, que tomou forma com Chávez,
acirrou-se com a degringolada dos preços petroleiros a partir de 2014.
A
oposição era dada como favorita, mas as últimas pesquisas indicavam
fortalecimento da intenção de voto chavista, aparente reflexo do esforço
redobrado de um Estado que controla todas as instituições e burla abertamente
os limites legais.
A
campanha foi marcada por uma série de manobras do governo para manter a todo
custo o controle de um Parlamento que sempre simbolizou vontade popular na
mitologia chavista.
O
governo inabilitou vários candidatos opositores, alterou o mapa das circunscrições
para inflar a representatividade chavista e barrou ofertas para uma observação
internacional eficaz.
Foi
nas últimas semanas que Maduro repetiu que estava disposto a resistir com
violência a
eventual derrota governista.
A
escalada foi repreendida até por vários países, inclusive o Brasil,
que já foi acusado de leniência com abusos chavistas.
Irregularidades permaneceram até este domingo,
quando a TV estatal passou o dia fazendo campanha em favor dos candidatos
chavistas, numa violação da lei que proíbe propaganda após o término da
campanha –encerrada na última quinta-feira.
Opositores
praticamente não tiveram acesso à TV estatal, numa repetição da campanha,
quando foi monopolizada pela propaganda governista.
Os
abusos foram criticados por seis ex-presidentes latino-americanos que visitavam
a Venezuela para acompanhar a eleição a convite da MUD, entres eles o
colombiano Andrés Pastrana. Em represália, o governo os acusou de violar as
normais eleitorais e retirou as credenciais que
lhes permitiam circular.
COMPARECIMENTO
A participação popular foi mais intensa em
zonas populares, redutos tradicionais do chavismo.
Era
palpável, porém, a irritação das camadas mais pobres com um governo para o qual
costumavam votar quase sistematicamente.
"Que
país é este onde preciso passar horas numa fila para conseguir fraldas para os
meus filhos e onde as pessoas se odeiam tanto? Não tenho medo nenhum de dizer o
que penso deste governo", disse a servidora Carmen Gonzalez, 35, na manhã
de domingo.
Folha de
São Paulo
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