Editorial
Em
alegada defesa do servidor, parlamentares não apoiam ajuste fiscal, e assim a
economia não cresce, recolhe menos impostos e o funcionalismo é prejudicado
É inerente ao político em geral uma enorme dificuldade de economizar o dinheiro do contribuinte, considerado por ele “sem dono”, portanto ao seu dispor. Mas não se vive uma crise qualquer no Brasil. Abate-se sobre o país uma tempestade perfeita — recessão, inflação (em retrocesso, porém ainda elevada), desemprego e um setor público quebrado. Não seria pedir muito à classe política que caísse em si e recuasse no ímpeto com que se comporta como se os cofres públicos já não estivessem vazios e cada vez mais endividados.
Isso na impossibilidade de o mesmo pedido ser feito e atendido pelas diversas corporações que sitiam o Tesouro, na União, estados e municípios. Desde a chegada de Michel Temer ao Planalto, houve aprovações de gastos no Congresso em absoluta contradição com a realidade. O tempo é de cortes, não de elevação de despesas.
Em mais uma atitude paradoxal, deputados aprovaram quarta-feira, em comissão, e com apoio do governo Temer, aumento salarial para auditores fiscais e analistas da Receita Federal, além de “bônus de eficiência” (quem acompanhará o desempenho do servidor, para conceder-lhe ou não o prêmio?).
Aproveitaram o comboio deste “trem da alegria” e acoplaram nele mais seis mil servidores — uma população inteira de “jabutis”. É aposta segura de que todo este desprezo pela sensatez criará dificuldades sérias mais à frente, quando as metas fiscais não forem atingidas. Ou se forem apenas com a ajuda de receitas extraordinárias, que não se repetirão. O exemplo do momento é o dinheiro de impostos e multas do repatriamento.
Outra demonstração explícita de dissintonia com o mundo real foi dada pelo presidente da Alerj, Jorge Picciani (PMDB), ao devolver ao Palácio Guanabara o projeto que aumenta a contribuição previdenciária dos servidores — independentemente dos obstáculos jurídicos colocados à frente da proposta.
Parece não haver sido entendido que no epicentro da crise fluminense — e não apenas nela — está a previdência. Há uma enorme incapacidade de se entender que, ao contrário de crises brasileiras anteriores, esta não vem acompanhada de inflação muito alta, para mascarar políticas de gastos desregrados. Na superinflação, bastava atrasar pagamentos que o gasto era menor em termos reais. A inflação fazia o corte.
E ainda bem que não há inflação muito alta. Até existe perspectiva de queda, o que torna menos dolorosa a vida do assalariado. Mas este paga alto preço na forma de desemprego, pela resistência de políticos em apoiar o ajuste das contas públicas. Em nome da defesa do funcionalismo, prejudicam o trabalhador do setor privado e, indiretamente, o próprio funcionalismo, porque a economia não retoma o crescimento, a coleta tributária continua baixa e se mantém a crise fiscal, que, por sua vez, ameaça o servidor. Fecha-se o círculo.
O Globo
É inerente ao político em geral uma enorme dificuldade de economizar o dinheiro do contribuinte, considerado por ele “sem dono”, portanto ao seu dispor. Mas não se vive uma crise qualquer no Brasil. Abate-se sobre o país uma tempestade perfeita — recessão, inflação (em retrocesso, porém ainda elevada), desemprego e um setor público quebrado. Não seria pedir muito à classe política que caísse em si e recuasse no ímpeto com que se comporta como se os cofres públicos já não estivessem vazios e cada vez mais endividados.
Isso na impossibilidade de o mesmo pedido ser feito e atendido pelas diversas corporações que sitiam o Tesouro, na União, estados e municípios. Desde a chegada de Michel Temer ao Planalto, houve aprovações de gastos no Congresso em absoluta contradição com a realidade. O tempo é de cortes, não de elevação de despesas.
Em mais uma atitude paradoxal, deputados aprovaram quarta-feira, em comissão, e com apoio do governo Temer, aumento salarial para auditores fiscais e analistas da Receita Federal, além de “bônus de eficiência” (quem acompanhará o desempenho do servidor, para conceder-lhe ou não o prêmio?).
Aproveitaram o comboio deste “trem da alegria” e acoplaram nele mais seis mil servidores — uma população inteira de “jabutis”. É aposta segura de que todo este desprezo pela sensatez criará dificuldades sérias mais à frente, quando as metas fiscais não forem atingidas. Ou se forem apenas com a ajuda de receitas extraordinárias, que não se repetirão. O exemplo do momento é o dinheiro de impostos e multas do repatriamento.
Outra demonstração explícita de dissintonia com o mundo real foi dada pelo presidente da Alerj, Jorge Picciani (PMDB), ao devolver ao Palácio Guanabara o projeto que aumenta a contribuição previdenciária dos servidores — independentemente dos obstáculos jurídicos colocados à frente da proposta.
Parece não haver sido entendido que no epicentro da crise fluminense — e não apenas nela — está a previdência. Há uma enorme incapacidade de se entender que, ao contrário de crises brasileiras anteriores, esta não vem acompanhada de inflação muito alta, para mascarar políticas de gastos desregrados. Na superinflação, bastava atrasar pagamentos que o gasto era menor em termos reais. A inflação fazia o corte.
E ainda bem que não há inflação muito alta. Até existe perspectiva de queda, o que torna menos dolorosa a vida do assalariado. Mas este paga alto preço na forma de desemprego, pela resistência de políticos em apoiar o ajuste das contas públicas. Em nome da defesa do funcionalismo, prejudicam o trabalhador do setor privado e, indiretamente, o próprio funcionalismo, porque a economia não retoma o crescimento, a coleta tributária continua baixa e se mantém a crise fiscal, que, por sua vez, ameaça o servidor. Fecha-se o círculo.
O Globo
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